MÍDIA & POLÍTICA
Pimenta só nos olhos dos outros
‘Depois de uma semana em que Lula atacou duas vezes a imprensa, voltam as perguntas de sempre. Você acha que a imprensa e os jornalistas são arrogantes? Acho. Que se sentem acima do bem e do mal? Acho. Que muitas vezes erram feio? Acho.
Mas a imprensa independente e crítica não é apenas instrumento fundamental da democracia; é também como a própria democracia: ruim com ela, pior sem ela, porque não se inventou nada melhor.
O que assusta quando Lula insinua que a imprensa trabalha contra o país é que o PT passou duas décadas alimentando a imprensa contra Sarney, Collor, Itamar e FHC. E, enquanto caía um ministro atrás do outro, até um presidente, Lula e o PT sempre fizeram o papel de vítimas. Os acusados e os que caíam eram os outros, mas eles é que se diziam perseguidos.
Agora, quando o governo é do Lula e os ministros são do PT e dos seus aliados, o que era bom passou a ser ruim. Pimenta nos olhos dos outros era refresco. E Lula, que acha que tudo de bom neste país começou com ele, não pára de criticar a imprensa por… fazer tudo o que ele e o PT estimularam que fizesse contra os outros, todos os outros.
Alguém lembra, por exemplo, como o ministro Eliseu Resende caiu da Fazenda no governo Itamar?
Nem vale a pena pesquisar, porque era tudo bobagem, fichinha perto de tudo que se vê hoje. Quem denunciava? O PT. Quem divulgava?
Nós, da imprensa. Mas quem se dizia ‘vítima’ eram os petistas. Como hoje quem se diz ‘vítima’ continuam sendo o PT e Lula. Se estava tudo certo, ótimo. Se estava tudo errado, que se dê ao governo Lula o mesmo tratamento que se deu a todos até aqui e se feche o ciclo depois. O que valia para Sarney, Collor, Itamar e FHC tem de valer para Lula, que talvez seja tão arrogante, se sinta tão acima do bem e do mal e cometa tantos erros quanto a imprensa que critica.’
Elio Gaspari
Vavá está sendo linchado
‘GENIVAL INÁCIO da Silva, o Vavá, está sendo covardemente linchado porque é irmão do presidente da República. Ele é acusado de tráfico de influência sem que até hoje tenha aparecido um só nome de servidor público junto ao qual tenha traficado qualquer pleito que envolvesse dinheiro do erário. Um fazendeiro paulista metido numa querela de terras queria reverter uma decisão unânime do Superior Tribunal de Justiça. Vavá recomendou-lhe um advogado. Isso não é tráfico de coisa alguma. Um empreiteiro queria obras e encontrou-se com ele num restaurante. Ninguém responde se Vavá conseguiu favorecer esse ou qualquer outro empreiteiro.
A divulgação cavilosa e homeopática de trechos de gravações telefônicas envolvendo parentes de Nosso Guia tornou-se um processo intimidatório e difamador capaz de fazer corar generais do Serviço Nacional de Informações, o SNI da ditadura. No caso de Vavá, as suspeitas jogadas até agora no ventilador não guardam nexo com os fatos. Não há proporção entre as acusações que lhe fazem e o grau de exposição a que foi deliberadamente submetido.
A Polícia Federal vasculhou sua casa (um imóvel de classe média em São Bernardo do Campo). A diligência foi apresentada como parte de uma Operação Xeque-Mate, destinada a desbaratar uma quadrilha envolvida em contrabando, tráfico de drogas e máquinas caça-níqueis. Não era pouca coisa. Pelo que se sabe até agora, coletaram cinco papéis. Entre eles, duas cartas que não foram entregues. Vavá tentou alavancar dois casos com empresas privadas (Vale e CSN). Nenhum dos pleitos chegou à direção das companhias.
Os grampos policiais estabeleceram um vínculo entre Vavá e dois mercadores de casas de jogo e atravessadores de negócios. Um deles, Nilton Servo, ameaçou ‘trucidar’ a família de um desafeto. O outro, Dario Morelli, compadre de Lula, julgava-se protegido pelas suas amizades e disse que a polícia pensaria ‘duas vezes em fazer qualquer coisa’. Foi preso. Os dois planejavam maracutaias e contavam com a ajuda do irmão do presidente, a quem dizem ter dado algo como R$ 15 mil nos últimos meses. Nas palavras de Servo, ‘o Vavá é para ser usado’.
