Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Último Segundo

GOVERNO LULA
Alberto Dines

O PT e a arte de ser oposição, 04/05/07

‘Letargia e inação dominam o quadro político brasileiro, mas nem o governo, seu partido e seus aliados são os únicos responsáveis. A oposição, ou a falta de oposição, contribui decisivamente para o ambiente desolado e desanimado, no máximo interrompido por breves e burocráticos resmungos.

Os remanescentes do antigo PFL parecem baratas tontas: perderam meses discutindo o novo nome do partido e afinal escolheram a abreviação suicida (‘Dem’) que tem tudo para lembrar o demo e quase nada a aproximá-lo do compromisso democrático. A breve e lamentável passagem de Cláudio Lembo pelo governo paulista e a histórica bipolaridade do senador ACM, entre outros exemplos chocantes, revelam um DNA marcado pela vocação para o servilismo.

O desfibramento da oposição pode ser basicamente identificado no seu principal partido, o PSDB. Embora inspirado na combinação da social-democracia do pós-guerra europeu com o ‘New Deal’ americano, o partido é na verdade um clube de candidatos. Surgiu como trincheira contra as jogadas caudilhescas de Orestes Quércia para tomar conta do PMDB paulista e desde então é empurrado pelo talento dos principais postulantes. Deu certo quando FHC, ainda ministro da Fazenda de Itamar Franco, implantou o Plano Real e começou a soçobrar quando o governo e o seu partido aceitaram o veto bonapartista do mesmo ACM à indicação de José Serra como ministro do Desenvolvimento.

José Serra em 2002 chegou à arena para enfrentar Lula já batido e abatido pelo fogo amigo dos correligionários e supostos aliados. É preciso não esquecer a dramática observação do presidente FHC sobre a mais devastadora traição do presidente do partido, Tasso Jereissati: ‘Essa foi uma facada pela frente’.

O ninho dos tucanos, apelidado de tucanato é, na verdade, um serpentário alimentado abertamente pelas ambições pessoais, sem qualquer suporte ideológico diferenciador (caso das tendências petistas). A candidatura Alckmin resultou do mesmo voluntarismo medíocre e provinciano, desprovido de recheio político ou programático.

Em matéria de oposição, incluindo o período áureo da UDN (1945-1964), o PT foi exemplar. Criou um paradigma de coerência e militância que dificilmente será igualado. Como entidade política foi mais organizado, portanto mais eficaz, quando divergia do governo FHC do que ao apoiar o do companheiro Lula. Graças ao PT, como oposição, temos hoje uma referência concreta para perceber a extensão dos seus pecados como situação.

A visita de Tasso Jereissati, presidente do PSDB, ao presidente da República foi insensata, oportunista, deletéria. Faria sentido em maio do ano passado, como gesto de solidariedade, quando o Brasil foi agredido pelos delírios xenófobos de Evo Morales. Agora, diante de um governo seduzido por unanimidades, sugere capitulação.

Aécio Neves e José Serra têm razão quando afirmam que não cabe a um governador eleito pela oposição confrontar-se com o governo central. Nosso precário federalismo, ao contrário do norte-americano, torna impossível a vida de um governo estadual independente.

Quem faz oposição é o Congresso, ele é o fórum legitimo para produzir e ecoar contrastes, divergências e assimetrias. É no Parlamento (mesmo nos regimes presidencialistas) que, teoricamente, confrontam-se as idéias e ações dos partidos que representam o povo.

A democrata Nancy Pelosi não está preocupada com as emendas que o seu partido emplacará no próximo orçamento, nem lhe importam as opiniões de Bush a seu respeito. Está comprometida com os eleitores que a elegeram para enfrentar e, se possível, derrotar a Casa Branca.

A oposição e, sobretudo, o PSDB, tem o dever histórico e patriótico de comportar-se com altivez e dignidade nas CPIs da Câmara e do Senado constituídas para investigar o chamado Apagão Aéreo. O fato deflagrador não foi um escândalo financeiro ou eleitoral, foi uma catástrofe com 154 vítimas – a maior da história da nossa aviação – estendida e magnificada ao longo de mais de sete meses pelo comportamento errático, capcioso e irresponsável das autoridades civis e militares de todos os escalões.

Um cafezinho (ou uisquezinho) com o presidente da República faz bem ao ego, garante instantaneamente um verbete na história política. Mais importante seria mirar-se no exemplo do PT quando foi oposição e provocou um aguerrido e estimulante confronto de idéias.’

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