Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A exclusividade da cabeçada de Zidane

A cabeçada de Zidane em Materazzi na final da Copa do Mundo é extraordinariamente simbólica. Destrói a encenação em torno desta Copa da Conciliação e mostra que, enquanto os alemães conseguiram cicatrizar suas grandes feridas, outros europeus simplesmente as escondem.


O que disse Materazzi ainda não se sabe. Mas disse algo muito violento. A cabeçada é um golpe muito usado no mediterrâneo árabe. Normalmente, visa a testa do adversário e, quando bem aplicada, pode fazê-lo desmaiar. Zidane reprimiu-se, atingiu o italiano no peito – e o cara desabou.


Algo muito brutal disse o italiano para soltar os instintos mais primitivos do cerebral Zidane. Os 800 jornalistas presentes à Copa da Conciliação eram capazes de citar estatísticas, fazer elaboradas previsões numerológicas, mas não conseguiram entender o final infeliz da Copa do Entendimento e da Amizade.


Aquela cabeçada ainda vai dar muita dor de cabeça. Sobretudo a nós, brasileiros. Aquela cena histórica pode ser reproduzida em fotos, pode ser narrada em palavras, mas as imagens em movimento estão embargadas. Aquilo que o Jornal Nacional mostrou na segunda-feira faz parte da história e não apenas do futebol mas está embargado, vetado. Pertence apenas à Globo (e às emissoras que compraram a exclusividade de transmissão pela TV paga).


O jornalismo-espetáculo finalmente mostrou-se por inteiro, exibiu todas as suas aberrações: chegamos ao cúmulo de trancar os fatos dentro dos cofres. Quando um documentarista do futuro pretender contar a história da intolerância neste ano de 2006, será obrigado a deixar em branco algumas cenas da final desta Copa. Ou tapá-las.


A história do mundo agora tem dono.

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Texto fechado em 12/7, às 14 horas