Imprensa e eleições: nada a ver
A pesquisa da Folha de S. Paulo sobre perspectivas para as eleições presidenciais de 2014 teve pouca repercussão na imprensa.
Curiosamente, após fazer do assunto sua manchete no domingo, o próprio jornal paulista que o gerou o abandonou em seguida em sua edição digital.
Os leitores seguiram a apatia dos editores e também se abstiveram de fazer comentários sobre o tema, o que causa estranheza, uma vez que, pela própria ação da imprensa, o assunto deveria suscitar mais controvérsias.
Os números captados pelo Datafolha confirmam o que qualquer pessoa mais ou menos informada pode adivinhar: a popularidade e o alto índice de aprovação do governo da presidente Dilma Rousseff a credenciam como favorita para sua própria sucessão.
De certa maneira, porém, não seria surpresa se as chances de eleição do ex-presidente Lula da Silva se apresentassem reduzidas a esta altura do tempo, em função do incessante bombardeio que lhe faz a imprensa, por conta de denúncias sem trégua.
“Se eleição fosse hoje, Dilma ou Lula venceriam”, disse a manchete da Folha no domingo (16/12).
No mesmo subtítulo, o jornal junta o tema predileto da mídia nacional, acrescentando que “aumenta a percepção de corrupção no governo”.
No texto principal, estão agrupados os dados sobre a grande dianteira de Dilma e Lula na preferencia dos eleitores, os indicadores de desempenho do senador Aécio Neves, do PSDB, e, pela primeira vez numa pesquisa eleitoral, o nome do presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa.
Não poderia haver maneira mais explícita de apresentar a própria opinião do jornal: a Folha, como toda a chamada grande imprensa nacional, acreditava que ela própria, por meio do noticiário intenso sobre escândalos de corrupção, estaria construindo os fatores de escolha do eleitor para a próxima sucessão presidencial.
A inclusão do nome de Joaquim Barbosa só se explica pela exposição que lhe tem dado a mídia no julgamento da Ação Penal 470: ele seria, na análise da mídia, o ator a personificar a moralidade pública, diante do aparente desmoronamento de toda decência na política.
Os votos de Marina
No entanto, as lições que a pesquisa Datafolha nos trazem são que, ou a sociedade brasileira não se importa com a corrupção – o que é desmentido pela própria imprensa em reiteradas pesquisas – ou a sociedade brasileira não se importa com o que diz a imprensa.
O fato apresentado pela pesquisa é que, com Dilma ou Lula candidatos, o Partido dos Trabalhadores venceria a eleição em primeiro turno e que os partidos de oposição não têm grandes perspectivas com Aécio Neves, que foi lançado como alternativa pela imprensa quando governava Minas Gerais e costuma ganhar espaços generosos na mídia toda vez que se manifesta em público.
Os baixos índices de voto atribuídos ao presidente do STF também reforçam a percepção de que, embora ungido herói da moralidade e paladino da Justiça, Joaquim Barbosa não é visto como possuidor dos atributos adequados para dar continuidade às políticas que fazem de Lula e Dilma campeões de aprovação e popularidade.
Não é que a sociedade brasileira não concorde com o combate à corrupção: o que aparece claramente na pesquisa é que a população não concorda com a versão escandalosa que lhe apresenta a imprensa.
Uma clara demonstração dessa possibilidade é o fato de que, entre os candidatos que podem ser vistos como alternativa ao modelo de governo do PT, apenas a ex-ministra Marina Silva, ex-petista, aparece com chances de vitória.
Se Joaquim Barbosa, pela ordem, e Aécio Neves, que são presenteados com grandes porcentagens de referencias positivas pela imprensa – com imenso destaque para o presidente do Supremo – não sensibilizam o eleitor, o que explicaria o aparecimento da senadora acriana, que não conta com visibilidade sequer aproximada, como a maior preferencia do eleitor depois de Dilma e Lula?
Claramente, a imagem de Marina Silva corresponde à da personagem política da mudança.
Marina representa a ética, não a moralidade apresentada pelos jornais.
Mulher, pobre, parda, vinda de uma região remota, para os padrões da imprensa nacional, militante de direitos humanos e ambientais, ela não se enquadra em nenhuma das métricas de uma imprensa que privilegia a economia de mercado, contempla exclusivamente o sudeste industrializado e mal consegue dissimular certos preconceitos sociais.
Em resumo: a pesquisa Datafolha revela que a imprensa não faz a menor diferença na hora da escolha do eleitor.