Uma vez mais o PCC volta a pautar a mídia, com a nova onda de ataques contra pontos localizados na capital e cidades do interior de São Paulo. Por seu óbvio apelo estético, as imagens de ônibus em chamas têm sido o fiel da balança da cobertura televisiva. A angulação do estado de violência tem alternado do empurra-empurra das autoridades às microrreações da população mais atingida, aqui e ali mostrada em glosas homeopáticas nos cadernos de Cotidiano/Cidades e em flashes breves da tevê. Em meio a essa fragmentação, o fenômeno adquire contornos de uma novela trágica, com um detalhe fundamental: não se tem idéia de quando será exibido o último capítulo.
Por outro lado, a exposição midiática da violência tem o efeito de revelar tragédias dentro da tragédia. Esse é o caso do artigo de Gilberto Dimenstein na Folha, ‘Escola do crime’ (14/7). Em sua análise, Dimenstein chama a atenção para a vulnerabilidade da periferia paulistana aos apelos do PCC. Lá estão 65% da população entre 15 e 19 anos, e a carência por serviços públicos é gritante, ‘a começar pelo policiamento’.
Trata-se de um contingente potencial para recrutamento às ações do PCC, uma tendência que já está em movimento. Vejam-se as notícias mais recentes divulgadas pela própria Folha, reportando a terceirização em curso, inclusive no Nordeste (16/7). Mão-de-obra farta e barata garantem à organização criminosa a manutenção da sua blietzkrieg urbana.
Prova dessa cooptação foi a prisão de um jovem de 16 anos, pego em flagrante enquanto se preparava para atear fogo em mais um ônibus. Em seu depoimento a uma emissora de tevê, a mãe, resignada, explicou que o pagamento seria consumado após o término da ação.
Sem trégua
Em seu artigo, Dimenstein revela estatísticas aterradoras: a taxa de desemprego em diversos bairros da periferia chega a 70%. Aproximadamente 500 mil jovens entre 15 e 24 anos – ‘o suficiente para lotar cerca de oito estádios do Morumbi’ – nem estudam nem trabalham. Somando a desestruturação familiar, o jovem nessas condições vê o caminho para um crime como uma ‘linha reta’. Eis o ovo da serpente, tratado como novidade na mídia, mas um cenário já bem conhecido dos próprios moradores das periferias. Merece registro o comentário ácido do leitor Josmar Dias na revista eletrônica NoMínimo, em reação à estupefação diante da crise paulista:
Caras, não sei de onde vcs estão falando… Moro em SP, na periferia, não mudei absolutamente nada em minha rotina… Não porque sou um super-homem destemido, mas, sim, porque nada mudou em nossa rotina. Todos os dias há dezenas e dezenas de homicídios, roubos, furtos, lesões corporais etc etc etc, só que não se dá tanta bola… Vamos viver a vida… Está tudo como sempre foi, não que isso seja bom…
O que sobra em destemor ao leitor, porque já conformado, falta aos políticos, que partidarizaram uma questão tão delicada e vital. Cabe a vigilância sem trégua da imprensa, cumprindo o que deve ser sua missão: consolar os aflitos e tirar o sono dos poderosos.
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Jornalista, editor do Balaio de Notícias