Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Terra Magazine


MÍDIA & MEMÓRIA
Paulo Nassar


Da vaga lembrança, 20/12


‘Vivemos dentro de uma grande máquina de esquecimento. Nela, o hábito é
produzir enlouquecida e velozmente informação, claro que nem sempre nova.
Notícia efêmera, fugaz, que foge da interpretação e de uma possível geração de
conhecimento, porque é informação que objetiva estimular e acelerar a
produtividade e o consumo, sem se importar com uma grave conseqüência: o alto
custo social e ambiental. Nem mesmo a destruição de instituições, empresas,
sociedades e comunidades inteiras parece não nos tocar, alertar, ensinar.


Já não nos lembramos mais de nada que tenha acontecido há mais de 20 minutos,
um atestado da nossa triste condição de prisioneiros do momento, do instante.
Contra a memória é possível apostar – e ganhar. Ela, a cada dia é elevada à
condição de mito administrado. A memória que quer se tornar viva é alvo de
reação.


Nos últimos meses, na Espanha, estabeleceu-se uma grande discussão pública
sobre responsabilidade histórica com o objetivo de identificar os milhares de
mortos republicanos, assassinados pelos franquistas, durante a Guerra Civil
Espanhola e, até então, jogados em valas coletivas. É um tema traumático. E nos
lembra os debates sobre os presos políticos, torturados e desaparecidos, no
Brasil, Argentina, Chile e outros países sul-americanos, nas respectivas
ditaduras dos últimos 40 anos.


É possível esquecer os mortos, feridos, desaparecidos e seguir em frente?


Pesquisa recente do DataFolha revelou que a maioria dos brasileiros
desconhece, depois de 40 anos, o famigerado Ato Institucional número 5 (AI-5). O
contexto, as razões e as conseqüências de sua decretação são desconhecidos por
uma multidão no país. Os brasileiros não conhecem a história do país, uma
limitação educacional que não é apenas nossa, mas de outros povos, tidos como
mais educados e cultos.


Em 2008, o cineasta alemão Dennis Gansel realizou o filme ‘Die Welle’ (‘A
Onda’), que mostra os perigos do esquecimento histórico. O filme em síntese
conta que no outono de 1967, Ron Jones, um professor de história, em Palo Alto,
na Califórnia, não conseguiu responder a pergunta de um aluno: ‘como é possível
que o povo alemão alegue desconhecer o massacre do povo judeu?’.


A partir daí, Jones decidiu realizar, durante cinco dias, uma experiência com
seus alunos: decretou um regime de extrema disciplina em suas aulas, com a
restrição das liberdades individuais e a fixação de um ideário único.


Para a surpresa de Jones, os alunos assumem, com os seus corações e mentes,
as bandeiras da nova ordem, e começam a vigiar e espionar uns aos outros, além
de ameaçar quem não se unisse ao grupo, que se autodenominou The Third Wave. No
quinto dia, Jones foi obrigado a acabar com a experiência, que transformou seus
alunos adolescentes em novos nazistas. O filme de Gansel alerta: viver apenas
com a perspectiva de consumir novas informações, sem refletir sobre o que se
experimenta individualmente ou em sociedade, pode trazer velhas novidades, entre
elas, regimes totalitários e ditaduras.


Diante desse furor informacional que nos abarca, é muito provável que, mais
para frente, nos esqueceremos das razões da crise financeira global, dos
financeiros ladrões, das empresas e dos governos não-governados, da sapatada no
Bush, da grande enchente em Santa Catarina, do desastre ambiental da Amazônia,
do desaparecimento da Mata Atlântica, do degelo dos pólos terrestres, do
aquecimento global, do desemprego e também do ano de 2008.


Feliz 2009 para todos aqueles que conservam suas memórias.


