Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Paulo Machado

“Depois de algum tempo em que os leitores vinham solicitando que a Agência Brasil incluísse a cobertura jornalística da cultura entre seus principais assuntos floresceu a requerida editoria. Trás à baila um debate curioso sobre viola, violeiros, musica de raiz, tronco de esperança, folhas de identidade e frutos de discórdia. Nessa vereda os galhos ficam na conta de especialistas e especializados que intrincamos nesse debate.

A matéria Som da viola é esperança de preservação da música caipira fala da ‘expectativa de alguns grupos tradicionalistas é a de que esses músicos novatos não deixem morrer a arte da música caipira, também conhecida como música de raiz. No entanto, ‘é irreal manter a arte da primeira geração da música caipira’, pondera o jornalista José Hamilton Ribeiro, autor do livro Música Caipira.’

Além do Zé Hamilton, a reportagem foi ouvir ninguém menos do que Inezita Barroso. Para ela: ‘o talento e o modo de compor permanece igual, mas com novos elementos de inspiração. ‘Agora eles [compositores] contam a história de bandido que assaltou o carro, que matou a mulher, contam um monte de coisas modernas’. Ela lembra que eles, no passado, os cantores eram meio nômades, ‘penduravam aquela violinha no arreio e iam cantar em outra cidade um fato que aconteceu na cidade dele. Eram modas compridas, contavam tudo minuciosamente’, disse a artista.’

Em Especialistas e cantores divergem sobre futuro da viola e da música caipira a Agência Brasil trata do processo que conduziu a musica caipira ao estágio atual bem como de suas perspectivas na opinião de alguns artistas e especialistas.

Para o jornalista Assis Ângelo: ‘‘Essa parafernália eletrônica, essas novidades loucas, de coisas imediatas que estão chegando a todo canto e a toda hora à velocidade do raio estão servindo para acabar com o que há de bom no tocante à moda de viola, às músicas do campo. Tudo isso está indo embora, o que está prevalecendo e o que vai prevalecer é a transformação para pior das composições musicais e da arte em geral.’

A matéria trás, entre outras, a opinião do cantor Léu (Walter Paulino da Costa) da dupla Liu (Lincoln Paulino da Costa) e Léu. Com 53 anos de carreira, a dupla vem de uma família da música caipira: ‘um dos traços da música caipira é que ela ‘tem uma história com começo, meio e fim’, enquanto as outras produzidas de estilo mais recente são marcadas apenas por ‘um refrãozinho, não tem história, não tem vida’ e consistem em ‘cantar a mesma coisa 500 vezes pra ficar fácil para a juventude repetir’.’

Botando lenha na fogueira dessa bem fundada discussão, o leitor e presidente do Clube do Violeiro Caipira, Volmi Batista, escreveu para esta Ouvidoria: ‘Sobre a matéria que fala da música caipira, tem uma confusão estabelecida no meu ponto de vista que é a música de viola e cultura caipira. Infelizmente as pessoas consultadas com exceção de Inezita Barroso, não tem autoridade para falar do assunto. Agora que está virando moda, tocar viola todo mundo que escrever livros, fazer filmes sobre o assunto, mas fazendo pesquisas na internet. Mas enfim tudo é válido. Só gostaria de deixar registrado minha opinião dizendo que uma coisa hoje é ser caipira outra é ser violeiro. O caipira é uma cultura que independe do sujeito ser da roça ou não, ele tem que ter sentimento de brasilidade, o violeiro hoje é na maioria das vezes um musico qualquer que foi contagiado pela viola, porque realmente contagia, mas nem sempre esse músico é caipira. Quanto aos fatos narrados por José Hamilton, com todo respeito que tenho ao brilhante jornalista, mas me parece que ele admite a falência da nossa cultura se esquecendo que o brasileiro de verdade pode estar em qualquer parte do mudo que continua sendo brasileiro e carregando os seus sentimentos. Parece-me também que eles não ouvem Zé Mulato e Cassiano que inclusive estão indicados para o prêmio da música brasileira 2011 com o álbum ‘Sertão ainda é Sertão’ onde temas com próstata, exercícios físicos e a morte, são cantados sem sair do gênero caipira. É preciso ir a Poxoréo no sertão matogrossense para ver 15 mil pessoas numa praça pra ouvir violeiros e assim acontece em várias cidades do interior do Brasil e em algumas capitais, os ‘Encontros de violeiros’. Quanto aos outros gêneros citados, o que tenho a dizer é que seria até caso de policia, o uso do termo sertanejo para o que essas pessoas cantam. E não se trata de ser filhos de roceiros vindos pra cidade ou gente nascida na cidade. São aproveitadores impulsionados pelas emissoras fms que massacram a cultura brasileira desde a década de 80 sem nenhum controle. E agora contam com mais alguns aliados, que são as feiras de agronegocios e gravadoras que juntos formam verdadeiras máfias. Vou parar por aqui, me colocando a disposição.’

Para o fogo não se apagar, esta Ouvidoria escutou o jornalista cultural e produtor do programa Viola, Minha Viola, da TV Cultura de São Paulo, Aloísio Milani (*). Para ele: ‘O ponto principal desta discussão é que a cultura da viola também muda, também tem nuances que não fazem mais parte dos chavões ‘tradicionalismo’, ‘preservação’, ‘legitimidade’ e ‘autenticidade’. Enfim, é possível vivermos novos tempos e estéticas atuais na viola, sem vender a alma ao diabo da indústria. Os conceitos de ‘legítimo’ e ‘raiz’ hoje já são muito mais fluidos. Temos pouquíssimos mestres que vivem na roça como trabalhadores rurais. Ao mesmo tempo, temos uma vanguarda gigantesca aparecendo no interior e nas grandes cidades.’

Quem tem razão pouco importa se o importante é manter viva essa discussão na qual leitores, repórteres, artistas e especialistas contribuem para que a nossa rica viola não pare nunca de tocar o coração do nosso povo.

A editoria de cultura pode continuar aprofundando-se nas agendas de lançamentos bem como na discussão estética e nas políticas públicas de cultura – é um rio caudaloso que leva à nossa identidade.

Até a próxima semana.

(*) – leia também o artigo Revolução da viola: do culto à vanguarda”