Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Folha de S. Paulo


CRISE POLÍTICA
Editorial


Lula com a palavra


‘Formação de quadrilha. Corrupção ativa e passiva. Lavagem de dinheiro e
peculato. No âmago do governo Lula, formou-se uma organização criminosa com
vistas a manter-se no poder.


Não são frases de algum oposicionista enraivecido, e sim do relatório
elaborado pelo procurador-geral da República, formalizando denúncia contra os
responsáveis pelo mensalão. Entre eles, o então ministro-chefe da Casa Civil,
José Dirceu, o das Comunicações, Luiz Gushiken, os três principais dirigentes do
Partido dos Trabalhadores, o então presidente da Câmara dos Deputados e um
ex-diretor do Banco do Brasil.


Só uma quadrilha? Ou mais de uma? Também o ex-ministro da Fazenda Antonio
Palocci e o grupo capitaneado por ele enredam-se numa outra coleção de acusações
policiais.


‘É forte’, declarou Lula ao saber da denúncia apresentada pela Procuradoria.
‘É fraca. É fraquíssima’, pode-se dizer dessa declaração. Mais do que nunca, o
presidente Lula deve explicações à sociedade brasileira. Desde o início da
crise, refugia-se num silêncio calculado, de vez em quando interrompido por
esparsas evasivas, contradições flagrantes e vagos desabafos sentimentais.


‘Fui traído’, disse ele mais de uma vez. Mas por quem? Lula foi prudente em
não citar nome nenhum: muitos ainda não eram do conhecimento público quando a
frase foi pronunciada pela primeira vez; a lista, até hoje em aberto, poderia
sem dúvida fornecer diversos novos candidatos ao indiciamento criminal.


O presidente não sabia de nada? ‘O importante’, afirmou numa famosa
entrevista em julho de 2005, ‘não é se você sabia ou não, porque, se eu tivesse
condições de saber, não teria acontecido’.


Na melhor das hipóteses, o escândalo dá agora a esse esfarrapado silogismo o
caráter da mais preocupante confissão de descuido e desinteresse pelas
atribuições inerentes ao cargo de chefe do Executivo.


Naquela ocasião, Lula recorria apenas ao truque vocabular de referir-se a
hipotéticos ‘erros’ cometidos por seu partido: ‘o PT, se cometeu erros, tem que
explicar para a sociedade brasileira que erros cometeu’.


Mais do que erros, entretanto, é o que Lula tem de explicar agora. ‘Já faz
tempo que eu deixei de ser presidente do PT’, prosseguia ele naquela entrevista,
sintomaticamente gravada nos jardins de um certo ‘Museu do Ar’, em Paris.
‘Depois que eu virei presidente da República, eu não pude mais participar da
reunião do diretório do PT’.


Mas participou, ao que tudo consta, de reuniões com ministros perto dos quais
as figuras de um Delúbio Soares e de um Sílvio Pereira assumem o papel de
aprendizes, de coadjuvantes, de bodes expiatórios numa farsa monumental.


Farsa de um governo eleito com a bandeira da ‘ética na política’ e que tem,
como principal recurso para provar sua inocência, o argumento de que todo o
episódio do mensalão se resumiu a um caso de caixa dois -’o que é feito no
Brasil sistematicamente’, disse Lula, para corrigir-se meses depois. Trata-se
‘de prática condenada pela sociedade brasileira’, afirmou finalmente, com tardia
convicção. É a mesma convicção com que garantiu, em dezembro passado, que ‘a CPI
vai terminar e eles não vão provar o mensalão’.


Foram essas as certezas, foram essas as considerações do presidente da
República ao longo da crise -extraídas a custo dos raros momentos em que se
alçou ao dever civil de prestar contas pelo descalabro de seu governo. Nada mais
se ouviu do presidente. Exceto o espetáculo da autocongratulação balofa, da
banalidade conceitual e da defesa da própria ignorância -que não se resume ao
tema de sua falta de instrução formal, mas àquele, muito mais grave, que diz
respeito às façanhas de delinqüência organizadas em seu círculo mais
próximo.’




ALCKMIN SOB SUSPEITA
Frederico Vasconcelos


Presidente da Nossa Caixa nega pressões


‘O presidente da Nossa Caixa, Carlos Eduardo Monteiro, diz que ‘não tinha por
que tratar das questões de publicidade do banco’ com o ex-governador Geraldo
Alckmin. Em entrevista por telefone, na sexta-feira, Monteiro voltou a negar ter
recebido pressões do Palácio dos Bandeirantes para favorecer deputados da base
aliada do governo tucano.


A Folha revelou que o governo Alckmin direcionou recursos de publicidade da
Nossa Caixa para favorecer deputados da base aliada na Assembléia
Legislativa.


Sob pressão do PSDB, o governador exonerou, a pedido, seu então assessor de
comunicação, Roger Ferreira, apontado como responsável pelo direcionamento das
verbas. Em nota, Ferreira disse que a Nossa Caixa não tinha ‘nenhuma
subordinação formal ou informal, no que se refere à comunicação, a nenhuma
instância ou pessoa exterior à empresa’.


