Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Veja

INTERNET
André Petry, de Nova York

Votar nunca mais será igual

‘O senador Barack Obama estava celebrando suas vitórias mais recentes quando a bomba caiu sem aviso prévio. Um vídeo mostrava o pastor de sua igreja fazendo um sermão explosivo. Dizia que o atentado de 11 de setembro foi um castigo para as barbaridades promovidas pelos Estados Unidos no exterior e que os americanos, em vez de cantarem ‘Deus abençoe a América’, deveriam cantar ‘Deus amaldiçoe a América’. O vídeo começou a pipocar no YouTube, em diferentes edições. Uma, cinco, vinte, quarenta. Em seguida, somaram-se as imagens das reportagens sobre o assunto. Pressionado pela enorme repercussão, Obama rompeu publicamente com seu pastor. A senadora Hillary Clinton ainda festejava a enrascada de seu adversário quando apareceu outro vídeo: mostrava ela mesma desembarcando serenamente na Bósnia em 1996. As imagens desmentiam o relato dramático feito pela senadora, dias antes, segundo o qual descera do avião debaixo de fogo cruzado e, para escapar com vida, refugiara-se num abrigo no aeroporto. O vídeo do seu tranqüilo desembarque foi parar no YouTube, ao qual logo se somaram imagens das reportagens televisivas sobre o assunto. Diante do barulho, Hillary teve de admitir que abusara da criatividade ao descrever aquela viagem.

Os dois casos – o de Obama com seu pastor destemperado e o de Hillary com sua anedótica visita à Bósnia – mostram o que está acontecendo na primeira eleição presidencial nos Estados Unidos depois da criação do YouTube, um site lançado em fevereiro de 2005 em que qualquer internauta pode colocar vídeos, de qualquer qualidade, e assistir aos milhares, aos milhões, aos bilhões de vídeos que já fazem parte de seu acervo. O YouTube, associado à disseminação dos blogs sobre política, dos sites de relacionamento e das aparentemente infinitas possibilidades abertas pela internet, está mudando a maneira de fazer campanha eleitoral nos Estados Unidos e tudo indica que mudará as campanhas em todo o mundo democrático. Os especialistas acham que acabou o tempo em que o comando das campanhas exercia – ou tentava exercer – controle absoluto sobre o candidato, da cor de sua gravata à escolha das palavras de um discurso. Em campanhas regionais, já houve o caso do candidato que, filmado cochilando numa reunião, virou a coqueluche do ridículo no YouTube e perdeu a eleição. Ou do candidato que foi flagrado chamando um imigrante indiano de ‘macaco’, e também perdeu a eleição. A novidade, agora, é que todas essas possibilidades tecnológicas estão atuando numa eleição presidencial e diante de uma audiência nacional.

Um dos efeitos mais notórios da popularização da internet está nas finanças eleitorais. O dinheiro continua sendo fundamental numa campanha, mas a internet está conseguindo transformá-lo num dado um pouco menos decisivo ao reduzir a importância da televisão. Os democratas gostam de lembrar o caso da deputada Carol Shea-Porter, de New Hampshire, que não recebeu um tostão do partido, recolheu só 300 000 dólares e venceu um adversário poderoso, que concorria à reeleição e arrecadara três vezes mais. A seu favor, contou sua rede de ‘netroots’, como é chamada a comunidade de pessoas politicamente ativas através da internet. Os netroots divulgaram a candidatura de Shea-Porter numa dimensão que, nos tempos pré-internet, só seria viável pela TV, e a um custo altíssimo. Há três meses, o rapper Will.i.am, do grupo Black Eyed Peas, remixou um discurso de Obama numa música, convidou algumas celebridades para cantar trechos e colocou o resultado no YouTube. O retorno foi estrondoso. Com gasto zero em veiculação, o clipe já foi visto por 8,5 milhões de internautas. Além disso, produziu filhotes bem-humorados, como o vídeo Bilionários por Bush, que faz uma sátira do tratamento privilegiado dado aos mais ricos pelo atual governo republicano.

