Para um neto e sobrinho de vítimas do Holocausto, artigos como ‘Liberdade de dizer – Por que o comentário de Clodovil sobre o Holocausto constitui crime de racismo?’, publicado na edição de 10/1/2007 de CartaCapital, ensejam cuidadosa reflexão. Tema delicado, a exigir todo respeito, sofrimento imenso que nem assim consegue sensibilizar corações a emprestar solidariedade cristã, ou ao menos merecer alguma palavra ponderada, equilíbrio, isenção.
Na imagem de prisioneiros de Auschwitz que ilustra o artigo, o olhar das vítimas parece se espantar com o texto. Por trás do arame farpado, seus rostos expressivos são como um protesto, mudo e significativo, tendo levado mais de 60 anos para chegar a CartaCapital, como se elas adivinhassem o que a página 44 traria, justamente ao se aproximarem datas tão significativas como 27 de janeiro – Dia Internacional da Recordação do Holocausto, fixado pela ONU, e 21 de fevereiro – Tomada de Monte Castelo pela Força Expedicionária Brasileira (FEB).
Datas que significarão para muitos de nós, brasileiros, a recordação da perda de entes queridos, seja como heróis e mártires do Holocausto, seja como soldados tombados no campo de batalha, ou civis indefesos desaparecidos nos torpedeamentos.
Uma proposta peculiar
Quem comparecer ao Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra Mundial em 21 de fevereiro testemunhará que brasileiros de todas as fés e origens ainda choram o infortúnio que o nazismo lançou sobre nós. Filhos que mal conheceram seus pais, netos que jamais tiveram o carinho do avô.
Consta ser o articulista prolífico no ramo do Direito, com obras mencionadas.
Além da presente matéria em CartaCapital, há outros escritos versando sobre temas correlatos. Com efeito, deparamos alhures com texto da sua lavra, onde refere:
‘…a questão que me proponho discutir é: havia fundamento jurídico para condenar juizes alemães que agiram de acordo com a lei do III Reich?'[O costume como fonte do Direito Internacional – in www.migalhas.com.br]
É digno de nota, embora não chegue a surpreender, que o mesmo autor desta peculiar proposta venha a público em CartaCapital escrever o que escreveu.
Desnecessários fundamentos para esmagar o nazismo, ignóbil perpetrador do Holocausto sobre o qual o costureiro agora deputado Clodovil Hernandes inconseqüentemente se manifestou, para em seguida retratar-se de sua verborragia, e não como constou no artigo.
Aprendendo lições
As democracias unidas, dentre as quais o Brasil, levantaram-se para daqueles juizes arrancar-lhes as togas desonradas, apeá-los dos púlpitos e das cátedras, reduzir a pó suas academias e indignos tribunais.
Nesse esforço milhares de vidas preciosas brasileiras se perderam em terra, mar e ar. Vidas de soldados, marinheiros, aviadores. Vidas de inocentes passageiros das dezenas de navios torpedeados. Felizmente nazistas não desembarcaram em nossas praias.
Que seria de nós se aqueles juizes alemães a que o articulista se refere aqui chegassem numa eventual vitória do III Reich? Sentenças iníquas baseadas nas ignóbeis Leis Raciais de Nuremberg seriam proferidas contra nós, povo brasileiro orgulhosamente composto essencialmente de negros, mestiços, índios, ibéricos. Seríamos declarados escravos, queimados, exterminados em outro gigantesco holocausto, tudo de acordo com a Lei do III Reich de que trata o texto.
A final, esclareço ao ilustre articulista quando afirma que duvidar da divindade de Jesus Cristo é um direito de qualquer pessoa: nem por isso se sai por aí dando tais declarações, que seriam altamente ofensivas aos nossos correligionários católicos.
Em 5 mil anos de História, de há muito aprendemos a lição que Clodovil Hernandes se viu obrigado a tomar.
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Engenheiro