A aprovação da Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005) representou uma grande derrota para os ambientalistas brasileiros, porque liberou o plantio e a comercialização da soja transgênica (até então proibida por decisão judicial) sem a realização do Estudo de Impacto Ambiental e conferiu à CTNBio, um colegiado de cientistas, o poder de tomar decisões importantes para a saúde humana e o meio ambiente, retirando a competência e órgãos federais responsáveis por esse tema (Anvisa e Ibama). Um novo capítulo dessa derrota pode vir a público no processo de votação da MP 327, de 31 de outubro de 2006, em tramitação na Câmara dos Deputados.
A medida provisória permitiu o plantio de organismos geneticamente modificados nas zonas de amortecimento das Unidades de Conservação e nas áreas de proteção ambiental. Apesar de representar, em si, um grande retrocesso, a MP recolocou na pauta do Congresso a flexibilização das já limitadas regras sobre transgênicos, o que pode resultar em recuos ainda maiores nesse tema.
Os deputados da bancada ruralista propuseram diversas emendas ao texto original da MP que, desconsiderando o princípio da precaução e as regras mínimas de avaliação de risco, promovem uma verdadeira desregulamentação da biossegurança no país. Além de autorizar a utilização das tecnologias genéticas de restrição de uso (que permitem o desenvolvimento de sementes estéreis), as emendas pretendem diminuir o número de integrantes da CTNBio (de 27 para 18), especialmente os da sociedade civil, além de visarem reduzir o quorum necessário para aprovações comerciais (de 2/3 dos membros da Comissão por maioria simples). Além disso, buscam autorizar a utilização do algodão transgênico plantado ilegalmente na safra 2005/06.
A bancada ruralista e os lobistas das multinacionais da biotecnologia querem arrefecer ainda mais a normatização dos transgênicos no Brasil. Questionam duramente a atuação da Comissão, sobretudo a atuação de representantes de ministérios responsáveis pela avaliação de risco ao meio ambiente e à saúde, e de representantes da sociedade civil e dos movimentos sociais, comprometidos com o cumprimento de normas de biossegurança. Os ruralistas não estão satisfeitos com a vitória obtida com a aprovação da Lei de Biossegurança. Querem mais. Desejam o fim de toda e qualquer regra que salvaguarde a saúde humana e o meio ambiente.
A justificativa da MP? Unicamente atender à gritaria das transnacionais (como Syngenta, Bayer e Monsanto) e de setores do agronegócio, para que novas variedades transgênicas, especialmente de milho, sejam rapidamente liberadas pela CTNBio.
A relatoria do Projeto de Conversão da MP 327 está com o deputado federal Paulo Pimenta (PT/RS). Infelizmente, o relatório do companheiro de partido piora ainda mais o texto da MP. Além de manter a redação proposta pela Presidência da República, o substitutivo do relator, entre outras inclusões, modifica o quorum na CTNBio para aprovações comerciais de OGMs, reduzindo-o de 2/3 dos membros (18 votos favoráveis) para maioria absoluta (14 votos favoráveis), e autoriza a utilização do algodão transgênico plantado ilegalmente na safra atual.
O Brasil já cedeu muito em matéria de transgênico. Mais um recuo pode comprometer o meio ambiente e a saúde das futuras gerações. Os ecossocialistas e ambientalistas brasileiros esperam que a porteira aberta pela MP 327 não sirva para passar a boiada do agronegócio e das multinacionais de biotecnologia. Assim, na votação em plenário, precisamos derrotar as emendas dos ruralistas incorporadas pelo relator e evitar que outras modificações para pior sejam inseridas no texto da medida provisória.
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Deputado federal (PT/MG) e coordenador do Núcleo de Meio Ambiente da Bancada do PT