A mobilização proporcionada pela internet é sem precedentes, seja para engordar a multidão de um comício, seja para rechear o cofre de uma campanha. ‘A internet permite que os candidatos encontrem gente nova, que nunca antes contribuiu financeiramente para uma campanha, e sem gastar fortunas com mala-direta’, diz Michael Malbin, diretor da Campaign Finance Institute, entidade apartidária que monitora as finanças eleitorais. ‘O número de pessoas financiando as campanhas só cresce, e, graças principalmente à internet, quase metade do dinheiro chega na forma de contribuições pequenas, inferiores a 200 dólares, mas vem de milhões de contribuintes.’ A campanha de Obama, que de longe faz o uso mais inteligente da internet, arrecadou 263 milhões de dólares de janeiro de 2007 até agora. Desse total, 47% foram contribuições de até 200 dólares. É o maior porcentual. No caso de Hillary, sua campanha recolheu menos de 200 milhões de dólares no mesmo período, e apenas 33% do total foram de contribuições menores que 200 dólares. O pior desempenho é o do republicano John McCain. Ele ainda não bateu a marca dos 100 milhões de dólares, e só 23% das contribuições vieram em pequenas quantias.

Por ironia, o primeiro político de dimensão nacional a perceber a importância da internet foi justamente McCain, quando tentou ser o candidato à Casa Branca em 2000, mas perdeu para Geor-ge W. Bush. Naquela pré-campanha, McCain assombrou o mundo político ao levantar 7,5 milhões de dólares pela internet. Até hoje ninguém entendeu como nem por que os republicanos, tendo uma estréia tão promissora, ficaram tão retardatários no uso político da rede. Na campanha presidencial de 2004, os democratas já pularam na frente e foram mais competentes para explorar as novidades tecnológicas, com destaque para Howard Dean. Ele, que hoje preside o Partido Democrata, promoveu uma gincana financeira na internet e ultrapassou suas metas de arrecadação. Dean terminou perdendo a indicação para John Kerry, mas deixou uma herança apreciá-vel ao expandir o uso da internet: ele começou a usar a rede como instrumento para mobilizar cabos eleitorais, energizar a militância, organizar eventos de campanha. ‘A internet está ajudando a renovar a democracia ao permitir que os eleitores tenham um papel muito mais ativo do que antes’, festeja Simon Rosenberg, fundador e presidente da NDN, entidade que, entre outras coisas, estuda o alcance das novas tecnologias.

No site oficial da campanha de Obama, pode-se localizar com facilidade um evento político nas vizinhanças: basta que o internauta informe seu código de endereçamento postal. Na semana passada, dentro de um raio de 150 quilômetros ao redor de Nova York, seu site divulgava uma lista de 173 eventos, entre já realizados e por se realizar. Ampliando-se o raio para 300 quilômetros, o número de eventos subia para 261. O site de Obama contabiliza 750 000 voluntários ativos, 8 000 grupos de afinidade e, na semana passada, informava já ter recebido contribuições de 1,5 milhão de doadores pela internet. As páginas dos candidatos na rede são copiadas uns dos outros, com pequenas diferenças. Isso acontece porque ninguém sabe ainda como usar a novidade. Em 1960, quando aconteceu o primeiro debate entre candidatos pela televisão, Richard Nixon perdeu feio para John Kennedy, mas aprendeu a lição. Em 1968, usou a TV com competência a seu favor. No Brasil, o ex-presidente Fernando Collor foi o primeiro a explorar com criatividade a televisão na campanha de 1989, usando recursos de computação gráfica então desconhecidos no país – embora também tenha inovado em baixarias.

