O editor-executivo do USA Today, Brian Gallagher, pediu demissão. Karen Jurgensen, editora-chefe do USA Today, tinha saído alguns dias antes. Motivo: um dos principais repórteres do jornal, Jack Kelley, confessou que inventou informações numa boa parte das notícias que publicou.
Há algum tempo a crise atingiu o New York Times, também com escândalo, também com demissões.
Ainda bem que no Brasil as coisas são diferentes. Aqui já publicamos notícias sobre a criação do IV Reich, sobre um cavalheiro em Minas Gerais que gostava de ouvir as ondas do mar, sobre reuniões de duas personalidades que jamais ocorreram, mas que foram relatadas com precisão de detalhes e transcrição, entre aspas, dos diálogos que não tiveram. Tivemos um bebê-diabo que tomava ônibus, tivemos uma loira fantasma que seduzia motoristas paqueradores, tudo devidamente publicado (e, portanto, chancelado) por importantes empresas jornalísticas. No Brasil, até alguns escândalos foram fabricados, para atingir pessoas que de alguma forma prejudicavam os interesses de veículos de comunicação.
Mas, como diziam os portugueses logo após o Descobrimento, não existe pecado ao Sul do Equador. Ainda bem!
Hora de colher
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ao Ratinho que adubou e agora vai colher. Ninguém na imprensa notou a modéstia de Sua Excelência: não foi só ele que adubou, não. Muita gente do governo o auxilia nessa tarefa. E continuam adubando.
Precocidade
Frase publicada num grande jornal: ‘Um dos presos ontem foi identificado como Marcel Souza, 30. Sua mãe, Maria Rosilda da Silva, 35 (…)’
A situação do país está piorando: o já grave problema da gravidez na adolescência se transfere para a infância.
A cor de quem morre
Não há números precisos, já que se trata de região remota; mas a guerra de mais de 30 anos entre os muçulmanos do Norte do Sudão e os cristãos do Sul está terminando, com a vitória dos muçulmanos. A ‘limpeza étnica’ é uma das maiores da História: cerca de 700 mil pessoas de fé cristã tiveram de fugir para países vizinhos, empurrados pelos vitoriosos; e a quantidade de mortos é imensa.
O caro leitor com certeza não leu nada a respeito dessa tragédia humana – ou talvez tenha lido aquelas noticinhas minúsculas. TV? Nem sonhar: nenhuma rede brasileira enviou equipes de cobertura. E, como o jornalismo europeu e americano raras vezes se preocupa com o que acontece na África, de onde surgiriam as imagens?
Não é a primeira vez (e, provavelmente, não será a última): as guerras de independência de Angola e Moçambique, a guerra civil de Angola, a barbárie da guerra civil de Serra Leoa (onde o hábito era cortar o braço dos civis), a tragédia de Ruanda.
Nossos meios de comunicação jamais concordarão com isso, mas o motivo básico que os levou a ignorar estes massacres é um só: as vítimas são pretos, são pobres, são subdesenvolvidos.
É campeão!
O São Caetano foi campeão paulista com todos os méritos. Parabéns! Pena que a imprensa não tenha mostrado com clareza que o clube recebe o inestimável auxílio da Prefeitura de São Caetano. Este colunista não entra no mérito da questão, se o apoio oficial é bom ou ruim; mas deve ser noticiado. E o prefeito Luis Tortorello jamais negou este fato.
Falando latim. E errado.
Deu no jornal: ‘Faltam professores em vários campus da Unesp’. Faltam mesmo – e faltam professores também nos jornais. ‘Campus’ é latim; em latim, o plural é ‘campi’. Há quem aportuguese a palavra e utilize o plural ‘campuses’. Mas usar o singular com ‘vários’ é a mesma coisa que dizer que a notícia saiu em ‘vários jornal’. Tudo muito bom, tudo muito bem, afinal de contas temos gente importante falando ‘menas’, mas a imprensa não deveria usar uma linguagem, no mínimo, mais ou menos correta?
Falando português. E errado.
Deu no jornal que o goleiro palmeirense Marcos e o atacante colombiano Muñoz, seu colega de time, ‘protagonizaram cenas de boxe’. Prossegue a narrativa: ‘O goleiro deu um chute no colombiano’. Este colunista deve estar ficando desatento: jamais tinha percebido que o chute fazia parte dos golpes do boxe.
Nasceu Getúlio
Saiu na imprensa uma ampla matéria sobre os filmes brasileiros que têm como assunto o ex-presidente Getúlio Vargas. Motivo: em agosto, 24 de agosto, o suicídio de Getúlio completará 50 anos.
O detalhe curioso é que a matéria saiu no dia 19 de abril – e ninguém mencionou que 19 de abril é a data de nascimento de Getúlio Vargas. Getúlio nasceu há 122 anos – mas como lembrar do fato se, ao pesquisar os filmes, esqueceram de pesquisar a vida do personagem?
Coisa boa
Parabéns ao portal eletrônico Primeira Leitura: foi o único a condenar o assassínio de garimpeiros por índios, em Espigão do Oeste, Estado de Rondônia. Morreram 29 (número confirmado); outros doze estão desaparecidos. E o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, explicou que os garimpeiros exerciam uma atividade ilegal.
Sim; e, portanto, que sejam mortos. Em quantos outros países um ministro diria uma barbaridade dessas e continuaria ministro?
Pingos nos ‘is’
Ninguém discute se os garimpeiros tinham razão ou não. Ninguém discute se suas atividades eram ilegais ou não. Imaginemos que não tivessem razão alguma e que suas atividades fossem totalmente ilegais. E, por isso, deveriam ser mortos?
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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados Comunicação, e-mail (carlos@brickmann.com.br)