‘O ‘jornal do futuro’ mal começou e os leitores já estão preocupados, principalmente com a renovação do time de colunistas. A despedida, sentida, de Paulo Nogueira Batista Jr., que descreveu seu desligamento como uma ‘execução sumária’, provocou indignação.
Muitos temem que o seu afastamento e a mudança do nome do caderno de Dinheiro para Mercado signifique a rendição a políticas neoliberais. ‘Ele escrevia sem fazer reverências ao deus mercado e à turma da bufunfa’, escreveu o promotor de Justiça e professor universitário Jorge Alberto Marum, 44, de Piedade (SP).
O desconforto dos leitores só aumentou com o anúncio de que o deputado Antonio Palocci passa a escrever sobre economia. Palocci é um dos coordenadores de campanha de Dilma Rousseff e foi investigado por corrupção e por violação de sigilo bancário -em ambos os casos, nem chegou a se tornar réu.
‘A Folha vai contratar também o coordenador de campanha do PSDB e dos demais candidatos?’, perguntou Fernando Domicildes Carvalho, 58, tradutor.
A Secretaria de Redação afirma que ‘a Folha, um jornal pluralista, possui colunistas representativos dos mais diversos setores da sociedade e visões de mundo’. E que ‘o fato de Palocci ser da campanha de Dilma não é impeditivo. Ele é ex-ministro da Fazenda e um dos mais influentes parlamentares do PT. Vale ressaltar que sua coluna será publicada no caderno Mercado’.
É difícil avaliar se a renovação de colunistas compromete o equilíbrio e o pluralismo de opiniões, porque, até sexta-feira, não havia sido divulgado o quadro completo de nomes.
Mas faz sentido questionar o convite a Palocci, que estava até ontem em Nova York apresentando Dilma a investidores estrangeiros. Uma de suas missões na campanha é torná-la ‘palatável’ aos que temem as ideias da ex-militante de esquerda. Dar-lhe uma coluna agora é, no mínimo, extemporâneo.
JOSÉ SARNEY
Da mesma forma, não faz sentido manter a coluna semanal de Marina Silva. Apesar de ser formalmente ‘pré-candidata’, ela está em plena campanha, ninguém duvida. Pelas regras da Folha, ela só perderá seu espaço fixo depois da convenção partidária, o que deve ocorrer em 10 de junho.
Outra decisão discutível é a de manter a coluna do presidente do Congresso, José Sarney. Desde que estouraram as denúncias contra o senador, no ano passado, o ombudsman recebeu 338 mensagens pedindo seu afastamento do jornal, sem contar as encaminhadas ao ‘Painel do Leitor’.
‘Vi as mudanças anunciadas e pensei: só falta chegar a sexta-feira e eu ver aquele nome ali de novo! Para ler a página 2, que tem articulistas excepcionais, eu cubro com um papel a coluna vertical’, diz Olga Bolzan Batista, 73.
A Secretaria de Redação afirma que ‘José Sarney continua sendo uma pessoa muito influente no Congresso e na política nacional’.
É justo lembrar que o fato de tê-lo como colunista não impediu a Folha de publicar as denúncias contra o senador. O jornal não o poupou.
Interromper seus artigos durante o tiroteio político mais intenso que ele sofria em 2009 poderia ser visto como uma forma de cercear um dos poucos espaços que Sarney tinha para expressar-se livremente.
O difícil de entender é por que agora, no jornal do futuro, não se atendeu o apelo dos leitores. Como diz a campanha publicitária, ‘a Folha podia perfeitamente não mudar, mas aí não seria a Folha’.’