Numa conversa, Vavá fez-lhe um pedido: ‘Ô, arruma dois pau pra eu?’
Lula tem 15 irmãos e algo como cem parentes. Desde que Tomé de Souza chegou a Salvador, nenhuma família de governante teve tão poucas relações com o Estado como a dos Silva. Mais: nenhuma veio de origem tão modesta e continuou a viver em padrões tão modestos. (Noves fora o Lulinha da Gamecorp.)
Vavá meteu-se por sua conta e risco com os negócios de Servo e do compadre Morelli. Desqualificá-lo por lambari, deseducado ou pé-de-chinelo é parte do linchamento. Ele é um cidadão, ponto. Seus atos vêm sendo investigados e serão levados à apreciação da Justiça. Podia ser membro da Academia Brasileira de Letras, dava na mesma. Antes da conclusão do inquérito policial, Vavá foi irremediavelmente satanizado a partir de indícios, suspeitas e manipulações. Seu linchamento não busca o cidadão metido com vigaristas. Busca a jugular do irmão.
Durante a última campanha eleitoral, quando o comissariado petista chafurdou na compra de um dossiê contra os tucanos, demonizou-se a figura de Freud Godoy, um assessor de Lula, conviva de sua panelinha. Durante três dias ele pareceu encarnar toda a corrupção nacional. Freud foi arrolado em dois processos, um criminal e outro eleitoral. Dizer que foi inocentado é pouco. Ele nem sequer foi indiciado.
O pessoal do século 21 sabe que Jimmy Carter é um ex-presidente dos Estados Unidos (1977-1981), Prêmio Nobel da Paz de 2002. Passará para a história como um exemplo de retidão. Isso agora. Quando estava na Casa Branca, Carter foi atazanado pela exposição de seu irmão Billy, caipira alcoólatra que se tornou lobista (registrado) do governo líbio. Criou-se o neologismo Billygate. Morreu em 1988, aos 51 anos, falido. Virou poeira da História.
Ninguém quer a jugular de Vavá, como não se queria a de Billy Carter. O negócio é outro.’
INTERNET
Palestinos usam blogs como válvula de escape
‘‘As pessoas em geral estão muito preocupadas com o futuro. As ruas parecem seguras, mas quem se opunha ao Hamas está com medo, a maioria está em casa ou escondida. Os carros voltaram às ruas, as pessoas estão fumando narguilé e rindo. Idosos jogam gamão na sombra. A combinação de vida normal e medo do futuro desconhecido criou uma estranha atmosfera em Gaza.’
O relato acima foi retirado do blog ‘Tabula Gaza’, um dos inúmeros diários da vida cotidiana no território palestino que povoam a Internet, um dia após o Hamas tomar o poder. Quando escolheu o nome de seu blog, um trocadilho com a expressão ‘tábula rasa’ (recomeçar do zero), o jornalista Philip Rizik certamente não imaginava que ele se tornaria tão apropriado para o momento atual. Sua narrativa da nova ordem estabelecida em Gaza tinha o seguinte título: ‘Bem-vindo ao Hamastão’.
Em tempo de cerco militar israelense e sangrentos confrontos internos, as páginas pessoais na internet se tornaram uma importante válvula de escape para uma população acuada e com medo de sair de casa -além de uma fonte de informação que destoa do partidarismo da mídia tradicional.
Além dos relatos que abrigam, os blogs oferecem uma chance de mostrar imagens triviais, que combinam tensão e rotina. Muitas fotos são de cenas que o mundo não costuma associar à faixa de Gaza: praia, escolas, lazer.
‘As instituições do governo estão totalmente paralisadas, ninguém vai ao trabalho, até os bancos estão fechados. O risco de andar na rua é muito alto’, relatou à Folha, por e-mail, o contador Wael Alqarra, morador da Cidade de Gaza, no auge da violência desta semana.
Sem lazer
Wael explicou que, além de ser uma forma de comunicar ao mundo a dureza da vida em Gaza, a internet é uma das poucas opções de diversão para seus moradores: ‘Aqui não tem cinema nem teatros. Ir à praia ficou perigoso demais. As pessoas, especialmente as mais jovens, passam a maior parte do tempo na internet, em blogs e sites de relacionamento.’
A maioria dos blogs é em árabe, já que poucos palestinos de Gaza dominam outros idiomas. Mas há muitos que fazem questão de tornar acessível, em inglês, o cotidiano nessa conturbada faixa de terra costeira, onde 1,4 milhão de pessoas habitam uma área de 360 km2, menor que o município de Jundiaí, no interior de São Paulo.