Alckmin, por sua vez, se defendeu afirmando que seu governo não interferia
‘em banco público’ e que o critério de distribuição da mídia do governo era
‘eminentemente técnico’. Ontem, em Pernambuco, questionado sobre o caso,
respondeu: ‘Comigo não tem essa história de não saber. Essa história da Nossa
Caixa eu fiquei sabendo há dois anos. Nós determinamos uma sindicância. A Nossa
Caixa demitiu o gerente. Não tenho telhado de vidro’.


Na quinta-feira, o presidente da Nossa Caixa, Carlos Eduardo da Silva
Monteiro, apresentou uma versão diferente. Ele afirmou que não tinha
interferência na publicidade do banco e mostrou o decreto de nº 43.834, de 1999,
segundo o qual todo o plano de comunicação do banco deveria ser submetido à
pasta da Comunicação, gerida, na época por Roger Ferreira.


Anteontem, Monteiro disse que os assuntos de publicidade não são da alçada da
presidência do banco, apesar de a sindicância interna sobre as irregularidades
nos contratos com as agências Full Jazz e Colucci ter responsabilizado o
ex-presidente Valdery Frota de Albuquerque e o ex-gerente de marketing Jaime de
Castro Júnior. Leia abaixo a entrevista:


Folha – A entrevista que o sr. concedeu, na quinta-feira, sugere que havia
grande interferência do ex-assessor de Comunicação do governo Alckmin Roger
Ferreira nas decisões de publicidade da Nossa Caixa [o ex-governador e Roger
Ferreira alegavam que o governo não interfere em banco público].


Carlos Eduardo Monteiro – Não há contradição entre mim e o Alckmin e entre
mim e o Roger Ferreira. Um exemplo: o diretor de controle de qualquer banco
presta satisfação diretamente ao Banco Central.


Folha – A impressão que sua entrevista deixou é que a publicidade era uma
questão só do Sicom [Sistema de Comunicação do Governo do Estado de São Paulo,
ligado a assessoria de Ferreira] e da gerência de marketing do banco.


Monteiro – A questão está textual no decreto 43.834/99, sobre o que tem que
ser submetido ao Sicom.


Folha – Os contratos com as agências de publicidade não eram assunto da
presidência do banco?


Monteiro – A existência ou não de contrato com as agências era assunto da
alçada do banco.


Folha – Não era da presidência?


Monteiro – Não. A presidência do banco não tem o controle de mais de mil
contratos do banco.


Folha – Mas a sindicância responsabilizou um ex-presidente do banco, Valdery
Frota de Albuquerque. Isso não é contraditório?


Monteiro – A sindicância afirma que Valdery teria tido conhecimento, não sou
eu quem está dizendo, e talvez não tivesse tomado providências. Para o banco,
ele não era mais funcionário.


Folha – A não-renovação dos contratos era de responsabilidade só do
ex-gerente de marketing?


Monteiro – Por acaso, a questão dos contratos de publicidade do seu jornal é
de responsabilidade do presidente do jornal? A publicidade do Unibanco é de
responsabilidade do presidente? É uma maluquice, desculpe-me.


Folha – Roger Ferreira envolveu o governador em algum pedido?


Monteiro – Não.


Folha – O governador sabia que eram feitos pedidos de publicidade em veículos
de deputados?


Monteiro – A publicidade para tal e qual deputado, volto a dizer, é de
interesse do banco. Como o governador vai imaginar que tem algum anúncio em
algum veículo?


Folha – Quando o governador foi informado da sindicância?


Monteiro – Eu não sei responder. Comuniquei ao Tribunal de Contas e ao
secretário da Fazenda.


Folha – Em dezembro, quando saiu a primeira reportagem, o sr. chegou a falar
com o governador?


Monteiro – Eu não tinha por que tratar desse assunto com ele.


Folha – Jaime diz que um secretário ligou para o sr. pedindo a antecipação de
patrocínio de um evento porque o governador estava sendo pressionado por um
deputado. Foi o secretário Arnaldo Madeira [chefe da Casa Civil] quem ligou?


Monteiro – Não. Esse processo, aliás, foi um dos que eu lhe mostrei. Foi
assinado pelo Jaime.


Folha – O sr. recebeu alguma pressão do secretário da Casa Civil?


Monteiro – Não.


Folha – O ex-gerente de marketing alega que a comissão de sindicância deveria
ter sido instaurada pelo comitê diretor, e não pelo sr. E questiona o fato de o
sr. ter nomeado os membros da comissão.


Monteiro – Sou a autoridade maior do banco. A regra do banco diz: [quando
envolve] gerente de departamento, a comissão é formada por gerentes de
departamentos. Fiz a comissão formada por gerentes de departamentos.


Folha – Ele afirma que alguns membros da comissão tinham ‘interesse na
questão’.


Monteiro – Ele chuta no ventilador. O chefe de departamento jurídico não é
citado em documento nenhum. Nem o chefe do de controles internos.


