‘Na edição de 2 de dezembro, publicou-se, no alto da pág. 21, uma fotografia mostrando a prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins, assinando um documento, tendo ao seu lado o vice-prefeito, Carlos Veneranda. A legenda da foto, com a palavra ‘correção’, destacada em letras maiúsculas e negrito, dizia o seguinte: ‘O Povo publicou foto de seu Banco de Dados ilustrando a manchete da página 20 da edição de ontem (1º/12) ‘Câmara reajusta salários da prefeita e do vice’. Por um equívoco de edição, deixou-se de informar ao leitor que se tratava de uma imagem meramente ilustrativa, relacionada a evento sem qualquer relação com o fato que era noticiado. A prefeita Luizianne Lins e seu vice, Carlos Veneranda, não participaram da sessão em que foi aprovado o reajuste dos salários – fato que ocorreu na quinta-feira, por iniciativa da Câmara Municipal’.
Em conversa com o editor-adjunto de Política, Guálter George, ele me diz ter a ressalva sido feita depois de a editoria haver recebido telefonema da assessoria da Prefeitura reclamando que a foto deixava a impressão errada que a prefeita assinava seu próprio reajuste. Segundo a assessoria – como também deixava bastante claro o texto da matéria do dia 1º/12 – a iniciativa fora da Mesa Diretora da Câmara dos Vereadores.
De fato, a fotografia não é recente. Recorri ao Banco de Dados do jornal e verifiquei ter sido a imagem obtida pelo repórter-fotográfico Edimar Soares, em outubro de 2005, por ocasião da assinatura de um convênio entre a Prefeitura e o Ministério das Cidades, segundo consta nos registros. Observei também, em comentário interno, a improcedência de a ‘correção’ da editoria ter justificado a foto como ‘imagem meramente ilustrativa’, pois em jornalismo, tanto quanto o texto, a imagem é, ou deveria ser, informação.
De novo
Não é a primeira vez a ocorrer problema dessa natureza. Em abril, na coluna ‘Os erros e a fotos’, abordei assunto parecido. Naquele momento, quem ficou em situação embaraçosa foi o presidente do Partido Verde, Marcelo Silva. Ele aparecia, em segundo plano (sem ter seu nome citado), em foto ilustrando matéria anunciando a nomeação de um novo secretário pelo governador do Estado. Marcelo escreveu ao ombudsman dizendo ter o episódio causado-lhe transtornos políticos, pois era conhecida a ‘posição de independência’ de seu partido em relação ao governo do Estado, tendo a imagem passado a impressão errada de que ele participara de negociações para nomear o novo integrante do governo. Recorrendo aos arquivos, verifiquei que foto havia sido feita dois anos antes, quando ele ainda era presidente da Associação dos Municípios e Prefeitos do Ceará (Aprece). Na ocasião, escrevi que usar fotos antigas, ou colhidas em circunstâncias diferentes da notícia publicada, era uma prática que o jornal teria de solucionar ou se haveria com mais problemas à frente. Não era preciso ser vidente para saber que o prognóstico se realizaria. E continua valendo para situações equivalentes.
Além dos problemas editoriais, a publicação de fotos antigas com o crédito ‘Bancos de Dados’, sem a indicação da data e de seu contexto, irrita os fotógrafos do jornal, que já se queixaram ao ombudsman. No jargão das Redações, ‘crédito’ indica a autoria de uma imagem ou texto. No caso das fotos, o nome do autor é anotado, normalmente, no alto e à direita da imagem. Na correria do fechamento, os editores acham mais cômodo e mais rápido anotar o crédito como ‘Banco de Dados’ para economizar tempo, deixando de verificar o nome do fotógrafo e a origem da fotografia para complementar as informações.
Aumento
Há outra questão relevante neste assunto. Se não foi a própria prefeita a demandar pelo aumento de 40,9% de seu salário e do vice, por que a Mesa Diretora da Câmara tomaria essa iniciativa pouco comum, visando ‘acabar com uma defasagem dos subsídios dos chefes do Executivo Municipal’, como anota a notícia publicada em 1º de dezembro?
A resposta pode estar na nota ‘Os médicos têm algo a ver com o salário da prefeita?’, publicada pela coluna ‘Política’ (pág. 18, edição de 2/10), assinada pelo jornalista Fábio Campos. O colunista informa que, caso o reajuste da prefeita não fosse concedido, haveria a ‘obrigatória redução, definida em lei, dos vencimentos dos servidores que estavam ganhando acima do que recebia Luizianne Lins’. Ainda, segundo a coluna, seria o caso de ‘dezenas de médicos que atuam no IJF (Instituto Doutor José Frota)’, e continua: ‘Deu-se o inusitado: os próprios (médicos) se mobilizaram e pressionaram pela aprovação do reajuste salarial da prefeita com o objetivo de manter os seus (salários)’.
A editoria Política deixou de investigar com mais rigor uma informação crucial para que os leitores entendessem o motivo de a Câmara dos Vereadores oferecer o aumento aos subsídios da prefeita e de seu vice. Uma história sem precedentes conhecidos: a mobilização de funcionários públicos pressionando por aumento para seus chefes, como forma de se beneficiarem subsidiariamente.
Há 50 anos
De um leitor, recebi e-mail dizendo ter-lhe ‘causado espanto’ a nota da seção ‘O Povo há 50 anos’ sobre um ataque das forças militares do então dirigente de Cuba, Fulgêncio Batista, ao Movimento Rebelde 26 de Julho, no qual teriam morrido 40 de seus comandantes, ‘inclusive o advogado Fidel Castro, principal líder da resistência’. Observei que o leitor tinha razão, pois Castro continua vivo, e pedi que fosse feita a correção. Do editor de Opinião, Valdemar Menezes, responsável pela seção, recebi a seguinte resposta: ‘O leitor deve ser informado da natureza do espaço, que é a de reproduzir os acontecimentos do dia, como foram publicados na ocasião. No caso, as agências internacionais publicaram essa versão, que seria desmentida depois. Isso é natural. Não há o que corrigir.’ Entendo que na coluna ‘O Povo há 50 Anos’ deveria ter sido editada uma nota alertando sobre o contexto em que se deu a publicação original, nos mesmos moldes da explicação dada pelo editor ao ombudsman.’