Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A Bolívia é muito longe daqui

Uma empresa privada brasileira, a siderúrgica EBX, foi expulsa da Bolívia pelo governo do presidente Evo Morales. Seu proprietário, Eike Batista, estima os prejuízos em 20 milhões de dólares.

Uma empresa estatal brasileira, a Petrobras, é hostilizada na Bolívia pelo governo Evo Morales. A Petrobras é a maior investidora estrangeira na Bolívia; e o gás natural que traz de lá supre a maior parte do consumo brasileiro.

Resumindo: empresas brasileiras públicas e privadas são hostilizadas por um país vizinho, sofrem prejuízos, o próprio Brasil corre o risco de desabastecimento (ou de alta substancial dos preços) num setor estratégico, o dos combustíveis.

Enquanto isso, nossos veículos de comunicação se preocupam exclusivamente em descobrir se algum parlamentar anda roubando o cachorro-quente de criancinhas ou batendo a bolsa de uma velhinha desamparada. Não há um só enviado especial à Bolívia (e deveria haver dois: em La Paz e Santa Cruz de la Sierra).

Corrupção é tema importante, mas não é o único. Se, por causa dos acontecimentos na Bolívia, houver falta de eletricidade no Brasil, e os táxis pararem sem gás nos tanques, nós, por acaso, explicaremos que ninguém acompanhou direito esse caso porque o Zé Dirceu tomou um ônibus para casa e toda a reportagem estava investigando de onde é que saiu o dinheiro com que pagou a passagem?

Está na hora de a imprensa brasileira perceber que o Brasil tem interesses internacionais e precisa de notícias sobre eles.



Crime contra a Constituição

O jornal Imprensa Livre, único diário do Litoral Norte de São Paulo, denuncia: está sendo ameaçado pelo prefeito de São Sebastião, Juan García, do PPS. Henrique Veltman, jornalista de primeira linha, que dirigiu alguns dos principais jornais do país e é diretor-responsável do Imprensa Livre, conta que García está adotando uma série de medidas administrativas com o objetivo de calar o jornal. A sede da empresa só não foi lacrada nem interditada pela Prefeitura por ter obtido uma liminar de Fernando Henrique Pinto, juiz da 1ª Vara Cível.



Coisa feia!

A prefeitura de São Sebastião e o Corpo de Bombeiros se aliaram na tentativa de interditar o prédio do jornal – exigindo cada dia uma coisa diferente, de um corrimão na escada de acesso até regularização da gráfica (que está há 14 anos no mesmo endereço e sempre teve alvará da prefeitura). Prefeito Juan García: chega! Ter a administração fiscalizada por um jornal pode ser desagradável, especialmente se houver motivos para isso; mas a resposta pode perfeitamente ser dada, caso haja erros, no próprio jornal, ou na Justiça. Fechar é coisa de regime ditatorial. E não nos disseram que o PPS, embora seja o novo nome do Partido Comunista, tinha passado a aceitar a existência da oposição e da imprensa livre?



E os outros?

A propósito, este colunista sabe que São Sebastião fica a alguma distância da capital paulista. Mas isso não é desculpa para que os jornais nacionais, as rádios e as TVs finjam que o assunto não existe. É preciso mostrar para o prefeito que a imprensa é livre e só pode ser imprensa enquanto for livre.



De mortuis nihil nisi bonum

Telê Santana foi um grande jogador, sem dúvida – mas jogou numa época em que, na sua posição, havia Garrincha, Julinho, Cláudio, Joel, Friaça – mesmo em fim de carreira, um craque. Como técnico, foi ainda melhor, embora não tenha conseguido levar a Seleção Brasileira ao título mundial. Montou grandes equipes, que jogavam bonito, a cujo futebol era gostoso assistir.

A imprensa mostrou o técnico, mostrou pouco o jogador. Mas esqueceu alguns senões de Telê técnico – afinal de contas, nem ele era perfeito! Este colunista lembra que Telê resistiu muito a escalar Sócrates e Zico no mesmo ataque, alegando que ambos jogavam na mesma posição. E reduziu dramaticamente o futebol de Serginho Chulapa, obrigando-o a ser um cavalheiro em campo. Botou o canhoto Dirceu na ponta-direita, ocupando a vaga de Renato Gaúcho, que dispensara por motivos disciplinares. E ninguém pode esquecer de Jô Soares, com um palito na boca, recomendando em seu programa humorístico de televisão: ‘Bota um ponta, Telê!’