Folha – O BC pediu cópia da sindicância. Isso o preocupa?


Monteiro – Claro que não.


Folha – O BC estaria exatamente preocupado com o quê?


Monteiro – Provavelmente, quer ver os controles internos.


Folha – Jaime autorizou pagamentos além da alçada dele. Não havia mecanismos
de controle para detectar isso antes da sindicância?


Monteiro – Não.


Folha – Por quê?


Monteiro – Porque havia uma falha de controle grande na área de marketing.
Está no relatório.


Folha – Esse caso está sendo usado apenas com proveito eleitoral?


Monteiro – Lamento que depois de três anos de trabalho sério, sem ingerência,
a imagem do banco seja solapada pela exploração que estão dando ao caso. Se é
política ou não, eu não sei.’




FHC NO JÔ
Luís Nassif


O ‘príncipe’ e o marmiteiro


‘Fernando Henrique Cardoso é mestre em frases autodemolidoras. A mais famosa
foi na eleição para prefeito de São Paulo, em que perdeu para Jânio Quadros, ao
admitir a Boris Casoy que não acreditava em Deus. A vaidade do intelectual falou
mais forte na época. Aprendida a lição, depois da gafe, se necessário fosse, até
galinhas pretas seriam sacrificadas pelo nosso refinado ‘príncipe dos sociólogos
brasileiros’ -termo que provocaria chacotas em centros acadêmicos
internacionais, apesar da respeitabilidade intelectual do nosso ‘príncipe’.


Não assisti à entrevista que deu a Jô Soares. Ouvi a versão, que é a que
fica, segundo a qual ‘pobre não pode chegar ao poder que logo se deslumbra’.


Cá para nós, o deslumbramento sempre foi uma marca dos paulistas no poder.
José Sarney não se deslumbrou: era consciente de suas fraquezas e tinha uma
objetividade de coronel nordestino polido para defender seus interesses.
Fernando Collor era um alucinado. Nem pode dizer que se deslumbrou porque
acreditava piamente ter superpoderes.


Itamar, não. Era um provinciano que não se envergonhava de sua condição -e
isso lhe conferia até certa grandeza. Aliás, sentia-se tão desconfortável sob a
capa de presidente que, certa vez, consegui uma posição dele sobre uma questão
polêmica telefonando para o assessor Francisco Baker e solicitando a opinião
‘não do presidente Itamar, mas do cidadão Itamar Franco’ sobre a questão. O
cidadão respondeu na hora.


Depois de Itamar, o Palácio do Alvorada foi ocupado por quatro pessoas, os
casais FHC e Lula. Dos quatro, louve-se dona Ruth Cardoso, que nunca se
deslumbrou. Donde se conclui que o casal FHC foi apenas 50% menos deslumbrado
que seu sucessor.


Em FHC sempre habitaram o inteligente e o vaidoso. E, do embate entre ambos,
o inteligente só emergia em momentos de crise braba. No restante do tempo,
primeiro mandato inteiro, o vaidoso convocava velhas testemunhas da história e
indagava: ‘Jorge, quem foi o maior: Juscelino ou eu?’. E o Jorge respondia: ‘É
claro que você, Fernando’. Ou então -segundo lendas da época- convidava
presidentes de multinacionais para visitar o Alvorada e os entretinha tocando ao
piano hinos que havia composto em homenagem ao país -como d. Pedro 1º, que
também se vangloriava de seus feitos musicais e de conquistador.


Mas dei essa volta toda para chegar à maior jogada política da história do
país. Seu autor morreu poucos anos atrás, com mais de 90 anos, e, até o final da
vida, continuava guiando seu carro de Campinas a São Paulo. Era o velho Hugo
Borghi, que, se vivo fosse, ao terminar a entrevista de FHC, deve ter comentado
lá do céu para onde são mandados os espertos: ‘Deu pena do que eu poderia fazer
com ele’.


Borghi foi um empresário enrolado, mas, acima de tudo, um político astuto.
Sua sacada maior foi dar livre interpretação a uma frase do brigadeiro Eduardo
Gomes na campanha presidencial de 1945. No Teatro Municipal do Rio de Janeiro,
local mais que propício para surtos elitistas, Gomes declarou não pretender os
votos da ‘malta de desocupados que freqüentavam os comícios de Getúlio Vargas’.
Borghi deu uma livre interpretação ao texto e espalhou que, por ‘malta’, Eduardo
Gomes pretendia se referir aos ‘grupos de operários que percorrem as linhas
férreas levando suas marmitas’, conforme os dicionários da época. Logo, estava
atacando os ‘marmiteiros’, logo, estava atacando a população de baixa renda.


O ataque aos ‘marmiteiros’ correu o Brasil de ponta a ponta, transportado
pelas ondas das rádios. Em questão de dias, a imagem do brigadeiro estava
indissociavelmente ligada à da elite, ao preconceito social -para o que ajudava
a sua figura elegante e impecável.