No blog ‘De Gaza, com amor’, a médica Mona El-Farra descreve o esforço diário para manter a vida normal, entre o bloqueio israelense e a violência fratricida dos palestinos. ‘As crianças estão de volta às escolas’, escreveu ela, após um cessar-fogo entre Fatah e Hamas no começo de junho.
‘Minha filha começou a prestar seus exames de fim de ano antes da hora. Todas as escolas tiveram que apertar seu calendário de provas para que elas acabem o mais rapidamente possível, antes que a violência recomece’, conta a médica.
A realidade virtual, para a maioria dos palestinos, é uma extensão do clima de insegurança que vivem no mundo real. A documentarista Laila El-Haddad, por exemplo, criou o blog ‘Diário de uma mãe palestina’ para acompanhar o crescimento de seu filho, Yousuf, hoje com quatro anos.
Repleto de fotos que mostram um lado bucólico e desconhecido de Gaza, como o de uma floricultura ou de um vendedor de frutas, o relato de El-Haddad invariavelmente cai na violência de Gaza. Algo que ela própria considera inevitável. ‘Juntos nós passamos por muita coisa. O que é pessoal se torna político’, diz.’
Daniela Arrais e Estêvão Bertoni
Cultura em pedaços é febre na internet
‘Nada de refrãos repetitivos e solos infindáveis. Ao sintonizar o computador na rádio Sass (www.radiosass.com), o ouvinte escuta 30 músicas em uma hora -em uma rádio tradicional, ele não ouviria mais de 12. Como? As faixas são picotadas, e os intervalos não chegam a um minuto e meio.
A rádio on-line representa uma nova forma de consumo de cultura, a ‘snack culture’ (cultura do aperitivo, ao pé da letra). Em boa parte graças à internet, o entretenimento instantâneo vem tomando forma com a proliferação de pequenas doses de diversão.
O termo, difundido pela revista ‘Wired’, especializada em tecnologia, inclui de ‘snacktones’ (músicas de dez a 30 segundos compostas especialmente para tocar em celulares) e minigibis a filmes de ginástica com menos de dois minutos (para serem assistidos pelo iPod na academia) e versões reduzidas de clássicos do cinema, como ‘Pulp Fiction’ (1994), de Quentin Tarantino.
‘A gente vive em uma época em que a velocidade é supervalorizada. Buscamos uma internet mais veloz, dirigimos mais rápido, comemos fast-food. Queremos mais estímulo do que antes’, diz o DJ George Gimarc, idealizador da rádio Sass.
Tanta sede pelo entretenimento instantâneo é conseqüência da sociedade de consumo, segundo Gabriela Borges, professora de ciências da comunicação da Universidade do Algarve, em Portugal. ‘Os produtos culturais são feitos para serem rapidamente consumidos a fim de que novos sejam produzidos’, afirma.
Já o jornalista, apresentador e diretor de TV Marcelo Tas diz acreditar que a instantaneidade causada pela revolução digital tem efeitos mais amplos. ‘A febre não atinge só o entretenimento, mas a informação, a comunicação e até a vida afetiva.’
Para Tas, a ‘snack culture’ funciona como ‘um índice para o internauta decidir onde vai gastar seu tempo’.
‘Ele [consumidor] tem o poder de decisão na mão. Pesquisa preços antes de comprar, zapeia pelos diversos canais de informação e entretenimento antes de decidir onde vai investir sua atenção’, diz.
O músico Gustavo Mini Bittencourt, da banda gaúcha Walverdes, também ressalta o papel do consumidor. ‘O fã é cada vez mais editor da obra do artista. Tem tanto o cara que curte ver o filme inteiro quanto o que assiste só a trailers. No meio, tem o cara que gosta de ‘mashupar’ [misturar obras diferentes para obter um novo resultado] trailers.’
Benefícios
Criador da rádio Sass, Gimarc diz que as versões enxutas das músicas trazem benefícios para músicos e gravadoras. ‘Se a minha rádio toca duas vezes mais do que as outras estações, ela venderá o dobro.’
Na mesma sintonia, Steve Ellis, fundador do programa de licenciamento on-line de música independente Pump Audio (www.pumpaudio.com), afirma enxergar na ‘snack culture’ uma grande possibilidade de fazer negócios.
Só em 2006, o Pump Audio, que vende trechos de músicas para programas de TV, filmes, sites e jogos de videogame desde 2001, pagou US$ 125 mil (cerca de R$ 241 mil) a artistas independentes por suas obras.
