Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Modelo de negócio de mídia online enfrenta impasse

Preso à obtenção de receita com publicidade em páginas na web, o modelo de negócio da mídia online enfrenta um impasse em razão da coleta e uso das informações sobre seus usuários para a exibição de anúncios de acordo com o perfil e hábito de navegação de cada um deles. Essa prática, justificada pela necessidade manter as operações das empesas, tem sido alvo de duras críticas de ativistas, o que pôde ser verificado durante o caloroso debate travado em painel da Human Rights and Tech Conference, evento de tecnologia que aconteceu está semana no Rio de Janeiro.

Hoje, para exibir um anúncio online em uma página na internet, o programador insere um código elaborado por uma ad network. A partir desse código, cookies e outros mecanismos digitais rastreiam a navegação do usuário para apresentar-lhe publicidade dirigida. “No Brasil, o modelo de negócio na web veio do antigo método adotado pela mídia impressa, elaborado muitas vezes pelo mesmo departamento comercial”, explica o gerente digital do Info Globo, Aloy Jupiara. Ele ressalta a possibilidade de saber exatamente o perfil do leitor – uma vantagem não só para os anunciantes, mas também para os produtores de conteúdo.

“Ao contrário de uma rede social, no qual a pessoa preenche dados e faz vínculos de maneira ativa na mídia eletrônica, quando o internauta lê uma página de notícias, ela está fornecendo dados pessoais sem o seu consentimento. Isso não me parece justo ou transparente, categorias básicas para o jornalismo”, dispara Chris Soghoian, pesquisador de segurança e privacidade subsidiado pela organização Open Society Foundations. Ex-funcionário da IBM, Google e Apple, ele ganhou notoriedade entre os ciberativistas ao recorrer a lei de liberdade da informação (Freedom of Information Act), e a outros métodos não-convencionais, para trazer à tona informações sobre espionagem na internet realizada pelo governo dos Estados Unidos.

Esquema de vigilância

Mesmo que a informação de navegação do leitor não fique de posse de sites noticiosos, mas de ad networks, Soghoian reforça a responsabilidade da grande mídia na qual os cidadãos comuns confiam. “A pessoa que navega em seu site mal sabe o que é uma ad network, nunca ouviu falar nesse nome nem como funciona. Sabemos que é muito simples inserir um código no site e, por auxiliar esse processo, o site também é responsável por questões de privacidade”, completa o ativista.

Jupiara defende o interesse das pessoas em receber anúncios dirigidos. Para o executivo, as pessoas também não estão preocupadas com essas questões, pois não veem tanto problema em abrir mão de dados de navegação em governos democráticos, como o Brasil. Para Soghoian, a publicidade dirigida é apenas a ponta do iceberg. “O problema não são os anúncios, mas na quantidade de dados sobre mim que um site rastreia. A internet, mesmo em países sem regimes ditatoriais, possui um complexo esquema de vigilância”, alerta. E provoca: “Se o leitor soubesse que uma empresa acompanha todos seus passos no mundo online, ele não ficaria confortável. Então por que ele agiria dessa forma online?”

Repensar modelos

O ativista sublinha a necessidade de educação do público, para esclarecer o funcionamento da rede, mas rejeita a obrigação de checar elementos de segurança. “O internauta tem muito com o que se preocupar: trabalho, rotina, família. Na maioria das vezes, sequer tem tempo para pensar nisso. Essa falta de interesse do público sobre essas questões foi um dos poucos consensos entre os painelistas.” “A educação das pessoas é necessária, mas no modelo atual um grande elemento de dificuldade nesse processo é a própria maneira com a qual as políticas de privacidade de todos os sites são expostas: extensas e complexas, na linguagem jurídica, quase ninguém lê”, reconhece Jupiara.

O alerta final ficou por conta do ativista. Ao mesmo tempo em que a considera um elemento indispensável para acesso ao conhecimento, ele considera o momento atual como crítico para as empresas e organizações da sociedade civil repensarem modelos de negócio em prol de uma sociedade livre. “A sociedade precisa dar uma resposta, e as empresas têm que encontrar um meio de proteger a privacidade dos cidadãos”, resume.

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[Gabriela Stripoli, do TelaViva]