Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Veja

TELEVISÃO
Marcelo Marthe

Avante, ruminante

‘Meses atrás, enquanto viajava pelo país que inspira Caminho das Índias, Glória Perez consultou-se com um ‘ser iluminado’ – uma vaca astróloga. A noveleira perguntou ao animal se sua trama faria sucesso. Depois de pagar umas rúpias pelo serviço, obteve a resposta: a vaca balançou a cabeça positivamente. A profecia ainda carece de comprovação – com ibope médio de 35 pontos, Caminho das Índias passa por um começo tão morno quanto o da antecessora, A Favorita. Mas o encontro bovino de Glória não deixou de ser um presságio. A noveleira revelou sua queda por esses bichos em América (2005), ao promover o embate entre o ator Murilo Benício e o touro Bandido – com vitória por nocaute desse último. Agora, como o cenário é um país onde eles são adorados, a boiada está fazendo a festa. Uma novilha até desponta como estrela. Emília, de 1 ano e 8 meses, move-se em cena com desenvoltura. Dá um banho (de atuação, não de leite) num jovem como Caio Blat e não faz feio diante do veterano Tony Ramos. Em sua loja de tecidos, Opash, personagem de Ramos, a acaricia, oferece-lhe frutas e diz: ‘Khana, gomata ma’ (algo como ‘Coma, mãe vaca’). Sem perder a pose de divindade, o ruminante devora tudo e abana as orelhas em aprovação. ‘O bom dessa atriz é que ela não erra uma vírgula’, afirma o ator.

Quando os autores escalam animais para novelas, o pessoal da Globo treme. ‘Eles dão um trabalho terrível’, conta a produtora de arte Ana Maria de Magalhães. O preparo das vacas começou dois meses antes das gravações. Ao todo, oito foram treinadas para circular entre carros, pessoas e cenários. Dócil e comportada, Emília abocanhou o papel principal, enquanto as colegas viraram figurantes. ‘Ela é carismática’, diz Carlos Santos da Silva, criador que a aluga para a emissora. A vaca e Tony Ramos têm um esquema de aquecimento nas gravações. ‘Quando chego, dou bom-dia e ponho a mão em sua testa para mostrar que ela está em terreno amigo’, afirma o ator. Mas há sempre uma substituta de prontidão. ‘Para o caso de ela ter um problema emocional e empacar’, diz Ana Maria. Emília tem o nome da boneca falante do Sítio do Pica-Pau Amarelo porque sua mãe atuava no programa e a pariu no set. Sua única mancha no currículo: ela não é uma nelore indiana legítima, como rezaria o figurino, e sim mestiça dessa raça com a holandesa. Tudo bem: na salada hindu de Glória Perez, esse detalhe faz todo o sentido.

TALENTO BOVINO

Quem é a vaca-atriz de Caminho das Índias

Nome: Emília, em homenagem à boneca falante do Sítio do Pica-Pau Amarelo, pelo fato de ela ter nascido no set de gravação do programa no qual sua mãe ‘atuou’

Comportamento: com 1 ano e 8 meses, é uma novilha dócil e obediente – bem bovina, enfim

Raça: como tudo na trama de Glória Perez, trata-se de uma indiana brasileirinha: é mestiça das linhagens nelore, daquele país, e holandesa

O que faz na novela: invariavelmente, rouba as cenas em que é acariciada pelo tradicionalista Opash (Tony Ramos) ou seu filho Ravi (Caio Blat)

Cachê: 700 reais por dia (embolsados por seu dono, é claro)’

 

 

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O quarto do pânico

‘Das restrições alimentares ao aprisionamento numa gaiola, a lista de castigos infligidos até hoje aos integrantes do Big Brother Brasil é extensa. Nada se compara, contudo, a uma novidade da nona edição do programa: o Quarto Branco. O cubículo de 4,5 por 5 metros foi testado pela primeira vez na semana retrasada. Isolados nele, os marmanjos Ralf, Leo e Newton só poderiam sair se um deles desistisse ou se o nome que indicaram ao paredão fosse eliminado pelo público. Das paredes estofadas à mobília, tudo lá era branco e iluminado por lâmpadas continuamente acesas. Insone e com expressão de desespero, Leo entregou os pontos em menos de dezoito horas. ‘Tive tontura, claustrofobia e falta de ar’, diz. O Ministério Público do Rio de Janeiro analisa denúncia de que o programa teria enveredado pela tortura psicológica. A Globo nega, sob o argumento de que os participantes poderiam sair quando quisessem. ‘Não há dúvida de que as bases disso são as técnicas de privação sensorial usadas pela CIA para extrair confissões’, disse a VEJA o psicólogo americano Philip Zimbardo, cuja experiência mais célebre – nos anos 70, ele enjaulou estudantes voluntários da universidade americana de Stanford para estudar suas reações – inspirou vários reality shows. O mesmo Quarto Branco causou polêmica semelhante na versão australiana do Big Brother. Diante da grita, até a semana passada o diretor Boninho não tinha decidido se voltaria a se valer dele no BBB9.’

 

 

YOUTUBE
Veja

Inferno virtual

‘Há alguns dias, o ator Christian Bale irritou-se com um membro da equipe de O Exterminador – Salvação e passou quase dez minutos xingando o sujeito, com criativas variações de um mesmo palavrão. Bale é só mais um entre os astros que descontam seu gênio sobre os fracos e indefesos – a diferença é que seu vexame pode ser ouvido, alto e bom som, no YouTube, já que o microfone continuou aberto. Em questão de horas, o surto havia sido acessado por cerca de 6 milhões de usuários. Na quarta-feira, outro ator entrou no circo virtual. Com uma inacreditável barba que lhe cobria todo o rosto e óculos escuríssimos, Joaquin Phoenix, de Gladiador, foi ao programa de David Letterman e, também por cerca de dez minutos, estarreceu a plateia com respostas desconexas ou, às vezes, total ausência de respostas. ‘Pena que você não pôde vir aqui hoje’, brincou Letterman no final. Na mesma noite, a entrevista bateu em quase 1 milhão de acessos no YouTube.

Os episódios protagonizados por Bale e Phoenix são elucidativos da velocidade e amplitude do escrutínio a que as celebridades estão hoje sujeitas. Desde o advento do YouTube, dar um passo em falso é quase mortal. Veja-se a triste figura de Benicio Del Toro numa entrevista a uma jornalista de origem cubana de um canal local de Miami. A moça partiu como uma fera para cima do ator por causa do filme Che, em que ele interpreta Che Guevara. A cada fato que ela expunha (por exemplo, as execuções em massa ordenadas por ele), mais Del Toro se enrolava, num sofrimento que chegou ao patético. Em condições normais, só uns poucos espectadores ficariam sabendo de seu despreparo. Postada no YouTube, a entrevista virou aquele constrangimento que não vai embora.

A propagação exponencial de cenas como essas fez com que fossem chamadas de ‘vídeos virais’ – e, para protagonizar um deles, não é preciso ser celebridade. Outro sucesso espontâneo da semana passada foi David After Dentist, em que um pai registrou a confusão mental de seu filho de 7 anos ao acordar daquele ‘cheirinho’ de anestesia no dentista. ‘Isto é a vida real?’, pergunta o menino, angustiado, numa frase que já virou bordão. Não deu outra: um engraçadinho juntou as reações atordoadas do pequeno David, já vistas por algo como 10 milhões de pessoas, ao áudio de Christian Bale. Que, assim, além de ficar conhecido por destratar assistentes, passa à história efêmera registrada na internet como torturador de criancinhas.’

 

 

 

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