Superficialidade
O aumento na diversidade de produtos culturais é um dos pontos positivos da ‘snack culture’, como aponta Borges. Mas ela alerta: ‘A superficialidade e a instantaneidade fazem com que não haja tempo para uma maior reflexão sobre o que está sendo consumido’.
Para Hudson Moura, editor da revista Intermídias (www.intermidias.com) e pesquisador do Centro de Estudos da Oralidade da PUC-SP, mesmo que o produto picotado deixe de ser o mesmo, pode ter caráter permanente. ‘Esses produtos podem ser consumidos de uma maneira muito mais dinâmica e ter uma vida duradoura e prolongada.’
Disponível no site YouTube, a versão reduzida de ‘Pulp Fiction’, com menos de dois minutos, aumenta a vida útil e o interesse pelo filme, segundo Marcelo Tas. ‘A versão curta mostra que o filme, lançado no distante 1994, continua atiçando o imaginário da molecada. É uma prova da atenção e respeito dos fãs.’
O músico Bittencourt reconhece uma possível superficialidade, mas não a vê com tanto pessimismo. ‘Cabe olhar pra isso com atenção e curiosidade, e não com uma atitude ranzinza do tipo ‘hoje em dia é tudo mais superficial’, diz.’
TELEVISÃO
‘Não tenho nenhum pudor’, diz Claudia Raia
‘Engraçadinha, nome da personagem rodriguiana que mudou os rumos de sua carreira em 1995, não é um adjetivo que sirva para a atriz Claudia Raia, 40, cuja vida na televisão sempre foi pontuada pelo humor. Símbolo sexual dos anos 80, ela prefere se definir como despudorada, ousada e engraçadona. ‘Eu não tenho pudor nenhum, por isso faço humor’, diz a atriz, que encara sua 12ª novela a partir de amanhã como a vilã Ágata, de ‘Sete Pecados’, escrita por Walcyr Carrasco e dirigida por Jorge Fernando.
Recém-saída de uma bem-sucedida temporada do musical ‘Sweet Charity’, onde foi vista por 136,5 mil pessoas, a campineira, casada com Edson Celulari, com quem tem dois filhos (Enzo e Sophia), analisa sua carreira: ‘Foram apenas alguns vôos sem dizer a que vieram, alguns personagens que passaram desapercebidos. Mas é assim.’ Leia a seguir trechos da entrevista.
TEATRO
Minha vida se divide em a.C. e d.C., antes de Charity e depois de Charity. Foi uma luta como atriz para conseguir fazer esse personagem, porque eu não tenho ‘physique’ (tipo) para isso. Ela é uma perdedora, e eu não posso usar minhas muletas na Charity, porque elas não servem. Ela é pequenininha, dentro de uma superprodução; são 74 pessoas. Acho que o público que não pode pagar R$ 120, meu público de TV, poderia me ver também. Luto para fazer uma temporada popular, mas preciso de um patrocínio de R$ 1 milhão e não consegui ainda. Se eu não tiver o patrocínio, não consigo me mexer nem abrir o pano. É muito difícil fazer esse tipo de produção. A gente tinha de descobrir algo para que o governo incentivasse esse tipo de projeto, para que houvesse maior empenho.
HUMOR
Não tenho pudor nenhum, por isso faço humor. É gostoso poder brincar com tudo isso. Ágata é uma vilã, mas ela é leve, e eu gosto de fazer vilãs. Essa leveza vem do humor, porque ninguém é totalmente mau nem totalmente bom. Ela pensa como ser humano e minha insistência é em humanizá-la. Tenho muita liberdade com o horário das sete e com esse tipo de humor, para esse público, que eu conheço. Minha carreira é muito apoiada no humor. ‘TV Pirata’ foi um marco. Aquela turma cresceu, amadureceu, se emancipou, e cada um brilha hoje com sua própria estrela. Faz falta aquele tipo de humor.
CARREIRA
Eu tinha dois caminhos: ou me tornaria a bonitona e gostosona e chegaria um momento em que eu não seria nada mais disso, ou eu virava atriz e usava a beleza a meu favor. É um caminho árduo, mas eu não sofro para mostrar que não sou só um corpo bonito e que minha carreira não está apoiada somente nas minhas pernas. É preciso trabalhar muito e eu sempre usei isso [o corpo] a meu favor. Eu achava que era um ‘a mais’ que eu tinha. Trabalhei muito e fui rejeitada para fazer ‘Engraçadinha’. Fui escondida fazer e ganhei o papel na raça; fui com a Denise Saraceni. Eu amo o [Carlos] Manga, mas ele achava que eu não poderia fazer Nelson Rodrigues. Ele achava que eu não era uma atriz rodriguiana, que não era uma atriz dramática.
