‘Um casamento feliz – e interessado – da nova e da ‘velha’ mídia propiciou o mais recente furo mundial: a publicação de milhares de correspondências diplomáticas norte-americanas.
O mérito maior é do site WikiLeaks, ao criar um ambiente inédito que estimula pessoas a passarem segredos de Estado. Graças à internet e a códigos de criptografia sofisticados, é possível hoje revelar uma formidável quantidade de informações confidenciais, numa velocidade e com um alcance incríveis.
Em seu terceiro furo importante, o WikiLeaks está levando a público 251.287 telegramas trocados entre a Casa Branca e 270 postos diplomáticos espalhados pelo mundo.
Com apenas quatro anos de existência, o site já havia revelado imagens e documentos impressionantes das guerras do Iraque e do Afeganistão, reproduzidos em praticamente todo o mundo. Seu fundador, o australiano Julian Assange, passou do anonimato ao rol de celebridades -é capa da última ‘Time’, com uma sugestiva bandeira norte-americana refletida sobre a sua boca.
Mas o WikiLeaks sozinho não faz chover. Sem o prestígio da melhor mídia impressa, não teria obtido a repercussão que almejava. O site precisou ‘entregar de bandeja’ suas informações exclusivas – e todo jornalista sabe como isso dói- para atingir seus objetivos.
Assange negociou com Guardian (inglês), El País (espanhol), New York Times (americano), Le Monde (francês) e a revista Der Spiegel (alemã), para que publicassem juntos, e aos poucos, os lotes de telegramas que ele obteve, tomando cuidado para preservar a ‘fonte’ (quem entregou os documentos).
Coube à ‘mídia tradicional’ transformar o material cru do WikiLeaks em notícia, interpretando e contextualizando as mensagens.
Os jornais, a revista alemã e o Wiou a ‘segurança nacional’ dos EUA. Assange tentou obter do governo Obama informações sobre códigos que identificassem esses casos específicos, mas obteve como resposta que Washington ‘não negociaria sobre documentos oficiais Com o ‘New York Times’, porém, o Departamento de Estado conversou. Deixando claro que era contra a divulgação, indicou os papéis que não poderiam sair de jeito nenhum. O jornal disse ter acatado alguns casos e outros, não.
As cinco publicações que fechaaquilo. O argumento principal foi o mesmo: que há interesse público nas mensagens, que jogam luz sobre como os EUA vêem e negociam com outros países.
Não houve represálias contra nenhum desses titãs da mídia convencional. Já contra o WikiLeaks, armou-se uma discussão sobre se o site pratica jornalismo ou faz espionagem, o que abre uma brecha para que os responsáveis sejam processados, houve pressão para que servidores deixassem de abrigá-lo e seu fundador passou a integrar a lista de procurados da Interpol.
A história mostra que ainda não é fácil – nem suficiente – ser a mídia do futuro.
A Folha foi muito bem na cobertura do vazamento dos documentos diplomáticos. O ‘filé mignon’ das mensagens, com as notícias mais importantes, ficou com as publicações dos EUA e da Europa, num exemplo de miopia do fundador do WikiLeaks – espera-se de alguém que é da internet que pense além do eixo Nova York-Londres.
Mas o jornalista Fernando Rodrigues obteve, com exclusividade, os telegramas referentes ao Brasil. Os textos estão traduzidos na Folha.com (http://bit.ly/hguIiA).
E vem mais por aí. Assange disse ao canal ‘ABC News’ que ainda há documentos que ‘vão incomodar lideranças mentirosas, corruptas e assassinas do Bahrein ao Brasil’. Terão sido exemplos aleatórios?’