James Holmes, que abriu fogo na sexta-feira (20/7) antes do início da estreia de Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge, talvez não tenha visto o filme. Como muitas outras pessoas cujo sofrimento se reflete na violência, talvez tenha sido simplesmente atraído para um evento que recebeu enorme publicidade e seria visto por uma grande multidão. Em termos bastante cínicos, o jovem procurava um momento de publicidade. Era como um daqueles tontos que ficam acenando no fundo quando um repórter de TV narra um acontecimento importante.
Além disso, Holmes deve ser uma pessoa insana e seu terror íntimo manifestou-se, como tantas vezes acontece hoje em dia, numa relação entre a cultura popular e as armas de fogo. Não há nada mais importante acontecendo neste mundo neste momento do que o novo filme do Batman e, preparando-se para este dia, ou para outro semelhante, ele comprou armas de fogo e instalou várias armadilhas no seu apartamento. Quando foi preso, depois do ataque a tiros, não ofereceu nenhuma resistência. Sua missão estava cumprida.
Não tenho certeza se existe uma relação simples entre filmes e violência com armas de fogo. Acho que a relação se dá entre violência e publicidade. Pessoas como James Holmes, que sentem a necessidade de se armar, também devem sentir uma profunda insegurança e uma necessidade de aprovação. Sempre que ocorre uma tragédia como essa, a ação passa a ser definida por slogans e por músicas e o mesmo vídeo fragmentado do atirador é exibido na TV vezes sem conta.
“Moro num bairro perigoso”
Em algum lugar, à noite, entre os telespectadores, haverá outro indivíduo solitário, aflito, revoltado, que se prepara para a ação. Seu protótipo no cinema é Travis Bickle, de Taxi Driver. Não sei se James Holmes estava muito preocupado com Batman. Desconfio de que estava muito interessado em se ver no noticiário. Mas será que esse jovem podia comprar armamento, munição e explosivos? O lobby desta indústria diz que sim. E o interminável debate sobre o controle das armas de fogo recomeçará, os lobistas da National Rifle Association terão bastante trabalho, os pensadores das colunas de opinião dos jornais exporão como sempre suas posições, a direita espalhará alarmes e nada mudará. E haverá mais um massacre.
Poucos duvidam de que James Holmes seja uma pessoa insana. A legislação dos EUA sobre armas também é insana, mas muitos se recusam a estabelecer a ligação. Os EUA são uma das poucas nações desenvolvidas que aceitam a ideia de que as armas de fogo podem ser usadas indiscriminadamente. Em teoria, os cidadãos precisam se defender. Não houve uma única pessoa no cinema de Aurora, Colorado, que revidasse, mas ainda assim esta teoria terá os defensores de sempre.
Eu estava num bar, em Chicago, uma noite, com meu amigo McHugh, quando um sujeito entrou e nos mostrou que estava armado. “Para que você precisa carregar uma arma?” perguntou meu amigo. “Moro num bairro perigoso”, respondeu. “É mais seguro você mudar de lá”, eu disse.
O círculo da loucura se fechou
Esta seria uma ocasião excelente para nossos partidos políticos se unirem pedindo restrições à venda e à posse de armas mortíferas. O que é improvável, pois esta questão está tão intimamente dominada por fantasias paranoicas segundo as quais o Estado estaria restringindo a liberdade dos indivíduos, que muitos políticos acham que não têm como defender o controle das armas.
Imediatamente depois do caso semelhante, no mês passado, na praça de alimentação do shopping Eaton Center, em Toronto, no Canadá, uma jornalista chamada Jessica Ghawl postou um comentário num blog. Três minutos antes que o atirador abrisse fogo, ela estava sentada no lugar exato de onde ele fez os disparos.
“Percebi como a vida é frágil”, escreveu. “Eu vi o terror nos rostos dos que estavam ao meu lado. Vi as vítimas de um crime sem sentido. Vi vidas mudarem. Percebi que nós não sabemos quando nem onde nossa passagem pela Terra acabará. Quando ou onde daremos nosso último suspiro”.
Esta mesma mulher foi uma das vítimas no cinema de Aurora. O círculo da loucura se fechou.
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[Roger Erbert é crítico de cinema do Chicago Sun-Times, autor de Life itself: a memoir]