Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O que foi feito da Lei Geral de Comunicação Eletrônica de Massa?

As recentes decisões do Conselho Administrativo do Direito Econômico (Cade) do Ministério da Justiça, tanto sobre as condições da fusão entre a Sky e a DirecTV, como sobre a exclusividade da Globo na transmissão dos principais campeonatos do futebol brasileiro, e a escolha do modelo a ser seguido na implantação da TV digital, tornam gritante o absurdo da inexistência de uma regulação geral na área da comunicação eletrônica.


Na verdade, os acertos legais que agora se fazem e a provável adoção do modelo japonês para a TV digital não resolvem as questões fundamentais do setor – e nem aquelas que se manifestam aqui e acolá entre os concessionários dos serviços públicos de radiodifusão.


Duas dessas questões afloraram nas decisões que estão agora sendo tomadas.


Primeiro, a propriedade cruzada. Enquanto um mesmo grupo de mídia puder ser concessionário de televisão aberta e de televisão paga (DTH, cabo ou MMDS) – além de concessionário de emissoras de rádio, proprietário de jornais, revistas e provedores de internet – haverá concentração e menos pluralidade. E, obviamente, haverá conflitos de interesse com outros concessionários que disputam o mercado em cada uma das atividades concorrentes.


Segundo, a ausência de restrições e limites para produção e a distribuição de conteúdo. Um mesmo grupo de mídia produz a maior parte do conteúdo que distribui através de suas diferentes mídias. Isso, além de sufocar a produção independente, possibilita maior controle sobre o conteúdo de toda a mídia e, portanto, menos diversidade. Um único grupo de mídia pode vir a controlar tanto a produção como a distribuição de conteúdo, inviabilizando a competição no mercado.


Acerto entre grupos


A inexistência de um marco regulatório geral em que estejam contempladas todas as mídias – e suas potencialidades de convergência – torna os eventuais acertos parciais sobre fusões e/ou distribuição de conteúdo apenas remendos malfeitos.


Como se faz no resto do mundo, o que urge fazer no Brasil é regular de forma abrangente o setor da comunicação eletrônica de massa.


Cabe, então, perguntar: o que foi feito da Comissão Interministerial criada em janeiro deste ano, em substituição ao Grupo de Trabalho Interministerial criado em abril do ano passado [por sua vez resultado da interrupção do processo de transformação da Ancine em Ancinav em janeiro de 2005], que, aliás, nunca chegou a se reunir, e que deveria preparar uma proposta (limitada aos artigos 221 e 222 da Constituição) de Lei Geral de Comunicação Eletrônica de Massa?


Estavam certos aqueles que anteciparam que a criação da tal comissão de ministros era apenas mais uma forma de ‘empurrar o assunto com a barriga’ e postergar indefinidamente a urgente regulação do setor?


Será que os grupos que dominam a mídia no Brasil já alcançaram – de fato – poder suficiente para inibir inclusive as ações do poder Executivo no sentido da regulação do setor?


Cobrar do governo federal uma resposta a essas questões é tarefa prioritária da sociedade civil organizada, diretamente e/ou através de seus representantes no Congresso Nacional.


O que não se pode mais é acreditar que decisões parciais e acertos entre os mesmos grupos que historicamente se beneficiam da ausência de regulação sejam solução para as questões do setor de comunicações e, muito menos, servidores do interesse público.


E não é exatamente isso o que está acontecendo?

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Pesquisador sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política (NEMP) da Universidade de Brasília e autor, entre outros, de Mídia: Teoria e Política (Editora Fundação Perseu Abramo, 2ª ed., 2004)