“‘Suas falas fluem como jorros assonantes de significados múltiplos condensados.’
‘‘Otro’, criação do Coletivo Improviso, sob a direção de Enrique Diaz e Cristina Moura, tensiona fronteiras entre territórios estáveis da dimensão espetacular para encontrar novos limites.’
‘Num mundo cada vez mais ‘pirandelliano’, em que milhares de verdades habitam uma mesma realidade, a peça decreta o respeito à liberdade absoluta da incerteza.’
Se você não entendeu as frases acima, não se acanhe. Eu também não entendi. Tiradas de reportagens e críticas da Ilustrada, elas são exemplos do rumo que a cobertura teatral tomou no caderno.
A preocupação em ser compreensível não existe. Os textos, alguns inexpugnáveis, são feitos para os que trabalham na área ou para ‘eruditos’. O leitor, coitado, termina sem entender o que é a peça e sem condição de decidir se vai ao teatro ou se corre para o cinema.
Mesmo quando se trata simplesmente de apresentar uma estreia, não de criticá-la, muitas vezes o jornalista se esquece de resumir a trama, citar os atores, dar a duração do espetáculo. Há uma preocupação excessiva com a cenografia, a luz e com referências a outros dramaturgos, que, em geral, fazem parte do repertório de quase ninguém.
Na quinta-feira passada, por exemplo, o texto principal da página de teatro da Ilustrada era sobre ‘O Contrato’. Foram 75 linhas de texto, que começava com aspas de outra peça (‘O particular acabou’), trazia um histórico do encenador, mas quase nada do enredo.
Para entender algo, o melhor eram as cinco linhas do Guia: ‘Dentro de um escritório, um gerente submete sua funcionária a provações. Ele inferniza a vida dela, que resiste para não perder seu bom salário’.
Além de reformar os textos, é preciso repensar a pauta, que deve incluir mais musicais, os espetáculos ‘blockbuster’, que ficam anos em cartaz, e descobrir os novos talentos do ‘stand-up’. Não significa aplaudir o que faz sucesso, apenas sair um pouco da praça Roosevelt.
É importante mexer nessa cobertura, porque o teatro em São Paulo nunca foi tão variado: de ‘Mamma Mia!’ à ‘Macumba Antropófaga’ de Zé Celso, há alternativas de sobra nas 140 peças em cartaz semanalmente. Hoje, o teatro é para todos, mas as críticas, para poucos.
Os suspeitos
As fotos dos presos na Operação Voucher, na Primeira Página (13/08), dividiram os leitores. Alguns acusam o jornal de incoerência: denuncia o vazamento, mas amplifica a repercussão. Outros acham que os acusados merecem porque ‘ladrão chique não deve ter tratamento melhor’. Fico com os primeiros: as imagens não precisavam estar na capa.
Paizão
O apresentador Cadão Volpato lançou um livro infantil perto do Dia dos Pais. Na Folha, emplacou três vezes (14/08): na Ilustrada, na revista sãopaulo e na Ilustríssima. Deve ter assessoria de imprensa comemorando.
Detalhes tão pequenos
Duas reportagens trataram do encontro entre PT e PSDB para unificar programas sociais (18 e 19/08): a parte política estava toda lá, mas não havia nada sobre o que foi acertado, quem serão os beneficiados, quanto vão receber.
Miséria e fartura
A Folha marcou um gol com as reportagens do enviado especial à Somália, país tomado pela miséria e pela violência (14 a 16/08). E levou um ‘frango’ ao não noticiar o artigo do bilionário Warren Buffett (15/08), em que ele diz que os ricos têm que pagar mais imposto (http://nyti.ms/buffettnyt).”