CINEMA E NUDEZ
Fiz uns três ou quatro filmes seguidos e depois nunca mais. ‘Boca de Ouro’, ‘Kuarup’, [a atriz abaixa a voz e sussurra] ‘Matou a Família e Foi ao Cinema’… [Interrompida pela Folha: Seu passado te condena?] Esse passado me condena. A hora em que me vi dentro de uma banheira com uma galinha viva, declamando poesias eróticas de James Joyce e com minha amiga da vida inteira Louise Cardoso virando canja, eu só pensava ‘Por que eu estou aqui?’. Isso nos anos 80. Toda vez que eu vejo é uma facada para mim. Daí aparecem umas coisas na internet: ‘Claudia Raia fez isso na juventude’; sou eu e a Louise no filme; as pessoas vêm me contar, e eu não tenho o que fazer. Daí, falam: ‘mas você tem um filho de dez anos’, e o que eu vou fazer? Vou explicar para que é um filme? Não me arrependo de nada. Fiz cinco ‘Playboy’. Se eu me arrependesse, estava morta. Acho difícil fazer isso de novo. Mas, se aparecer um personagem que apareça nu, se valer a pena, eu faço. Mas ensaio fotográfico, agora que estou com dois filhos, acho que não é o que eu queira mais da vida. Tenho vontade de voltar a fazer cinema e fazer uma personagem linda, porque exercitei muito pouco. Se meu ídolo, Almodóvar, me chamasse para limpar o chão do set, eu iria, até porque falo espanhol bem. É um sonho.
BELEZA
Faço exercícios físicos não para continuar um mulherão, mas porque sou bailarina. No que me é dado um personagem, tento extrair dali o máximo de complexidade. É difícil ter coragem de dar o pulo do gato e até errar. Como eu sou uma mulher de 1,80 m e que todo mundo conhece, vira um puta erro, um errão. Graças a Deus, nunca tive um errão, algo que pudesse dar uma borrada na minha carreira.
‘PECADO VIROU COMPORTAMENTO’, DIZ CARRASCO
Os sete pecados capitais recheiam a nova novela das sete da Globo, ‘Sete Pecados’, primeiro texto contemporâneo do dramaturgo paulista Walcyr Carrasco, 55. Para ele, os pecados fazem parte da vida em sociedade. ‘O que chamamos de pecado se transformou em comportamento’, diz.
Segundo ele, não será uma novela clássica. ‘O herói e a heroína irão se transformar durante a novela, de acordo com os pecados que cometerem’, conta.
Priscila Fantin será Beatriz, uma jovem que reúne todos os pecados em sua vida. Em contraponto, está Dante, o taxista de Reynaldo Gianecchini, que terá todas as virtudes. No meio dos dois, Ágata (Cláudia Raia) e Barão (Airton Graça), os vilões que tentam roubar o segredo da imortalidade que está nas mãos da mocinha.
Outros personagens trarão pecados. Cada um foi distribuído em núcleos. Pedro (Sidney Sampaio) terá a ira; Rebeca (Elizabeth Savalla), a vaidade; a família de Perseu (Zé Victor Castiel), a gula; Romeu (Ary Fontoura), a avareza; Carla (Mel Lisboa), a lúxuria; e Rodolfo (Juan Alba), a preguiça.’
***
Para Reynaldo Gianecchini, ‘fazer sempre o galã é chato’
‘Às vésperas de estrear seu quarto papel na televisão como protagonista e galã de novela, o ator Reynaldo Gianecchini, 34, resolveu questionar a posição que lhe sustenta desde que apareceu na tela da Rede Globo. Para o ator, fazer sempre um galã na TV é ‘chato’, embora, pondere, isso não chegue a incomodá-lo. ‘Não me incomoda porque eu aprendi com isso e posso dar outros passos. Não tem nada de errado em fazer o galã em si; ele é um estereótipo, cumpre uma função e mexe com as telespectadoras.’