A internet é ainda um território propício para a política da difamação, do massacre de caráter, mas aos poucos seu uso vai sendo disciplinado. Para que tenha impacto razoável, essa mídia precisa ser suficientemente difundida. Nos Estados Unidos, cerca de dois terços das famílias têm acesso à rede – e metade usa banda larga, ou seja, tem acesso rápido, memória ampla e pode ficar on-line o dia inteiro. No Brasil, o número de internautas também é crescente, mas o Tribunal Superior Eleitoral já se encarregou de travar a modernidade ao proibir que os candidatos às eleições municipais deste ano usem várias ferramentas para conseguir votos. Um parecer técnico do TSE veda a divulgação de blogs, o envio de mensagens eletrônicas e até a veiculação de vídeos no YouTube. É uma pena. Excluir a internet do universo da política talvez seja uma forma de também excluir da política as gerações mais jovens. Talvez seja, ainda, reflexo de uma mentalidade que, cedo ou tarde, será superada pelos novos padrões impostos pela globalização. Afinal, todas as relações sociais – no âmbito do comércio, da cultura, da ciência, das idéias, do comportamento – são crescentemente globalizadas. A política, ainda que exercida dentro dos limites das fronteiras nacionais, será uma exceção?’

BIOGRAFIA
Jerônimo Teixeira

Perdoado pelo sucesso

‘‘A minha vida privada não mais me pertence’, afirmou Paulo Coelho, no ano passado, em um artigo no qual criticava o acordo judicial que censurou a biografia Roberto Carlos em Detalhes, do historiador Paulo Cesar de Araújo. A prova de que a afirmação é verdadeira acaba de chegar às livrarias: O Mago (Planeta; 632 páginas; 39,90 reais), biografia escrita pelo jornalista Fernando Morais. Consta que Coelho não interferiu no trabalho de seu biógrafo. Ao contrário, facilitou-lhe o acesso a diários que cobrem quarenta dos seus 60 anos de vida. Longe de ser temerária, tamanha exposição íntima atesta a inteligência publicitária do escritor. Paulo Coelho atropelou um menino e fugiu sem prestar socorro? Consumiu drogas? Firmou pacto com o demônio? Sim, a biografia confirma tudo isso. Mas foram meros tropeços no caminho de um homem obstinado na realização de seu sonho: tornar-se famoso como escritor. No fim, o herói converte-se no Guerreiro da Luz, o sábio autor de O Alquimista. Os 100 milhões de livros que o mago vendeu em 160 países redimem (em tese) o passado vil.

Filho desgarrado de uma família de classe média conservadora do Rio de Janeiro, Coelho foi o típico doidão que a cultura hippie glamourizou na virada dos anos 60 para os 70. A biografia revela suas experiências alucinógenas e sexuais. Ele teve, por exemplo, relações com homens – fato que já admitira em entrevista a VEJA em 2003 – só para concluir que, no fim das contas, não era homossexual. Mas nem tudo foi colorido nos anos de desbunde. Coelho passou por duas internações psiquiátricas e teve relacionamentos difíceis, beirando o patológico. O mais tumultuado deles foi o romance com a arquiteta Adalgisa Magalhães, a Gisa. Depois de se submeter a um aborto, ela teve uma depressão pesada. Coelho incentivou-a a tentar suicídio – por motivos meio místicos, meio psicanalíticos, achava que essa terapia de choque poderia ajudá-la.

Paulo Coelho fez muito dinheiro, nos anos 70, como parceiro do roqueiro Raul Seixas. Mas o que ele queria mesmo era fazer fama como escritor. Sua determinação começou a dar frutos com O Diário de um Mago, de 1987, e O Alquimista (até hoje seu maior sucesso, com 40 milhões de exemplares vendidos), do ano seguinte. O estilo pedestre e o misticismo de supermercado desses livros encontraram ressonância no grande público, mas desagradaram aos críticos. O Mago retrata Coelho como uma vítima da mídia, perseguido pela intelectualidade elitista e preconceituosa. Não é surpresa. Morais é um ardente apologista da ditadura de Fidel Castro e acredita na inocência de José Dirceu, acusado de ser o chefe do mensalão. Com essa larga experiência na defesa do indefensável, não admira que ele busque afirmar o mérito literário de Paulo Coelho.

