JORNALISMO ECONÔMICO
Paulo França
Jornalista candidato à bolsa de Madame Natasha, 21/09/06
“No domingo passado, a imprensa brasileira mostrou seu desespero e falta de respeito para com quem lhe paga. Aqui, considerando apenas os varejistas, leitores que compram em bancas ou fazem assinaturas. As jogadas no balcão ou na penumbra são outra conversa. No site da BBC, o diretor do Departamento para o Hemisfério Ocidental do FMI, Annop Singh, disse que as perspectivas de desenvolvimento econômico para a América Latina são muito boas. Completando, ele qualificou ainda como ‘fabuloso’ o índice de crescimento, redução de pobreza e gastos públicos no Brasil nos últimos três ou quatro anos. Ou seja, no Governo Lula. Ora, uma autoridade do Fundo declarando isso não é pouca coisa, quando nos acostumamos a só ouvir deles reprimendas. Mas não saiu uma linha sequer nos jornais e revistas.
Numa nota ao lado, o diretor-gerente do FMI, Rodrigo de Rato, disse que as políticas brasileiras de luta contra a pobreza são um ‘exemplo’ para a América Latina: ‘É um bom exemplo na América Latina, embora não o único, de mudanças para melhor na maneira como se realizam gastos sociais. O Brasil deu passos importantes em tornar mais eficiente seu gasto social, e a redução da pobreza nos últimos anos tem avançado’. Também não publicaram isto, apenas uma notinha desfavorável ao governo.
Que tipo de imprensa é esta? Onde está o jornalismo comprometido com a verdade dos fatos? Cadê a imprensa dos anos 70/80?! Foram para o ralo? Não falo da TV, que é mais show do que outra coisa, embora, por mais paradoxal que seja, esteja se portando com mais ética do que jornais e revistas, que vêm se especializando em imprensa marrom. O desconhecimento de História do Brasil, história política, relações internacionais e temas estratégicos é assustadoramente cavalar na grandes redações.
Colunistas de política e de economia se achando o (a) máximo (a) e deitando falação sobre o conflito entre Bolívia e Brasil envolvendo a Petrobras, tachando o Brasil de fraco, covarde etc, induzindo o povo a pensar que é assim mesmo, simples, sem sequer se referir aos fatos históricos que datam a partir de 1938! Nem lhes passa pela cabeça ver a Bolívia no contexto que mais nos interessa estrategicamente, para não a perdermos para os EUA, como aconteceu com a Colômbia.
Outro fato que mostra por que as vendas e a credibilidade da imprensa descem ladeira abaixo: conhecido por pregar lições de moral a todo mundo, Élio Gáspari publicou no mesmo domingo nota com o título ‘Demônio golpista’, no qual ele informa que Lula, durante jantar com empresários, na última quinta-feira, ao responder a Eugênio Staub sobre como pretendia fazer as reformas necessárias ao país, durante o segundo mandato, teria dito: ‘Staub, não acorde o demônio que tem em mim, porque a vontade que dá é fechar esse Congresso e fazer o que é preciso’. Lula soube na madrugada de domingo, no vôo que o levava a Belém para um comício, e reagiu indignado.
O famoso colunista, em vez de se basear no disse-me-disse, que abunda na imprensa brasileira, deveria ter ligado para o presidente e dado-lhe direito de resposta. Afinal, ele soube disso na quinta, ou na sexta-feira. Porém, dizer que disseram que o presidente pensa em fechar o Congresso Nacional é notícia de impacto. Deve valer mais do que a verdade dos fatos. O Globo teve de publicar o desmentido formal do Planalto, embora escondidinho: ‘É falso… Só o contexto eleitoral, com reiteradas tentativas de causar confusão e dificuldades para a expressão informada da vontade popular, explica a divulgação de pseudo-notícias como as que apareceram hoje.’
Se o jornalista tivesse dado ao Presidente do Brasil o mesmo espaço que deu ao disse-me-disse do empresário, sendo fiel às lições de moral que ele tanto prega, poderia ter ouvido de Lula: ‘Olha, se eu fechasse o Congresso estaria facilitando o trabalho do Ministério Público e da Polícia Federal, já que cerca de um terço dos parlamentares estão atolados em crimes como os das ‘sanguessugas’, ‘vampiros’, ‘mensaleiros’ e outros. O povo até me agradeceria.’
Ou, então, o que ele respondeu na entrevista durante o vôo e que o portal Terra divulgou na manhã do mesmo domingo: ‘Não falei nada disso. Aliás, o Congresso se autofecha, como agora, em época eleitoral. Está há dois meses sem funcionar direito.’ Pronto, o jornalista teria seguido a cartilha, o leitor estaria bem informado e o jornal dele não teria engolido o sapo. A credibilidade do colunista juntou-se a choldra do andar de cima, que tanto gosta de bater na patuléia, pensando que esta é uma Madame Natasha da vida.
(*) Paulo França é jornalista, tem pós-graduação em História e em Marketing e mora no Rio de Janeiro.”
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