Apesar de aceitar trabalhos que explorem sua beleza física, Gianecchini acha que escolhe bons papéis. ‘Como ator, é muito chato você ficar preso a uma coisa só. Tenho feito escolhas que têm me ajudado a ir para outro lado e a crescer, principalmente no teatro’, diz. ‘A TV tende a lhe jogar um pouco mais para esse lado, mas daí vêm o teatro e o cinema, onde você pode brincar um pouco mais. Cabe à gente fazer as escolhas certas para não ficar preso somente a uma imagem.’
Quando foi chamado para fazer novelas, Gianecchini era modelo em São Paulo. ‘É mentira essa coisa de que eu só faço o superlindão. Não acho que eu seja algum padrão de beleza. Sempre acredito que dê para fazer outras coisas. Até dentro do bonito você pode ter uma gama de personagens para fazer.’
Paulista de Birigui, Gianecchini está em ‘Sete Pecados’, onde será Dante, um taxista cheio de virtudes que se envolverá com uma jovem rica e mimada -interpretada por Priscila Fantin-, que reúne em seu comportamento os sete pecados capitais.
Após ter sido lançado de modelo a ator em ‘Laços de Família’ (2000), Gianecchini chega à sexta novela. Sua performance de maior destaque foi em ‘Belíssima’ (2005/06), quando interpretou o mecânico Pascoal e, com o personagem, entrou para a comédia.
‘O Pascoal foi um divisor de águas na minha carreira. Hoje em dia eu recebo muitas propostas para fazer comédia no teatro. Abriu as portas porque as pessoas vêem outras direções numa carreira que estava muito focada nessa coisa só do galã e do romance’, diz o ator. O ator diz não se incomodar mais com a exposição pública e o assédio, conseqüências que já lhe tiraram o sono. ‘Antes, a superexposição me deixava muito mal, me fazia repensar a profissão e eu não sabia lidar com isso. Achava que minha vida estava uma bagunça. Na minha vida, sempre me preservei muito, não falo dela. Hoje em dia aprendi a me defender.’’
Bia Abramo
‘A Pedra do Reino’ e a inefável qualidade
‘ORA, NÃO dá para discordar muito da crítica de Cássio Starling Carlos sobre a ‘A Pedra do Reino’ (Ilustrada, 10 de junho). Para o crítico, a microssérie de Luiz Fernando Carvalho representa uma ruptura no modo de usar a literatura na TV. A obra literária não estaria simplesmente mais emprestando seu ‘sinal de nobreza’ à obra televisiva, ou seja, funcionando como avalizadora de um certo padrão de qualidade, mas passaria a fornecer outras e diversas estratégias narrativas. Além disso, a partir de uma concepção artesanal de produção, capaz de imprimir uma ‘singularidade expressiva’, conseguiria ‘desafiar de dentro os códigos da televisão’.
‘A Pedra do Reino’ é, de fato, uma obra televisiva desafiadora, que se constitui a partir sobretudo de negativas: não-linear na condução do roteiro, não-naturalista na interpretação, não-convencional em termos de cenografia e direção de arte. Todas essas negativas se entrelaçam com uma exuberância visual e uma intensidade dramática muito raramente vistas (tendendo fácil ao ‘quase nunca’) na TV.
Mais do que mítica, a versão de Carvalho para o romance de Ariano Suassuna é profundamente alegórica -e, nesse sentido, seu sertão de deuses e diabos se aproxima do dos filmes de Glauber Rocha. Ao armorial, algo suave na quase idealização do popular regional, se sobrepôs uma camada de simbolismos mais agudos -e não distantes, inclusive, do cinema que vem vindo de Pernambuco na última década.
E, para além de todas as referências e cruzamentos, Carvalho firma-se como um diretor original, capaz de criar imagens de enorme beleza e de tirar o espectador de seu conforto e de sua segurança. É toda áspera a microssérie, no sentido de não dar trégua à atenção, mesmo quando deixa emergir o humor de Suassuna, quando deixa escapar algum lirismo. E essa aspereza que impede a distração a ponto de causar incômodo -o espectador de TV, qualquer um, é o menos afeito a isso- é justamente aquilo que a TV tenta ao máximo evitar.
Há, entretanto, em Carvalho, ainda uma reverência excessiva à obra literária. Não a esta que está sendo adaptada, mas, digamos, à profundidade da literatura. É como se, ao adaptar, o diretor ficasse imbuído de uma dificuldade advinda do livro -e isso forçaria escolhas estéticas que, no fim, parecem mais informar sobre a capacidade do diretor em ser complicado do que, de fato, contribuir para a narrativa.
O problema, aqui, não é afastar o espectador, mas perpetuar uma aura de distância da obra literária.’
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