Paulo Nassar é professor da Escola de Comunicações e Artes, da Universidade
de São Paulo (ECA-USP). Diretor-presidente da Associação Brasileira de
Comunicação Empresarial (ABERJE). Autor de inúmeros livros, entre eles O que é
Comunicação Empresarial, A Comunicação da Pequena Empresa, e Tudo é
Comunicação.’


 


MÍDIA & CULTURA
Marcela Rocha


‘Ela abraçou uma luta’, diz mãe de pichadora, 19/12


‘- Me ligaram dizendo que ela já sorriu.


– Vai encontrar com ela agora?


– Vou. (Silêncio) Estou muito ansiosa. Tenho muitas coisas para dizer para
ela, nem sei por onde começar.


Rosemari Pivetta é a mãe de Caroline. ‘Ansiosa’, espera a filha e seu
advogado chegarem da penitenciária feminina em Sant’Ana, Grande São Paulo.
‘Estou esperando, o trânsito dessa cidade é infernal’. Rosemari vive em Porto
Alegre (RS) e veio para São Paulo após a prisão de sua filha. Nesta
quinta-feira, 18, Caroline recebeu habeas corpus para responder em liberdade.


Leia também:


‘ Pichadora da Bienal deixa penitenciária em SP


‘Eu não sei o que é classificado como classe média no Brasil, agora ficou tão
difícil’. Rosemari trabalha e faz artesanato para ter um pouco mais de renda no
final do mês, mas ainda assim, vive nos fundos da casa dos seus pais. ‘Sou de
classe baixa, mas, independentemente da classe, ver uma pessoa muito querida
numa instituição como uma penitenciária é muito doloroso’, lamenta a mãe de
Caroline.


Rosemari fez uma única visita à sua filha na penitenciária. Uma visita
administrativa e, segundo ela, ‘muito dolorosa’. A prisão de Caroline aconteceu
no dia 26 de outubro, dia em que a ‘Bienal do vazio’ foi aberta ao público.


Ela e mais 40 pichadores de vários grupos acabaram com a razão de ser do
apelido e preencheram as paredes de Niemeyer. Neste dia, a gaúcha Caroline com
mais dois rapazes – estes já estão em liberdade – foi presa e levada para a 32ª
DP no Paraíso. Ela deixa a prisão depois de 53 dias detida na Penitenciária
Feminina, no Carandiru.


O movimento feito em torno do caso mobilizou conhecidos de Rosemari, que lhe
ajudaram a pagar o advogado. Ela conta que, antes disto, tentou acionar a
defensoria pública. ‘Mas, graças a Deus, minha família e amigos se uniram para
ajudar a pagar um bom advogado’ – conta, aliviada. E prossegue: ‘O caso dela é
complicado’.


– Ela deve arcar com as conseqüências do delito que cometeu. Acho que foi uma
injustiça, mas luto para que ela responda em liberdade e foi só por isto que vim
para São Paulo – afirma Rosemari.


A mãe conta que Caroline sequer ligou para pedir socorro. ‘Não me chamou
porque ela sabia a minha posição em relação à pichação’. Rosemari diz a Terra
Magazine que prefere não se pronunciar sobre as atividades da filha. Mais
adiante ela explica o porquê.


Sobre o futuro da filha, Rosemari revela seus conselhos:


– Por hora quero que cuide da vida dela e pense bem na responsabilidade que
ela assumiu com este ato. Ela abraçou uma luta porque é contra certas coisas e
espero que ela não deixe essa luta morrer aqui. Que ela continue lutando pelo
que acredita, mas sempre lembrando de todos os conselhos que eu sempre dei.


Questionada sobre os trabalhos da filha pela cidade, Rosemari afirma já ter
visto uns pela cidade.


– Gostou?


– Não quero falar sobre isto. É uma questão minha e dela. Eu não quero me
contradizer na luta que eu abracei: justiça, por todos aqueles que passam por
isto, que não é só ela. Eu não vim aqui para dar razão a minha filha. Vim para
ver o porquê de ela estar presa.’


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