Morais nem sempre compra barato as lorotas de seu personagem. Em uma entrevista à Playboy, em 1992, Coelho gabou-se do tempo em que viveu com duas mulheres em Londres. O biógrafo corrigiu-o: Coelho não dava conta das duas sozinho – havia um segundo homem na animada cama inglesa –, e uma delas mais tarde reclamaria da performance sexual do escritor. Morais só não desacredita Coelho no seu terreno de eleição, o misticismo. Epifanias, assombrações, visões angelicais – a biografia dá crédito a tudo o que é bobagem sobrenatural. Nas páginas que precedem essas aventuras mágicas, porém, Paulo Coelho aparece falsificando a assinatura do próprio pai, plagiando um texto de Carlos Heitor Cony e dando entrevistas sobre um encontro com John Lennon que nunca aconteceu. O leitor que conhece aritmética básica pode levantar a dúvida legítima: as aventuras sobrenaturais do tal ‘mago’ não serão invenções da mesma ordem? Paulo Coelho é um péssimo escritor, mas talvez seja um gênio da ficção.’

TELEVISÃO
Marcelo Marthe

A noveleira do Silvio

‘Na madrugada de domingo para segunda passada, Iris Abravanel levou uma bronca do marido, Silvio Santos. O empresário e apresentador não pegava no sono, pois a mulher estava trabalhando na cama, com o computador ligado. ‘Sempre que tenho meus surtos criativos, o Silvio reclama: ‘Por que você ainda está acordada? Apaga a luz e vem dormir’.’, conta Iris. Nos últimos meses, essas noites insones viraram rotina. A razão é que Iris, de 59 anos, anda se aventurando numa seara inédita: a profissão de noveleira. A senhora Silvio Santos é a autora do próximo folhetim do SBT. Com estréia prevista para o fim de junho, Revelação é uma aposta para reverter a crise de ibope que levou a emissora do marido a perder a vice-liderança de audiência no país para a Record. É, ainda, a primeira novela do SBT com texto nacional em nove anos, já que Silvio acaba de encerrar a parceria que o obrigava a só produzir os melodramas mexicanos da rede Televisa (para tanto, pagou antecipadamente os direitos previstos no contrato, que vai até 2009). ‘O público não agüentava mais as novelas mexicanas’, diz Iris. Evangélica, ela decidiu então que era a hora de sair a campo ‘com fé’ para salvar a pátria. ‘Quando vi a dificuldade de achar bons autores, perguntei a meu marido se eu mesma não podia resolver o problema’, diz. Diante da resposta positiva, Iris lhe fez uma indagação prática: ‘Por onde começo?’.

Com custo de 70.000 dólares por capítulo, Revelação é uma novela ambiciosa para os padrões do SBT. Para gravá-la, a emissora reformou a cidade cenográfica de sua sede, em São Paulo. As locações incluem também uma fazenda e uma segunda cidade cenográfica no interior paulista. Além disso, seqüências com o par romântico interpretado pelos atores Sérgio Abreu e Tainá Müller foram gravadas em Portugal e na Espanha. Silvio, no entanto, demorou a se convencer de que a empreitada vingaria. A princípio, Iris teve de se virar sem um centavo dele. Seu primeiro passo foi buscar dicas com Therezinha di Giácomo, consultora veterana de teledramaturgia do SBT. Em seguida, pediu ajuda a uma amiga, a proctologista Hellyangela Águida, que lidava com o grupo de teatro juvenil de uma instituição de ensino cristão da qual Iris também era voluntária, na organização de festas e bazares beneficentes (sua última ocupação antes de se tornar noveleira). A médica ajudou Iris a formar a equipe de sete colaboradores – composta, em sua maioria, de jovens egressos das montagens musicais da escola (onde também estudam os filhos de artistas do SBT como Gugu Liberato e Celso Portiolli).

Na semana passada, VEJA teve acesso a essa ‘oficina de roteiristas’, na definição de Iris. Para facilitar seu trabalho, ela montou o QG em sua casa – mais precisamente, no quarto de Renata, de 23 anos, caçula das quatro filhas dela e de Silvio. ‘A Re ficou tiririca da vida quando a despejamos’, diz. No começo, dava ajuda de custo do próprio bolso a esse pessoal – e, para gastar menos, os convidava para almoçar ali mesmo. Só em agosto passado, três meses depois de iniciada a aventura, é que todos – inclusive Iris – foram contratados pelo SBT. ‘Como eu nunca aparecia na emissora, me barraram na portaria ao chegar a uma reunião. Agora, é só mostrar o crachá’, diz.

Iris recorreu a soluções caseiras para superar a falta de conhecimento em escrever novelas (e também em vê-las: em razão da ‘falta de tempo’ e de suas viagens com Silvio, ela se confessa por fora das produções das concorrentes Globo e Record). As filhas Daniela e Rebeca (que estudaram comunicação e cinema, respectivamente) lhe emprestaram livros teóricos sobre roteiro. Iris buscou ainda uma fonte religiosa para aprender como se faz uma escaleta – jargão para uma espécie de organograma que resume a trama. É uma gravura que mostra a história da humanidade segundo a Bíblia, pendurada na parede de seu escritório. ‘É o escaletão das Escrituras’, diz. Logo se estabeleceu uma divisão de trabalho. A redação das cenas de vilania fica a cargo do sobrinho Raphael Baumgardt (‘ele adora tudo o que é do mal’). Já o romance central é com a amiga Rita Valente, professora de matemática que foi convocada para dar uma ajuda com os computadores e acabou virando redatora. ‘E olha que a Rita nem precisa trabalhar. Ela tem dinheiro, é casada com dono de cartório’, observa Iris. A noveleira coordena a patota e faz as cenas cômicas. ‘Tudo o que eu tento escrever a sério sai engraçado’, explica.

Silvio tomou precauções ao embarcar em Revelação. O projeto só entrou em produção depois que certo número de capítulos saiu do forno. E um profissional experiente, Yves Dumont, supervisiona os textos. Já foi até insinuado que seria ele, na verdade, o redator do folhetim. Dumont nega. ‘As pessoas ainda vão se surpreender com a Iris’, diz. Dumont pediu que o número excessivo de personagens fosse reduzido, sugeriu a criação de outros e devolveu ao menos um capítulo a Iris por estar ruim demais.

A mulher de Silvio acredita que sua vocação para contadora de histórias compensa a inexperiência. ‘Meu pai era artista e eu fazia sucesso com as crianças quando era professora do primário’, afirma. Há ainda a credencial conjugal: ‘Ter um professor de comunicação 24 horas por dia equivale a um doutorado’. Iris também se apóia na religião. ‘Se não fosse pela fé, não teria levado esse desafio adiante’, diz. A certa altura, ela se apanhou chorando sozinha. ‘Eu pensava: ‘Meu Deus, em que roubada me meti’. Mas depois vi que era importante dar a cara a bater’, conta. Em tempo: a conversão de Iris a uma igreja evangélica, há dez anos, mudou sua vida – e a da família inteira. ‘Para o Silvio foi complicado, pois ele achava que estava perdendo o controle da mulher e das filhas. Mas depois viu o bem que a transformação fez para a gente’, diz.

Na trama de Revelação cabem temas que vão da pregação contra as drogas à denúncia do autoritarismo (a história se passa numa fictícia ‘Tirania’). ‘A novela mostrará que o poder deixa as pessoas caricatas. Eu convivo com isso, né? Cansei de ver os políticos que vêm falar com o Silvio’, afirma. Iris mergulhou de corpo e alma no processo criativo. Para conferir realismo a uma personagem mais atirada, por exemplo, fez aulas de ginástica sexual (essencialmente, uma fisioterapia para quem tem incontinência urinária, mas que também pode ajudar no desempenho amoroso, conforme explica Iris). Só não se pergunte à noveleira o que vem a ser a revelação do título. ‘Sabe que eu ainda não decidi?’, informa. Quando o tema é o nome da novela, Iris só tem olhos para outra coisa: o ‘anel-revelação’ que ganhou de Silvio há algumas semanas. O anel tem um brilhante aparente e uma safira oculta, que o dono pode exibir ou não. ‘Ele me deu por causa da novela. Não é um fofinho?’, diz’

CINEMA
Isabela Boscov

Pequena notável

‘No domingo 25, o auditório de Cannes sofreu um daqueles choques que o júri do festival é mestre em propiciar: contra todas as apostas, que davam Angelina Jolie como uma das favoritas por Changeling, de Clint Eastwood, o prêmio de melhor atriz foi para uma paulista de nome familiar apenas para alguns freqüentadores de teatro. Sandra Corveloni, de 43 anos, recebeu oito dos nove votos do júri presidido pelo ator e diretor Sean Penn. Nem Walter Salles e Daniela Thomas, autores de Linha de Passe e cineastas com tarimba em competições, tinham a menor idéia de que sua protagonista estava para valer no páreo – que dirá a própria Sandra, que faz sua estréia em cinema no papel da diarista Cleuza, mãe de quatro filhos e grávida do quinto, que tem de equilibrar as exigências do trabalho, da falta de dinheiro, das aspirações dos meninos e da torcida apaixonada pelo Corinthians. O prêmio foi entregue a Salles e a Daniela, que agradeceu à sua intérprete em português: a vencedora estava em casa, em São Paulo, com o filho Orlando, de 6 anos. Num desses momentos em que situações dificílimas confluem com grandes alegrias, ela não pôde embarcar para a Riviera Francesa porque, dias antes da data prevista para a viagem, passou mal e perdeu um bebê aos cinco meses de gestação – único assunto que, em sua conversa com VEJA, abateu seu ânimo fervilhante.

Sandra chegou à vitória em Cannes pelo caminho mais breve que se pode percorrer, mas desembocou na profissão de atriz por meio de um trajeto longo e repleto de desvios curiosos. Filha de um agricultor e uma costureira que se mudaram para São Paulo quando ela tinha 5 anos, Sandra demorou para perceber que seu jeito expansivo e sua disposição para entrar em toda e qualquer atividade extra que a escola oferecesse, de corais a pecinhas, eram sintomas de que o palco seria o lugar certo para ela. Demorou não é maneira de dizer: ela estagiou na área têxtil do Instituto de Pesquisas Tecnológicas, cursou engenharia química e trabalhou na indústria de tecidos antes de concluir que a agitação enorme que sua figura miudinha contém não cabia num laboratório. Pediu as contas, foi fazer um curso de teatro no Tuca, o teatro da Universidade Católica de São Paulo, e nunca mais mudou de idéia. Profissional desde o início dos anos 90, ela é uma das integrantes mais ativas do Grupo Tapa, no qual, além de atuar, dirige e dá aulas.

Selecionada para Linha de Passe (que tem estréia prevista para o segundo semestre) por meio de testes, Sandra diz ter estranhado apenas a mudança de registro: tudo o que, no palco, tem de ser amplificado, a câmera pede que se reduza. ‘Às vezes eu dava alguma sugestão para a Fátima Toledo, que preparou o elenco, e ouvia um ‘Está louca?’. Mas, outras vezes, eles topavam a minha idéia’, conta sobre a experiência de, sendo veterana, ver-se outra vez na condição de iniciante. ‘Só uma pessoa vinda do teatro independente, na contramão da cultura da celebridade, poderia ter-se entregue dessa forma a Cleuza’, diz Salles. Pois Sandra acaba de sair da contramão: com a vitória em Cannes, ela agora está em pleno fluxo.’

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O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

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