A pesquisa do Datafolha sobre a ascensão econômica na chamada base da pirâmide social, publicada domingo (16/12) pela Folha de S.Paulo, traz revelações que deveriam se estender além do mero noticiário do dia-a-dia. Está presente naquele relato um material importante para a análise de como a imprensa vem tratando a questão das carências sociais. Além disso, sobram argumentos para quem queira rever os preconceitos que têm sido amontoados desde 2003 contra as políticas sociais do atual governo.
Diz o instituto Datafolha que, desde outubro de 2002, cerca de 20 milhões de brasileiros migraram da classe de renda D para a classe C, o que significa inclusão na sociedade e a criação efetiva de uma perspectiva de vida melhor. Essa inclusão se acelerou muito nos últimos 17 meses, o que leva os pesquisadores a concluir que o fenômeno se deve ao amadurecimento das políticas sociais do governo, que desde sua implantação vinham sendo criticadas pela imprensa, por moto-próprio ou vocalizando diretamente as opiniões da oposição ao governo do presidente Lula da Silva.
Os jornalistas especializados no tema sustentabilidade, que acompanham há anos os estudos sobre inclusão social, sabem que políticas de transferência de renda produzem nas camadas menos favorecidas da população efeitos muito positivos e consistentes. Os três seminários internacionais sobre o tema promovidos no Brasil pela Fundação Itaú Social nos últimos anos têm demonstrado esses resultados, mas os jornais sempre preferiram adotar o viés preconceituoso da oposição, que repete o bordão segundo o qual ‘melhor do que dar o peixe é ensinar a pescar’.
Suporte e energia
Ao publicar o estudo revelando que, desde meados de 2006, acelera-se o processo de retirada de jovens acima dos 16 anos da linha de miséria, a Folha ajuda a colocar um pouco de racionalidade no debate. Não consta que o jornal morra de amores pelo atual presidente da República. Pelo contrário, é no diário da família Frias que se abrigam alguns dos articulistas mais furiosos, que nos últimos anos bombardeiam as políticas sociais, cunhando apelidos como ‘bolsa-miséria’ e alegando que os programas de transferência de renda são mero assistencialismo.
Seminários promovidos pela Fundação Itaú mostram, há pelo menos três anos, que as políticas sociais ditas ‘assistencialistas’, quando acompanhadas de incentivo ao estudo – como é o caso das estratégias adotadas no Brasil, México, Venezuela e outros países – produzem efeitos surpreendentes em jovens de famílias que vivem na miséria. A ajuda direta do governo proporciona a essas pessoas uma chance de sair da estagnação e a mais irrisória condição de escolaridade tem sido suficiente como plataforma para que esses indivíduos encontrem suporte e energia suficientes para cuidar de suas próprias vidas. Mas essas iniciativas são tidas como políticas de ‘esquerda’.
Sem suíte
Nas três versões anuais desse seminário, nunca foram vistos representantes dos grandes jornais, com exceção do último deles, onde foi identificada a presença de um editor do Estado de S.Paulo. O tema nunca recebeu antes qualquer atenção da imprensa, que tem preferido manter seus leitores na ignorância e evitar contestar seus próprios editoriais e os textos de seus articulistas prediletos com dados da realidade.
O estudo Datafolha complementa em parte as conclusões desses seminários, constatando que, de fato, jovens amparados por programas de transferência de renda e assistidos por planos educacionais adequados protagonizam um verdadeiro milagre socioeconômico. A estabilidade da economia e um crescimento consistente fazem o resto do serviço, criando empregos e outras oportunidades de renda.
Os críticos dessas políticas sociais, que sempre encontraram abrigo e destaque na imprensa brasileira, andam na muda. Os fatos desmentem o preconceito, mas mesmo as evidências mais claras ainda não são suficientes para a imprensa mudar seu viés. A reportagem da Folha foi publicada domingo. Na segunda-feira (17/12), nem mesmo a Folha deu seqüência ao assunto.
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Jornalista