Os Francenildos

Um leitor desta coluna, homem versado em Administração e Finanças, escreve para dizer que não entende por que tanta indignação da imprensa com a quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo. Em sua opinião, juntando-se a CPMF, a obrigatoriedade do cheque nominal e a informação à Coaf de movimentação acima de determinado limite, o sigilo bancário se transformou em ficção. A propósito, vale a pena ler o artigo ‘Milhares de sigilos bancários são quebrados impunemente‘, de Aline Pinheiro, publicado originalmente no Consultor Jurídico.



Primeiro condenar…

É incrível: toda aquela conversa das escolas de jornalismo e dos manuais de redação, a respeito do princípio constitucional da inocência até prova em contrário, foi jogada para escanteio. Qualquer medida judicial em favor de réus é chicana – mesmo que seja para garantir-lhes o mais elementar direito de defesa; qualquer absolvição é pizza, independente de prova. Qualquer declaração do acusador é, em princípio, aceita como verdade pelos meios de comunicação. A única discussão que se trava é de onde sai o dinheiro para pagar os advogados. Só que este é um direito básico: ninguém pode ser julgado sem advogado!



…depois julgar

Basta observar os títulos dos jornais (‘mensaleiros’, ‘dança da pizza’) para verificar que qualquer pretensão à imparcialidade foi abandonada. Na TV, as caras e bocas dos apresentadores são inequívocas. No rádio, a entonação dos locutores, quando se referem à defesa, procura ridicularizar os argumentos. Este colunista já participou de dezenas de conversas sobre objetividade e imparcialidade, e acredita que não é possível ser totalmente imparcial, nem totalmente objetivo. Mas deve-se, em nome do bom jornalismo, ao menos tentar alcançá-las..



Menos, menos!

A Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados aprovou projeto que limita a seis horas a jornada de trabalho de operadores de telemarketing. Já é um avanço; mas é um avanço muito pequeno. O horário de trabalho do telemarketing deveria ser bem menor! Para que a felicidade seja possível, quanto menos gente ligando em horas inconvenientes para estar informando de um novo serviço que vai estar sendo disponibilizado para que estejamos possando utilizá-lo é melhor.



Como é mesmo?

A notícia abaixo surgiu num portal e, pouco depois, apareceu de novo no mesmo portal. Informava às 17h29 que a universidade de Bath, na Inglaterra, desenvolveu um automóvel de um metro de comprimento para desafogar o trânsito. Às 17h31, sem que a notícia anterior fosse retirada, sem que houvesse qualquer desmentido, informava-se que a universidade de Bath desenvolveu um automóvel de um metro de largura. Este colunista até agora não consegue imaginar como é esta nova versão de Romi-Isetta.



E eu com isso?

Notícias retiradas de jornais, rádios, TVs e, principalmente (que grande veículo para informações absolutamente inúteis!), portais de internet:

1. Gillian Anderson, 37 anos, a agente Dana Scully da extinta série Arquivo X, se separou do marido, o cineasta Julian Ozanne, depois de 16 meses de casamento.

2. Tom Cruise diz ser responsável pelas fraldas de Suri.

3. Machos das aranhas preferem as pequenas, gordinhas e virgens.

4. Suposto piercing em seio de atriz desperta curiosidade (a propósito, a atriz é a conhecidíssima Maggie Q.). A propósito, que será um ‘suposto piercing’?

5. ‘Já sofri por ciúme’, diz Fábio Assunção.

6. Marcos Pasquim faz festa para filha em clima ruim com a mulher.

7. Daniela Cicarelli visita o Peru pela primeira vez. 

E agora, a campeã absoluta, aquela informação sem a qual não dá para entender como é que vivemos até hoje.

8. Michael Jackson poderá morar em castelo suíço.

Como não diria o Cid Moreira, não é fantástico?

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados.