Na Bahia há uma frase lapidar do mestre Otávio Mangabeira: ‘Pense num absurdo, ele já aconteceu na Bahia’.
Pois esta frase se aplica muito bem agora ao estado do Amapá. É que o juiz auxiliar do Tribunal Regional Eleitoral Anselmo Gonçalves concedeu liminar requerida pelo PDT, mandando retirar do ar a edição online do jornal Folha do Amapá. O descumprimento pode resultar em multa diária de 5 mil reais.
A alegação do PDT, partido do governador do estado, aceita pelo juiz, é que a Folha do Amapá vem fazendo propaganda antecipada extemporânea negativa e que o jornal está manchando a imagem do governador, que é candidato à reeleição.
A edição da Folha do Amapá que embasou a liminar é a nº 571, data de capa de 12 de maio passado, que reporta em sua manchete a saída da siderúrgica Sólida do estado, deixando 300 desempregados, muitas dívidas e o fato de a empresa ter sido instalada com aval do governo estadual, que fez festa na chegada e até anúncios em rádios, jornais e televisões. No site oficial do governo do Amapá está o release onde o governador Waldez Góes festeja a chegada da Sólida.
Além disso, o PDT questiona todas as matérias em que é citado o nome do governador Waldez Góes, inclusive a coluna de humor ‘Tomates Silvestres’, inspirada na do jornalista José Simão, na Folha de S. Paulo.
A concessão da liminar pelo juiz Anselmo Gonçalves é uma agressão à liberdade de imprensa no país e um precedente perigoso, principalmente porque todas as matérias publicadas pela Folha do Amapá são sustentadas em provas extraídas do site oficial do governo do Amapá, no link ‘Prestação de Contas’.
A censura à Folha do Amapá é um absurdo que abre precedente para que os políticos que vêm sendo sistematicamente acusados de ilícitos por jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão ingressem com pedidos semelhantes pelo país.
Em tempo (24/5, às 10h14): O jornal Folha do Amapá que circulou sexta-feira (19/5) com a manchete ‘PDT quer calar a Folha do Amapá’ foi novamente censurado pelo juiz Anselmo Gonçalves da Silva, que mandou retirar do ar o site do diário no dia 23 de maio, logo após a notificação.
Segundo a editora-chefe Maracimoni Oliveira, a decisão do juiz ‘remonta aos tempos da ditadura militar, é censura’. A Associação Nacional de Jornais (ANJ) vai ao STF pedir que a decisão do juiz seja suspensa, já que no país não há censura, expressamente proibida pela Constituição.
A Folha do Amapá tem veiculado apenas matéria jornalística, que não pode, sob nenhum argumento, ter sua divulgação proibida. A legislação brasileira tem instrumentos próprios para quem busca reparar danos causados por matéria jornalística. Mas a proibição prévia ou posterior da divulgação de informações é clara ilegalidade.
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O protesto do jornal
O semanário Folha do Amapá na edição desta sexta-feira – 19/05 – traz na manchete o título: ‘PDT quer calar a Folha do Amapá’. Na quarta-feira (17/5), uma decisão liminar do juiz auxiliar Anselmo Gonçalves da Silva, do TRE/Amapá determinou a suspensão da edição eletrônica número 571, veiculada na semana passada – 12/5.
A editora-chefe, Maracimoni Oliveira, informou que a manchete foi fruto do consenso da redação. ‘Tomamos esta postura porque, no nosso entendimento, o que aconteceu conosco é censura’.
Na quarta-feira, 17, o juiz auxiliar concedeu liminar ao Partido Democrático Trabalhista ordenando que a edição online fosse retirada do ar. Na decisão, o juiz estipulou multa de R$ 5.000,00 caso o jornal descumprisse a ordem. O juiz entendeu que na edição retirada do ar, ‘há nítida intenção de denegrir a imagem do atual Governador Waldez Góes, [possível candidato à reeleição] perante o eleitorado em geral. Seu nome é citado em diversas passagens, de forma sarcástica e demeritória’.
No lugar da reportagem, a Folha do Amapá publicou a íntegra da decisão com um fundo negro e, ao final, a frase: ‘Edição retirada do ar por decisão judicial eleitoral a pedido do PDT-AP, o partido do governador Waldez Góes’.
A Associação Nacional dos Jornais (ANJ) divulgou nota protestando contra a ação do TRE/Amapá. Eis a íntegra da nota:
Nota da ANJ
‘A Associação Nacional de Jornais (ANJ) condena com veemência a decisão do juiz auxiliar do Tribunal Regional Eleitoral do Amapá Anselmo Gonçalves da Silva, tomada ontem, de determinar a suspensão da edição eletrônica nº 571 do jornal Folha do Amapá.
Trata-se de caso evidente de censura à imprensa, embora ela seja expressamente proibida pela Constituição. O juiz alegou que matéria do jornal com críticas ao governador do Amapá é ‘propaganda eleitoral antecipada negativa’, numa esdrúxula definição jurídica. Na verdade, é matéria jornalística, que não pode, sob nenhum argumento, ter sua divulgação proibida.
A legislação brasileira tem instrumentos próprios para quem busca reparar danos causados por matéria jornalística. Mas a proibição prévia ou posterior da divulgação de informações é clara ilegalidade.
A ANJ lamenta que tal ato parta exatamente do Poder Judiciário, guardião da lei e da liberdade’.
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Jornalista