Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Marcelo Beraba

“A Folha publicou no domingo passado o resultado de uma pesquisa do Datafolha que mostra que 86% dos assinantes do jornal e seus dependentes que moram em São Paulo e na Grande São Paulo aprovam a cobertura que vem fazendo das eleições presidenciais.

Segundo a pesquisa, para 70% dos leitores ouvidos a Folha é imparcial e não favorece nenhum candidato a presidente; 11% acham que o jornal favorece Geraldo Alckmin (PSDB), e 11% que o beneficiado é Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Para 79%, a cobertura não prejudica nenhum presidenciável; 7% acham que prejudica o petista; e, 5%, o tucano.

O instituto ouviu 339 leitores, a margem de erro é de cinco pontos percentuais para mais ou para menos e o resultado final, portanto, é bastante favorável à Folha. Seu leitor parece satisfeito com a qualidade da cobertura eleitoral, principalmente no quesito equilíbrio.

Isso dito, algumas observações a respeito da pesquisa e da cobertura eleitoral:

Os leitores

O resultado não deve ser lido como um indicador da totalidade da opinião dos leitores da Folha, mas daqueles que são assinantes e que moram na capital do Estado e no seu entorno.

O que a reportagem não informou foi o alto percentual de leitores excluídos da mostra: não foram ouvidos os leitores do interior de São Paulo, 31%, nem do resto do Brasil, 21% (os leitores de banca representam apenas cerca de 10% dos leitores da Folha). O resultado final representa, portanto, a opinião de no máximo 48% dos leitores.

O resultado seria diferente se fossem ouvidos os leitores do interior e de outros Estados que formam a maioria do leitorado da Folha? Não se sabe. Isso não invalida a mostra, mas a relativiza. É um dado importante para entender o resultado e que deveria ter sido divulgado junto com a pesquisa.

Outro aspecto importante para este entendimento é o perfil dos leitores ouvidos. Normalmente o leitor de jornal, e não só da Folha, tem um perfil diferente do conjunto da população, com um percentual maior de pessoas com nível superior, com renda alta e com mais idade.

No caso dessa pesquisa, feita por telefone a partir do sorteio aleatório na listagem atualizada de assinantes, 72% dos leitores tinham nível superior (28% tinha até o segundo grau), 70% ganhavam até 20 salários mínimos (30% ganhavam mais do que isso) e 53% tinham 50 anos ou mais.

O leitor ouvido é majoritariamente eleitor de Alckmin para presidente (41% das respostas espontâneas, contra 13% para Lula), do tucano José Serra para o governo do Estado (49% contra 12% para Aloizio Mercadante, do PT) e do petista Eduardo Suplicy para o Senado (32% contra 14% de Guilherme Afif, do PFL ). A consulta para presidente feita com leitores da Folha em todo o Brasil daria o mesmo resultado?

Comparação com 2002

Há um outro aspecto do relatório do Datafolha sobre a pesquisa que foi ignorado pela reportagem de domingo passado. A avaliação dos leitores ouvidos, embora bastante positiva para o jornal, é pior do que a da cobertura da eleição presidencial de 2002. Naquela ocasião, 92% dos leitores consideraram a cobertura ótima ou boa; agora, foram 86%. Conclusão do Datafolha: ‘A comparação da pesquisa atual com o levantamento de setembro de 2002 mostra que a cobertura da Folha hoje está sendo considerada ligeiramente menos imparcial’. Em 2002, a taxa dos que achavam que a cobertura da Folha favorecia algum candidato era de 16%, hoje este índice é de 24%. Na opinião de 16%, a Folha está prejudicando algum candidato à Presidência; em 2002 essa taxa era de 9%.

O equilíbrio

A cobertura do jornal está realmente isenta, como percebe o assinante da Grande São Paulo? Tenho três formas de aferir, nenhuma ‘científica’ ou definitiva.

A primeira são as queixas que recebo dos leitores. Elas diminuíram em setembro. Até sexta-feira tinha recebido 37 reclamações: 24 que achavam que o jornal era parcial contra o PT, três a favor do PT, duas contra o PSDB e oito a favor do PSDB.

Uma outra forma é a minha própria avaliação. Já escrevi em várias ocasiões que acho que o jornal tem dificuldades para manter o noticiário equilibrado e o mais comum é ser mais investigativo e crítico em relação a Lula e ao PT do que a Alckmin e ao PSDB. São avaliações que tenho registrado em ‘Críticas Internas’ e na coluna de domingo.

Uma terceira aferição é a do Laboratório Doxa (http://doxa.iuperj.br), ligado ao Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro e que acompanha as coberturas eleitorais dos jornais desde 2002 .

O último levantamento foi relativo à quinzena de 2 a 15 de agosto. O instituto separou as reportagens referentes ao governo federal das da cobertura da candidatura petista. A Folha é mais crítica em relação à administração Lula do que em relação à candidatura: 12% das reportagens publicadas foram consideradas pelo Doxa positivas (favoráveis ao governo), 35% negativas e 53% neutras.

Deve-se levar em conta que a Folha tem uma tradição de cobertura crítica em relação aos governos federais. Não é possível, no entanto, uma comparação com a cobertura do governo FHC em 2002 porque ele não foi candidato e o instituto pesquisou, então, apenas a cobertura da candidatura de José Serra.

Em relação às reportagens da Folha referentes diretamente à candidatura de Lula, 29% foram positivas, 26% negativas e 45% neutras. Na quinzena anterior elas haviam sido mais negativas (38%), contra 30% de positivas e 32% de neutras.

A cobertura da candidatura Alckmin teve 26% de reportagens consideradas positivas, 30% de negativas e 45% de neutras. Na quinzena anterior havia sido 39% de positivas, 26% de negativas e 35% de neutras.

Em relação ao governo Lula, a cobertura mais crítica entre os três grandes jornais tem sido, segundo o levantamento do Doxa, a de ‘O Globo’. Na quinzena de 2 a 15 de agosto o jornal do Rio publicou 8% de reportagens consideradas positivas, 43% de negativas e 49% de neutras. Na quinzena anterior havia publicado 6% de positivas, 55% de negativas e 39% de neutras.

Lacunas

Uma última observação em relação à pesquisa do Datafolha e à cobertura eleitoral. Apesar do alto nível de escolaridade, ainda é muito grande o percentual de leitores da Folha na Grande São Paulo que ainda não se decidiram em quem votar para governador (24%) e, principalmente, para senador (40%).

Isso deveria levar o jornal a reservar mais espaço para as coberturas das campanhas para o governo do Estado e para o Senado. São duas áreas freqüentemente relegadas em função da prioridade da cobertura presidencial. Vale lembrar que o candidato mais bem posicionado para vencer a eleição estadual, José Serra, já é dado pelo noticiário como candidato a presidente da República em 2010.”