O sucesso do ‘marmiteiro’ foi tão grande que, em 1946, o cartunista Nelo
Lorenzon criou o personagem Zé Marmiteiro para a ‘Folha da Manhã’ -na época,
dirigida por Nabantino Ramos.


Mas não será necessário ser nenhum Hugo Borghi ou Nelo Lorenzon para avaliar
o estrago que a boutade do príncipe poderá causar na próxima campanha
presidencial.’




OPUS DEI EM AÇÃO
Folha de S. Paulo


Revista publica charge de Maomé


‘A revista italiana ‘Studi Cattolici’, dirigida por um membro da Opus Dei,
publicou um desenho do profeta Maomé no inferno, observado por Dante e Virgílio.
Várias associações muçulmanas protestaram. Segundo o grupo católico
ultraconservador, ‘a revista não é uma publicação oficial da Opus e os membros
têm liberdade de opinião’.’




TELEVISÃO
Daniel Castro


‘Musa’ Fátima Bernardes vai à 3ª Copa


‘Apresentadora e editora do ‘Jornal Nacional’, Fátima Bernardes, 43, está
‘classificada’ para o Mundial da Alemanha desde 2002, quando foi eleita pelos
jogadores da seleção a ‘musa do penta’. Ela embarca para a Alemanha em 30 de
maio. Ficará lá mais ou menos 40 dias – se o Brasil não chegar à semifinal,
volta antes.


‘A idéia é ancorar o ‘JN’ de onde a seleção estiver’, conta. A jornalista
também fará reportagens sobre o dia-a-dia da seleção, sempre ‘de um ângulo
diferente do noticiário esportivo’. Isso exigirá dela um sacrifício – dormirá
pouco.


Devido ao fuso horário, Fátima entrará no ‘JN’ à 1h15 na Alemanha. ‘Tenho que
estar de pé às 8h. Vou acompanhar todos os treinos’, diz. Ela prevê mais
dificuldade para trabalhar agora: ‘Em 2002, fiquei hospedada nos mesmos hotéis
do Brasil e consegui vários bastidores. Mas isso não será possível na Alemanha,
porque os hotéis de lá são pequenos’.


Fátima não se importa com o título de musa do penta: ‘Não levei tão a sério.
Foi o retorno de uma relação de 40 dias. Os jogadores achavam que eu era
pé-quente’.


A jornalista se diz confiante no hexa, mas teme a Argentina (‘perigosa’), a
Alemanha (‘joga em casa’) e a Inglaterra (‘chatinha’).


Esta será sua terceira Copa (a primeira foi a de 1994). Difícil vai ser a
distância dos três filhos, de oito anos. ‘Desta vez será pior porque eles agora
sabem que 40 dias é muito tempo’.


OUTRO CANAL


Planilha Respectivamente autor e diretor de ‘Cobras & Lagartos’, que
substitui ‘Bang Bang’ na semana que vem, João Emanuel Carneiro e Wolf Maya já
planejam repetir a dobradinha em 2009, mas numa novela das oito. A cúpula da
Globo já acenou a Carneiro: se ‘Cobras & Lagartos’ for um sucesso de
audiência, ele será promovido ao horário mais nobre da emissora.


Tática 1 Para manter algum mistério, Gilberto Braga evita falar muita coisa
sobre ‘Copacabana’ (título de trabalho; o nome não será esse), sua próxima
novela na Globo, que substituirá ‘Páginas da Vida’ no início de 2007. ‘Turismo
sexual é um gancho de modernidade para uma história bem parecida com todas as
que já fiz, passada no Rio, em época atual’, diz, modestamente.


Tática 2 Braga dividirá a novela com Ricardo Linhares. ‘Está sendo muito
estimulante. Já escrevi muitas novelas, é difícil vibrar. Um escritor mais novo,
que vibra mais do que eu com o gênero, é um companheiro inestimável’, conta.


Créditos No elenco de ‘Copacabana’, já estão confirmados Cláudia Abreu (que
vai fazer gêmeas), Fábio Assunção (o herói), Tony Ramos e Glória Pires em um
romance paralelo, Isabela Garcia, Marco Ricca, Daniel Dantas, Chico Diaz,
Juliana Knust, Joana Fomm e Yoná Magalhães.’


Thiago Ney e Rafael Cariello


Os novos durões


‘‘Tu tem uma esquizofrenia na voz. É muito estranho.’ ‘Essa empolação, a
maneira de se mexer… Larga mão de ser careta!’ ‘Tu precisa abrir a boca para
cantar.’ É dessa forma que o jurado Carlos Eduardo Miranda trata participantes
do programa ‘Ídolos’.


Em ‘Joga Bonito’, um diálogo entre o técnico Vanderlei Luxemburgo e um garoto
de 15 anos vai na mesma linha. ‘Você gosta de fazer média com todo mundo?’,
pergunta. O menino responde que não. ‘Você então não quer falar mal de ninguém?’
Ele retruca que todos são bons. ‘Eu não acredito.’ O menino insiste que diz a
verdade. ‘Então acho que o ruim é você’, conclui o técnico.


