‘A ética deve acompanhar sempre o jornalismo, como o zumbido acompanha o besouro.’ Gabriel Garcia Márquez, escritor
Tem sido normal a coluna do ombudsman apontar os erros nas matérias publicadas no jornal, as falhas de português, de abordagem ou de apuração. Hoje, no entanto, será diferente. Afinal, também é preciso valorizar os acertos. E no caso do triste caso do assassinato da empresária Marcela Montenegro, segunda-feira à noite, na Cidade 2000, O POVO agiu de maneira correta ao aguardar a confirmação dos médicos para só então divulgar a morte cerebral da vitima. Evitou assim cair na tentação gananciosa & e às vezes irresponsável & da exclusividade.
Mas vamos aos fatos. Na quarta-feira, o jornal estampou a manchete ‘Crime comove Fortaleza’. Nas páginas internas foi narrado o caso alertando para a questão da participação de adolescentes e de uma criança de 11 anos, o que chocou a sociedade. O local onde ocorreu o crime, aliás, tinha sido alvo, poucos dias antes, de matéria no O POVO que mostrava a insegurança na área. No final do texto da manchete ‘Empresária é baleada na Cidade 2000’ vinha o aviso de que médicos iriam realizar novo exame durante a madrugada da própria quarta-feira para atestar a possível morte cerebral. Seria impossível ao jornal esperar o resultado.
Outros veículos de comunicação, entretanto, não tiveram a mesma precaução. Principalmente os sites de notícias. Ainda na terça-feira à noite, antecipando-se ao exame definitivo, anunciaram sem qualquer comprovação, a morte cerebral da empresária. O boato espalhou-se pela internet, invadiu os estúdios de rádio e televisão e foi manchete em um jornal. A família, que ainda tinha esperança na sobrevivência de Marcela, até então em coma induzido, foi surpreendida.
Leitor surpreso
O erro foi comprovado pela manhã, quando um exame, às 10h40min, constatou uma pequena atividade cerebral na empresária. A correria foi grande nos portais para desfazer a morte que não havia acontecido e que continuava publicada nos sites. O falecimento foi confirmado, oficialmente, às 15h45min, em um último exame.
O que era um acerto do jornal pareceu um erro para o leitor Antônio Mateus. Ele foi o primeiro a ligar na manhã daquela quarta-feira (10). E foi direto ao assunto. ‘Ela já teve a morte decretada e o meu jornal não trás nada. Por quê?’ indagou. Explicado os procedimentos, ele lembrou que viu a notícia pela internet e estranhou o jornal não ter dado mais detalhes. Neste caso, porém, O POVO acertou. Não entrou na onda da notícia fácil do jornalismo on line. Ainda havia uma esperança de vida entre os familiares e médicos, irresponsavelmente tirada por alguns veículos de comunicação. Não cabe a imprensa antecipar fatos sem comprovação. Quanto mais matar esperanças.
INSENSIBILIDADE
O que é uma charge? Para o leitor Carlos & não quis dar o sobrenome & o recurso serve para mostrar um fato, situação ou uma pessoa pública de uma forma humorística. ‘Tem que fazer rir’ afirmou ele. Diante dessa definição, o leitor qualificou como insensível e desrespeitosa a charge publicada na edição de quinta-feira (11), na página de Opinião. ‘Diante do momento que a sociedade está passando, com o assassinato da empresária, ela é de extremo mau gosto. Imagina o que a família está sentindo agora. Quem vai dar risada disso’ desabafou.
A charge mostra uma mulher parada com seu carro em um semáforo, com as mãos para o alto, mostrando desespero. Ela está cercada por três homens, que têm no lugar da cabeça um revólver. A ilustração pode ser vista no endereço http://opovo.uol.com.br/opovo/charge/961170.html. O leitor critica o fato do uso de uma mulher como personagem da charge, o que remeteria ao incidente com a empresária Marcela Montenegro.
Crítica social
O autor da charge, Clayton Rebouças, não concorda com a acusação. ‘Apenas represento, graficamente, através de uma metáfora visual a falta de segurança e a violência diária sofrida no dia a dia de nossa sociedade’ explicou. Segundo ele, a charge realmente usa a sátira, o humor e a ironia. Mas tem outras funções além de simplesmente fazer o leitor dar risada. ‘Elas podem veicular conteúdos de crítica social que levam à reflexão’ explicou Clayton. Um fato não pode ser esquecido nesta relação: o bom senso.
Hora de cobrar
O POVO mostrou durante as duas últimas semanas o caos do trânsito de Fortaleza e o consequente sufoco do fortalezense. Foram panes em semáforos, mudanças no tráfego e muita desinformação. Apesar de apresentar um tema atual, o jornal perdeu a oportunidade de discutir os motivos da real ineficiência da Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e Cidadania (AMC), um dos órgãos mais criticados pela população.
O leitor Vicente de Paula acha que a imprensa precisa cobrar uma posição mais firme das autoridades. Ele sugere que haja uma discussão sobre a falta de fiscalização e de agentes na rua. ‘Estamos desse jeito porque o Estado não atua. Há muita departamentalização’ explicou. Ele tem razão. Cabe à imprensa fazer essas cobranças. A AMC joga a culpa pelo caos no excesso de carros – e a economia vai parar por causa disso? A população diz que não observa a atuação da autarquia, a não ser para multar. ‘Ninguém vê qualquer agente orientando. É um faz-de-conta’ desabafou o Vicente.’