Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Carlos Eduardo Lins da Silva

‘A convivência entre jornalistas e números freqüentemente não é pacífica. Muitos dos que se dedicam a este ofício decidiram-se por ele ao descobrirem, cedo, sua incompatibilidade com a aritmética.

O drama é que a complexidade matemática da sociedade contemporânea é crescente. O jornalista alheio ou hostil aos números pode prejudicar gravemente o leitor.

No dia 6 de agosto, a Folha publicou duas reportagens baseadas em estudos basicamente numéricos. Errou ao dar manchete ao ´mapa da violência em São Paulo´, extraído a partir de dados até então inéditos da Secretaria da Segurança Pública do Estado e relegar a uma chamada pesquisas da FGV e do Ipea sobre crescimento da classe média e diminuição da miséria no país.

O erro, objetivo, foi dar prioridade a um material que se circunscreve a uma cidade, não traz novidades significativas e tem impacto relativamente restrito para o futuro em detrimento de outro, que é o inverso.

O pior é que o próprio ´mapa da violência´, em si útil, relevante e elogiável esforço de reportagem, foi prejudicado por ingenuidade matemática.

A divulgação de totais brutos de ocorrências de crimes por bairros sem a ponderação proporcional pelo número de habitantes distorce qualquer conclusão comparativa com outros bairros.

Como afirmou o leitor Persio Piccinini Mota, ´dizer que numa região tem 300 furtos e noutra tem 400 furtos, só que uma tem o dobro de gente da outra, não as coloca numa mesma equivalência…, cria preconceitos com bairros já bastante sofridos e, principalmente, contra pessoas pobres que moram nestes bairros´.

Era indispensável relativizar os dados brutos com a utilização de taxas por cem mil habitantes, referência consensual da ciência nesses casos. Se isso é impossível porque os distritos policiais têm fronteiras diversas dos distritos do IBGE ou da prefeitura, era melhor ou ater-se ao total do município ou buscar alguma alternativa aceitável.

Alertado para o equívoco, o jornal reagiu na defensiva, respondeu mal a queixas justas e atacou o governo por retardar a divulgação de estatísticas mais abrangentes.

Piccinini Mota critica com razão o que chama de ´estatísticas preguiçosas´. Diante da inevitabilidade de ter de enfrentar os números, muitos jornalistas escolhem simplesmente despejá-los na cabeça dos leitores.

São raros, por exemplo, esforços para dar materialidade aos bilhões de reais ou dólares freqüentemente citados em notícias sobre orçamentos e projetos e que não fazem nenhum sentido concreto para a maioria dos mortais, cujas verbas se limitam, no máximo, às dezenas de milhares.

No caso específico de noticiário sobre crimes, no qual a imprensa em geral, a Folha inclusive, tem uma antiga e imensa dívida de qualidade com o país, a matemática pode ajudar muito a saldá-la.’

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‘Conta de erros’, copyright Folha de S. Paulo, 17/8/08.

‘Cobertura de campanha eleitoral deve ser crítica em relação a todas as candidaturas. A da Folha neste pleito paulistano tem sido muito mais crítica à do prefeito Gilberto Kassab que às demais. Em parte, é natural, já que ele está no exercício do poder. Mas têm ocorrido exageros injustificáveis, como o espaço nobre e grande na terça ao fato de o clipping noticioso da prefeitura incluir a campanha dos outros candidatos.

O Estado de São Paulo está alienando um de seus grandes ativos, o banco Nossa Caixa, cuja venda para o Banco do Brasil está às vésperas de se concluir. A maioria dos leitores da Folha, cidadãos deste Estado, tem interesse direto no tema, já que o banco ´é deles´. Mas o jornal, nos três meses desde que a notícia foi primeiramente veiculada, omitiu-se de promover amplo debate sobre o tema, apesar de setores importantes da sociedade acharem que em caso de venda de banco público, um leilão é obrigatório.

Erros apontados pelo leitor Mario Gonzáles em 28 de julho sobre reportagem a respeito de Federico Garcia Lorca só foram corrigidos em 15 de agosto. Além da demora, a correção deixou de lado esclarecimentos importantes oferecidos pelo leitor. O jornal deveria apressar correções de apuração simples como essas e considerar editá-las no mesmo espaço em que os erros são cometidos.’