Na cena, parte não-editada do ‘reality show’ que seleciona craques de futebol
entre 15 e 16 anos com estréia hoje à noite, na Band, Luxemburgo é o
jurado/orientador ‘durão’, personagem que se repete em programas de sucesso da
TV americana -como ‘American Idol’ e ‘O Aprendiz’- e que começa a ganhar força
no Brasil. O programa com o treinador do Santos e ‘Ídolos’, do SBT, tentam
seguir essa fórmula.


A diferença é que os ‘durões’ brasileiros são mais ‘cordiais’ que seus
equivalentes ao norte. Num dos episódios da quinta (e atual) temporada de
‘American Idol’, líder de audiência na TV dos EUA, o ‘malvado’ Simon Cowell
reclamou da atuação de um jovem participante e de seus falsetes nos seguintes
termos: ‘É impossível ficar pior do que isso’.


Depois de ouvir a opinião dos outros dois jurados, ele insiste: ‘Não quero
parecer desrespeitoso, mas sabe qual seria o meu conselho para você?
Honestamente: raspe a barba e passe a usar um vestido’. A essa altura, o rapaz,
obviamente, chorava.


Não é exceção. Estilistas achincalham o estilo de uma incauta, em ‘Esquadrão
da Moda’ (People & Arts), dizendo que suas roupas parecem adereços de
prostituta. Meninas são levadas às lágrimas pela ex-modelo Tyra Banks em
‘America’s Next Top Model’ (Sony). Aprendizes de feiticeiro empresarial fazem
fila para ouvir que estão demitidos, em ‘O Aprendiz’ (People & Arts).


Versão ‘light’


Um ‘American Idol’ mais light, ‘Ídolos’ -que vai ao ar às quartas (21h45) e
quintas (22h30)- teve 18 pontos de audiência no último dia 12, um crescimento de
80% em relação à edição da semana anterior, quando estreou no SBT. Além de
Miranda, os produtores musicais Thomas Roth, Arnaldo Saccomani e Cynthia
Zamorano são responsáveis por peneirar os mais de 12 mil candidatos iniciais.
Nesta primeira fase, 117 foram escolhidos em eliminatórias em Recife, Rio,
Brasília, São Paulo e Porto Alegre.


Os jurados escolherão 30 finalistas; depois, o ‘sim’ e o ‘não’ a cada um dos
candidatos será em votação do público. Apesar de seguir à risca a fórmula do
‘American Idol’, Miranda diz que os jurados de ‘Ídolos’ não se preocupam em
copiar o estilo e a agressividade do modelo americano.


‘Temos toda a liberdade de sermos nós mesmos. A única vez que vi ‘American
Idol’ foi quando nos levaram ao SBT para mostrar o formato do programa’,
afirma.


Dos quatro jurados de ‘Ídolos’, Miranda é, no entanto, o mais durão. Ele
explica por quê: ‘Existe no Brasil uma praga de vícios de interpretação: o
elogio da firula, do enfeite, do exibicionismo. Nas eliminatórias, encarávamos
uma maratona de cantores horríveis, médios e alguns ótimos. Tínhamos que manter
o humor’. Em uma das edições, Miranda, produtor de bandas como Rappa e
Raimundos, chegou a se levantar e ir ao banheiro no meio da ‘performance’ de um
participante. Outro candidato cantou de forma tão bizarra que não ouviu nem uma
palavra dos jurados -saiu constrangido da sala sob olhares de desaprovação.


O temperamento dos jurados varia em cada programa. No da última quarta, no
Rio, eles estavam mais bonzinhos com os candidatos do que na edição recifense.
‘É que em Recife apenas nove candidatos foram aprovados. No Rio, houve mais’,
diz Daniela Beyruti, diretora de ‘Ídolos’.


Já Luxemburgo tenta endurecer com os participantes de ‘Joga Bonito’, mas não
segura o sorriso entre uma tentativa de estocada e outra. E quando pergunta
‘Você está com medo?’, e o menino responde desviando o olhar que ‘não’, o
técnico não manda, mas pede: ‘Então olha para mim’.


Segundo Elisabetta Zenatti, diretora da RGB, produtora do programa, embora
ele seja considerado o mais durão dos três, não cumpre um papel predeterminado.
‘Com nossos jurados, a crítica é sempre positiva.’


Para Ivana Bentes, professora da Escola de Comunicação da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, esses programas são uma espécie de ‘escola de
adestramento para a humilhação, o que é necessário até para o funcionamento do
capitalismo’. ‘Isso rege uma série de relações de poder na sociedade
contemporânea’, diz.


‘As pessoas estão lá para isso mesmo. Esse tipo de programa é uma mistura de
peneira musical com humor. Não vejo nada de agressivo ou de ofensivo’, opina
Gabriel Priolli, especialista em TV. ‘Muitos dos que se inscrevem sabem que não
têm condição de ganhar, estão lá para se divertir, para aparecer na
televisão.’


A diferença entre os durões americanos e o ‘sadismo moreno’, defende Bentes,
está na forma menos desbragada com que brasileiros lidam com relações de poder.
‘Há uma dificuldade social de aceitar esse lugar de poder. A gente disfarça
mais.’’




