Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Pioneirismo digital

Depois de quase três anos, o Marco Civil da Internet começa a tomar sua forma – e pode colocar o Brasil como pioneiro em legislações que não tratam a internet como uma ameaça. O relator da comissão especial encarregada de discutir o projeto na Câmara, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), apresentou o texto final do projeto, que deve ser votado nesta semana na comissão.

Mas o que muda para o usuário de internet? Muito. A começar pela conduta das empresas, que agora ficará mais clara e regulada por princípios. O governo também terá obrigação de garantir direitos, como a privacidade e a neutralidade de rede.

O “Link” conversou com Ronaldo Lemos, do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio de Janeiro, sobre a nova legislação. Ele foi um dos autores da primeira versão do texto, escrito em 2009 pelo Ministério da Justiça e pela FGV.

Para ele, a versão final ficou “elegante”. “Chegaram a boas soluções para questões controversas”, diz. O Marco Civil vai além da proposta original e antecipa regulações como a proteção de dados pessoais.

Lemos diz que o Brasil se antecipa a uma discussão que ainda toma forma no mundo: a garantia de direitos na internet. O Marco Civil foi uma resposta contra leis que poderiam cercear a liberdade online, como o PL 84-99, a “Lei Azeredo”, que previa que provedores deveriam monitorar a navegação dos usuários.

“O que acontece lá fora é igual ao que aconteceu aqui há três anos”, diz, se referindo às propostas de lei Sopa/Pipa nos EUA. O mesmo movimento tenta criar regras para que a internet continue livre, aberta e neutra.

O que propõe o Marco Civil

>> Provedores – O Marco Civil diz que serviços online não podem responder por infrações cometidas por usuários. O provedor de conteúdo só será considerado culpado se descumprir uma ordem judicial de remoção de determinado conteúdo. A lei, porém, quer estimular a autorregulação.

>> Dados de navegação – A atual redação prevê que os dados deverão ser armazenados por um ano, e só serão divulgados com ordem judicial. Para Ronaldo Lemos, a redação foi boa porque prevê que apenas os grandes provedores de internet deverão fazer o monitoramento. Lan houses, por exemplo, ficam de fora.

>> Proteção de dados – Embora haja uma proposta do Ministério da Justiça para regular como as empresas lidam com dados de usuários, os deputados adiantaram o tema. O usuário terá o direito de saber quais dados são armazenados, como são usados e repassados a terceiros. Também poderá pedir para que sejam excluídos.

>> Neutralidade – O princípio da neutralidade – que define que as empresas não podem privilegiar o tráfego de dados de determinado conteúdo na rede – já estava previsto na primeira versão do texto. Mas, agora, a “neutralidade é para valer”, define Ronaldo Lemos. O princípio será válido para qualquer serviço de fornecimento de internet – provedores de acesso, serviços Wi-Fi, e conexões 3G de operadoras. A única exceção será em relação às restrições técnicas – sujeitas à fiscalização do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) – e emergenciais.

>> O que o Marco Civil não regula – O Marco Civil da Internet não trata de dois assuntos fundamentais para a internet: a tipificação de crimes digitais (há outros projetos sobre isso tramitando na Câmara, incluindo a reforma do Código Penal) e os direitos autorais, essenciais para o consumo de mídia digital. O Marco Civil é uma lei prévia, como uma Constituição, que visa garantir direitos básicos, definindo alguns princípios a serem seguidos pela legislação. Outras leis depois devem regular questões mais específicas.

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[Tatiane de Mello Dias, do Estado de S.Paulo]