‘A Televisão Espanhola (TVE) ofereceu informação segregada e distante da realidade social durante a cobertura da guerra do Iraque’. Essa é conclusão do estudo produzido pela Universidade de Estudos à Distancia (UNED) e a Universidade Carlos III, de Madri, que analisaram as notícias divulgadas e o tempo de duração de cada uma delas durante o conflito, transmitidas pelo telejornal Telediário 2.
O estudo revela que as opiniões a favor da guerra ocuparam 63,6% do tempo dedicado à guerra pelo telejornal, frente a 18,2% das que eram contra o conflito armado. As manifestações contra a guerra ocuparam 32% (15 minutos) do tempo dedicado aos atos de protesto e as ações de boicote ao partido do governo ocuparam 68% (31minutos e 50 segundos).
Outro exemplo de cobertura do Telediário 2 foi a edição de 26 de março de 2003, quando um míssil americano matou dezenas de civis iraquianos em um mercado em Bagdá. O fato ocupou 2 minutos e 30 segundos, ao passo que as ações de boicote ao Partido Popular, o mesmo do atual presidente espanhol José Maria Aznar, absorveram 3 minutos e 20 segundos do tempo do jornal.
Durante a guerra, as referencias às armas de destruição massiva – que tanto tinham espaço na TVE antes do conflito – passaram a ter 0,3% do tempo total de informação, segundo o estudo.
O informe completo sobre a cobertura da televisão pública espanhola do conflito no Iraque foi apresentado em Madri na quarta-feira, 25/2. A equipe responsável pela pesquisa, formada pelo Departamento de Sociologia I (Teoria, Metodologia e Mudança Social) da Faculdade de Comunicação Educativa e Cultura Popular da UNED, e pela Faculdade de Jornalismo da Universidade Carlos III, é a mesma que realizou um trabalho sobre a cobertura da greve geral havida na Espanha em 20/6/02. À época, o resultado da pesquisa serviu de base para a petição de ação judicial cuja sentença condenou a TVE por não respeitar os princípios jornalísticos de objetividade e pluralismo.
Eleições à vista
Editorial do jornal El País, um dos mais tradicionais da Espanha e conhecido por sua postura de esquerda, afirmou que no Reino Unido ou na França seria inimaginável que o diretor de um informativo de televisão pública continuasse em seu posto depois de ser condenado judicialmente por manipular uma notícia.
‘A sentença de 23 de julho de 2003 condenou a TVE pela cobertura tendenciosa que havia dado a greve geral de 20 de junho de 2002. Quase sete meses mais tarde, o diretor de informativos, Alfredo Urdaci, segue em seu posto e sobre ele recai, na campanha eleitoral que se aproxima, a obrigação constitucional de garantir o acesso à televisão pública dos grupos sociais e políticos significativos, respeitando o pluralismo da sociedade.
Há poucos meses, o diretor dos informativos do canal público francês France 2, Olivier Mazerolle, pediu demissão porque em um de seus telejornais noturnos de maior audiência, o 20 Hueres, saiu uma notícia errada sobre o futuro político de Alain Juppé, líder do partido do presidente Jacques Chirac.
As eleições gerais na Espanha ocorrem em 14 de março próximo, e os principais candidatos a ocupar o Palácio de Moncloa são Mariano Rajoy, do Partido Popular, o mesmo do atual premiê Aznar, e José Luis Rodriguez Zapatero, do Partido Socialista Obreiro Espanhol (PSOE).
Vale lembrar que a Espanha foi o único país da Europa a apoiar a guerra no Iraque e, em muitos discursos, o presidente do governo José Maria Aznar declarou estar convencido de que as armas de destruição massiva de fato existiam e eram uma ameaça à paz mundial.
Terminada a guerra, nem as armas nem qualquer indício de sua fabricação foram encontrados. O Iraque é um país sem lei, sem governo, sem direção, sem história e sem futuro. Mas isso é uma outra história.
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Jornalista; as informações desta matéria tiveram por base a edição do diário El País, de 17/2/04