***


Jurados e boleiros disputam atenção


‘Os jurados de ‘Joga Bonito’, ‘reality show’ da Nike em parceria com a Band
que estréia hoje, às 21h, devem disputar com o elenco de garotos de 15 e 16 anos
quem será a estrela do programa.


Vanderlei Luxemburgo divide a decisão sobre quais boleiros ‘passam de fase’
ou não com os ex-jogadores Júnior e Careca. No episódio de abertura, há cenas
dos três em ação nos gramados.


Dribles e gols antológicos dos dois mais ‘novos’ contrastam com uma única
aparição de Luxemburgo dentro de campo, cobrando um pênalti -seguida por
registros do agora técnico à beira do gramado.


Os 24 participantes iniciais foram selecionados a partir de 4.400 meninos
reunidos no final de março no estádio do Pacaembu. É a definição desse grupo que
ocupa o primeiro episódio.


Como não é difícil conseguir garotos bons de bola numa reunião tão numerosa
no Brasil, também é fácil encontrar personagens cativantes. As chuteiras lhes
caem bem na relação de proximidade enorme com a mãe -pré-requisito para craque
bem-sucedido no país- e dificuldades financeiras.


‘Vou oferecer o primeiro gol para minha mãe’, diz um dos meninos. Outro,
reprovado na primeira etapa -de controle de bola-, afirma, chorando: ‘Tive que
pedir dinheiro emprestado para vir. Não vou conseguir dar essa alegria para o
meu pai’. Até um ‘durão’ de almanaque amoleceria com uma realidade
dessas.’


Laura Mattos


Após fracasso em 2005, SBT volta a apostar no cinema


‘O SBT levará adiante o projeto de investir em cinema, apesar do fracasso de
bilheteria de ‘Coisa de Mulher’ (2005), o primeiro filme produzido com apoio do
canal.


O próximo, ‘Seis Crianças e um Bebê’, começa a ser rodado no final deste ano
e tem estréia prevista para as férias de julho de 2007.


Com cara de ‘Sessão da Tarde’, conta a história de seis amigos, três meninos
e três meninas, que encontram um bebê de nove meses em um moisés, num terreno
baldio. O pequeno fora deixado ali por um seqüestrador atrapalhado, que sofre de
incontinência urinária -problema que o levou a abandonar por minutos a vítima e
a perdê-la para a trupe infantil.


O bandido entra em apuros porque tem de entregar o bebê a seu chefe, enquanto
as crianças o levam para uma casa na árvore do quintal de um deles. Lá, sem que
os adultos saibam, tratam de trocar fraldas, dar mamadeira etc. Como se isso já
não fosse suficientemente complicado para eles, ainda vão ter de escapar do
vilão.


O SBT acredita ter mais potencial para divulgar um produto infantil, em razão
do perfil de sua audiência, do que um ‘feminino’, como ‘Coisa de Mulher’.


O longa anterior foi protagonizado por Adriane Galisteu e Evandro Mesquita e
dirigido por Eliane Fonseca (‘Eliana em o Segredo dos Golfinhos’, ‘Ilha
Rá-Tim-Bum – O Martelo de Vulcano’). Custou R$ 4,8 milhões e não chegou nem a
100 mil espectadores, no ano em que ‘2 Filhos de Francisco’ bateu 5,3 milhões. A
produção foi de Diler Trindade, o homem de ‘blockbusters’ de Xuxa Meneghel e
Renato Aragão.


Ele também fará ‘Seis Crianças e um Bebê’ e prevê gastar em torno de R$ 4
milhões com a produção (o filme já recebeu autorização da Ancine para captar a
verba com a iniciativa privada, por meio de leis de incentivo).


O roteiro e a direção serão de Marcus Figueiredo (parêntesis para sua
história: cirurgião plástico bem-sucedido, decidiu largar tudo para estudar
cinema na Universidade da Califórnia em Los Angeles; após quatro anos, voltou ao
Brasil e passou a fazer assistência de direção em filmes da Xuxa e de Aragão; em
2005, dirigiu ‘Didi, o Caçador de Tesouros’).


Para o elenco de ‘Seis Crianças’, Trindade afirma que fará testes,
especialmente entre meninos e meninas que já atuaram em longas-metragens
produzidos por ele, e não pretende utilizar figurinhas famosas da televisão.


Tanto em ‘Seis Crianças e um Bebê’ como em ‘Coisa de Mulher’, o SBT não entra
com dinheiro diretamente, mas abre espaço de divulgação em intervalos comercias
e programas, além da possibilidade de fornecer elenco.


É um modelo semelhante ao da Globo Filmes, braço cinematográfico da emissora,
cuja marca está associada à grande parte dos lançamentos do cinema nacional
(veja ao lado). A Record também entrou nesse circuito no ano passado, quando
estreou ‘Eliana em O Segredo dos Golfinhos’. É um bom momento, já que seu elenco
cresceu em razão das novelas.’


Marcelo Bartolomei


Sem convite para filmar, Sonia volta à TV


‘De volta ao Brasil para a mais longa temporada de trabalho em 18 anos de
estadia nos EUA, a atriz Sonia Braga, 55, está magoada com o cinema nacional.
Por falta de convites para filmar, ela volta à TV, veículo que impulsionou o
início de sua carreira. ‘Os cineastas acham que não podem pagar o meu cachê’,
afirma.


Mas o fator financeiro parece importante: pesou na decisão de voltar ao Rio.
Ela negou uma proposta (ninguém fala em valores) da Record e ficou na Globo, que
ofereceu mais. Na novela ‘Páginas da Vida’, de Manoel Carlos, prevista para
julho, ela viverá Tônia, artista plástica internacionalmente conhecida que,
coincidentemente, também volta ao seu país de origem. Sonia -que admite ter
feito plástica para ‘rejuvenescer’ e evitar personagens ‘acabados’- deve
permanecer no país por um ano -ou mais, se lhe oferecerem mais papéis. ‘Moro
onde trabalho’, diz a atriz.


Folha – Por que você voltou?


Sonia Braga – Eu sempre ensaiei voltar. Mas ninguém me chamava para trabalhar
da maneira como eu queria. Recebi vários convites, mas nada que me interessasse.
Nada que valesse abandonar o que estava fazendo nos Estados Unidos para ficar
aqui. Agora, é um prazer voltar, fazer a novela, reencontrar amigos que fazem
parte da minha vida.


Folha – Vale a pena interromper sua carreira nos EUA para fazer novela no
Brasil?


Braga – Eu moro onde trabalho. Um diretor indiano me convidou para fazer um
filme lá. Se me interessar, eu vou. Tudo o que eu fiz nos EUA foi importante
para mim. Meu trabalho lá é muito importante para a representação
latino-americana no cinema mundial.


Folha – Você representa o cinema nacional no exterior. Por que não participa
mais dele?


Braga – Quem disse que um diretor brasileiro não pode me pagar? Claro que
pode, é só negociar. Eu estou aqui e quero filmar. Gostaria de trabalhar com
Guel Arraes, Fernando Meirelles e Carlos Diegues. O cinema brasileiro precisa de
dinheiro, claro. Quem disse que dinheiro não traz felicidade? Não se pode mais
depender do Estado. O nosso cinema não é realmente uma indústria.


Outra coisa: não há roteiristas. É preciso escrever papéis para a Fernanda
Montenegro, grande atriz. Quando ela voltou do Oscar [indicada por ‘Central do
Brasil’, em 1999], demorou a fazer outro filme. Isso deveria ter sido imediato,
se utilizando do prestígio que ela ganhou em Hollywood. Se o cinema não é uma
prioridade, saiba que ele pode trazer divisas ao país.


Folha – Por que os diretores brasileiros deveriam chamá-la?


Braga – Tenho certeza de que eles ainda não precisaram de mim. Se eu fizer um
filme com todas as características do nosso povo e para a platéia brasileira, e
esse filme viajar, tenho uma vantagem em poder divulgar melhor nosso cinema no
exterior. Quando fiz ‘Dona Flor e Seus Dois Maridos’, não falava uma palavra em
inglês. Fora isso, tenho muitos amigos.


Folha – Você se orgulha da carreira internacional que fez?


Braga – Fiz um pouco de tudo, inclusive um filme gay, ‘Testosterona’ (2003).
Fiz mulheres latinas, o que me orgulha muito. É importante para os hispânicos
dos EUA que a gente trabalhe lá. Antes mesmo de ser uma cidadã norte-americana,
participo de uma fundação que cria bolsas de estudos para latinos em
universidades importantes. Essa visão de que os latinos fazem trabalhos não
muito importantes é falsa, pois divulgam a nossa cultura e a nossa arte.


Folha – Você volta em ano de eleições. Pretende votar?


Braga – O meu voto é secreto. Minhas lutas serão sempre em relação à minha
área, à minha profissão. Tem muita coisa que eu não entendo do Brasil. Mas
sempre lutei por minha classe e para que haja empregos, principalmente.


Folha – Como será sua personagem?


Braga – Não sei muito dela ainda. Eu quero que as mulheres da minha idade se
identifiquem comigo. Nesse momento, quero exercer minha profissão de uma maneira
bacana, que chame a atenção para minha personagem.


Folha – Você fez plástica recentemente? Incomoda-se em falar sobre isso?


Braga – Claro que não! Eu sempre disse que não iria fazer, mas quando era
jovem. Fiz em 2001, com o [Ivo] Pitanguy. Chegou um momento da minha carreira em
que eu decidi que não queria mais ser a mãe doente e acabada do filme. Percebi
isso depois de ‘Olhar de Anjo’ (2001), com a Jennifer Lopez. Eu não gostaria de
ter de fazer implante de silicone; botox eu já coloquei um pouquinho. Atualmente
eu parei com esportes, mas eu gosto muito de jogar tênis e de fazer pilates. Mas
as pessoas não têm idéia do esforço que é manter o peso. Afinal, eu preciso
entrar nos vestidos que ganho dos meus amigos estilistas.


Folha – Você ganha vestidos! Sabia que a doação de vestidos para a mulher do
ex-governador de São Paulo gerou um escândalo na política?


Braga – Não, não sabia. Mas ela não poderia ganhar mesmo. É a lei, né? Já eu,
posso.’


Pedro Butcher


Do ‘star system’ brasileiro ao nicho latino nos EUA


‘Nos anos 70, Sônia Braga foi musa de dois projetos alimentados pela política
nacionalista da ditadura: a Embrafilme e a TV Globo. Ao viver personagens de
Jorge Amado na novela ‘Gabriela’ (75) e no filme ‘Dona Flor e Seus Dois Maridos’
(76), virou uma espécie de encarnação da sensualidade brasileira, e sua
popularidade explodiu. Depois, alternou filmes (‘A Dama do Lotação’, ‘Eu te
Amo’) e novelas (‘Espelho Mágico’, ‘Dancin’ Days’), se afirmando como símbolo do
‘star system’ brasileiro.


Quando a Embrafilme começou a dar sinais de falência, optou por continuar
investindo na imagem de estrela. O sucesso de ‘O Beijo da Mulher-Aranha’ (85),
de Hector Babenco, foi a deixa para que partisse em busca de uma carreira nos
EUA. ‘O Beijo’ foi o (raro) bem-sucedido exemplar de um cinema independente de
características multinacionais, falado em inglês. E deu muito certo. Passou em
Cannes, levou quatro indicações ao Oscar e garantiu à atriz visibilidade no
fechadíssimo mercado americano.


Nos EUA, porém, ela foi rapidamente aprisionada pela cultura quase fascista
dos nichos mercadológicos, que delimita espaços fixos para os atores de perfil
‘latino’. O sonho cinematográfico foi dando lugar a participações em
seriados.


Em 96, Sônia voltou ao universo de Amado com ‘Tieta’, de Carlos Diegues, e
agora, dez anos depois, reconcilia-se com a novela, quem sabe para reassumir o
posto de estrela brasileira.’


Bia Abramo


Um Brasil legal demais em ‘Central da Periferia’


‘Num primeiro momento, há duas maneiras de ver ‘Central da Periferia’, a
novidade do trio Regina Casé-Hermano Vianna-Guel Arraes que estreou na Globo
sábado passado. É uma série de quatro programas mensais que combina um show ao
ar livre -o primeiro foi gravado no Morro da Conceição, Recife- com reportagem e
tenta mapear a produção cultural das periferias de grandes centros urbanos -os
próximos serão em São Paulo, Rio e Belém.


A primeira visão, otimista, faz coro ao texto de Hermano do anúncio de página
inteira publicado nos jornais no dia da estréia e constata, maravilhada, que a
periferia, que é linda, tornou-se mais central do que o centro. A segunda,
pessimista, desconfia do auê todo (anúncio-manifesto? Página inteira? Tudo isso
depois que um documentário como ‘Falcão’ tomou metade do ‘Fantástico’?) e fica
se perguntando o que tudo isso está fazendo na Rede Globo.


OK, otimismo e pessimismo, assim, em estado bruto, dão ótimo material para
piadas, mas maus conselhos.


‘Central da Periferia’ clama mais pela adesão do que pela apreciação, ou
seja, mais do que mostrar, digamos, a periferia ou de fato o que de ‘legal’
acontece por lá, é preciso fazer muitas afirmações a respeito, elaborar quase
que manifesto mesmo (não à toa, a publicidade adotou o mesmo ‘conceito’). A
mediação vem pronta demais, amarrada demais.


Desde ‘Brasil Legal’, há uma espécie de euforia autocongratulatória nesse
trio que provoca algum mal-estar. É como se pela simpatia, pela antropologia e
pela, uhn, ascendência, Guel, Hermano e Regina Casé detivessem a chave ‘certa’
para falar com os pobres (mas criativos), com os excluídos (mas cheios de
estilo). Então, em alguns momentos, o tom fica excessivamente proselitista, como
que ensinando o que olhar e como olhar, como recortar esse Brasil mais vital (a
periferia produtora de formas culturais novas) do Brasil mais duro (as imagens
‘feias’ da pobreza), de forma a conscientizar o Brasil mais bobo (a classe média
tonta, mas, no fundo, do bem).


Mas, à medida que o programa avança, também não se pode escapar de algumas
evidências -que Regina Casé é dona de uma comunicabilidade incrível, que a
reflexão de Hermano que sustenta o roteiro é bastante consistente e que talvez
haja ali, de fato, o registro de caminhos para reconectar experiências sociais e
culturais muito apartadas.


O formato híbrido -reportagem-entretenimento, showmício e entrevistas- é uma
espécie de achado, embora talvez fosse mais interessante se os números musicais
tivessem mais autonomia, estivessem menos a serviço do roteiro. Afinal, a idéia
não é fazer a periferia falar por si?’




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