Chega! Bastam-me meus próprios pânicos, medos, ansiedades e angústias. Não vou mais procurar sarna para me coçar. Essa sarna que sai diariamente nos jornais é dos outros, não é minha, afora o fato de que são notícias mal escritas, fatos mal contados, estórias deturpadas do cotidiano e repetidas ad nauseum por quase toda a mídia como verdades eternizadas. A realidade, assim me parece, é que quase tudo o que sai em jornal (e nas revistas e TVs) hoje em dia é ideologizado. Extrapolou o paradigma do ‘se há governo, sou contra’. É óbvio que existem altíssimos interesses em jogo. Seus autores, entretanto, parecem não se dar conta das bobagens que dizem. Como a preferência é pela ‘má notícia’ todos primam pela procura insana de ver o lado mais negativo daquilo que noticiam. Afinal, é isso que vende jornal e que dá audiência.
E tome-se notícia ruim! Na economia (os juros vão subir, existe o perigo da inflação aí na frente; como se houvesse demanda reprimida, ou como se a taxa Selic tivesse alguma coisa a ver – no Brasil, é claro – com os juros reais de mercado) ou na questão ambiental (temos de economizar água, vai faltar; como se a água pudesse sumir do planeta). Tem gente que não entende de quase nada, ou entende menos da metade, e dá entrevista para TV e jornal afirmando um monte de asneiras. Em alguns casos é para defender interesses escusos, noutros para simplesmente para aparecer na mídia. E a mídia dá espaço apenas a quem interessa a seus propósitos. Leio o jornal e tenho pesadelos.
Com diploma, mas escrevem mal
Essa preferência humana pela ‘notícia ruim’ é antiguíssima, vem de tempos imemoriais, talvez do milenar Oriente. Chegou às plagas americanas, acompanhada da modernidade pela mídia, sempre entre o épico e o drama. O livro dos livros já registrava em detalhes a maior e derradeira tragédia, o Apocalipse. Pelo noticiário da mídia, o Armagedon já começou lentamente a mostrar que vai efetivamente acontecer dentro em breve. Se havia ainda alguma dúvida sobre o vaticínio da Bíblia é só a gente ler os jornais ou assistir TV e, em especial, freqüentar os sites dedicados às questões ambientais, para nos convencermos de que essa é uma possibilidade real. Até os press releases ultimamente andam contaminados por essa idiossincrasia humana na preferência pela notícia ruim.
O único sinal otimista que se verifica é a procura por uma idealização chamada de ‘sustentabilidade’. Não vejo como é que a ciência vai ‘descobrir’ a sustentabilidade, pois o problema maior não está na sujeira ou poluição causada pelos humanos, mas no excesso de consumo que tem como causa a explosão demográfica. Será que Malthus tinha razão quando fez suas previsões?
O que verifico é que os jornalistas de hoje em dia, tão diferentes dos jornalistas de antigamente, também fazem suas previsões negativas, chegam a empatar com os vaticínios bíblicos. A diferença é que jornalista, antigamente, e estou falando de 30 anos atrás, era profissional ligado ao povo, preocupado com os anseios do povo. Hoje em dia, os jovens jornalistas consideram-se parte integrante das elites, pois possuem diploma e pensam conforme as elites. Mas escrevem muito mal e essa é outra questão que vai se deteriorando a fundo perdido.
Avant première do apocalipse
Quando eu era moleque, o grande medo era a bomba H, a ameaça é de que iríamos derreter devido ao calor provocado pelos mísseis nucleares lançados por norte-americanos e soviéticos na busca pela hegemonia planetária. O mundo parou, no início dos anos 1960, para acompanhar a briga dos mísseis em Cuba. Passado o perigo iminente da III Guerra Mundial, veio a Guerra Fria. Ficou em cartaz por mais de duas décadas – uma espada de Dâmocles sobre nossas cabeças, permanentemente.
Nem bem a guerra das estrelas foi saindo de cena, chegou a Aids para bagunçar a vidas das gerações futuras. Nostradamus era relembrado freqüentemente. Na seqüência ao pesadelo da Aids, que continua vivo – entremeado por guerras de verdade e guerras ao tráfico de entorpecentes, mais as guerrilhas urbanas, com bala perdida para todos os lados –, fomos brindados por manchetes que anunciavam a vaca louca e a gripe aviária. Não esqueçamos ainda dos transgênicos, que trariam mutações humanas jamais vistas e provocariam desequilíbrios ambientais inimagináveis.
No momento, somos atormentados pelo aquecimento global, líquido e certo de que vai acontecer. Temos de reduzir as emissões de CO2! Vai faltar água e combustível também, o petróleo vai acabar, os mares vão subir e qualquer furacão ou terremoto se transforma em avant premiére apocalíptica. Leite adulterado é fichinha, assunto para uma semana, apenas.
O planeta vai se esgotando
Os sinais do fim dos tempos estão nas causas das notícias, e não na notícia em si. Explico melhor: neste fim de ano, assistimos na mídia brasileira a um farto e repetitivo noticiário sobre os recordes de consumo do povão que foi às compras. Vimos todos os templos de compras com gente saindo pelo ladrão. Depois os congestionamentos em estradas e aeroportos, na ida e na volta. Nas praias o povão consumindo dava seu show, com filas de até duas horas para comprar pãozinho em padaria, ou mais tempo ainda na fila dos supermercados, tudo com ausência de vagas para estacionar, trânsito caótico e a inefável falta de água em cidades despreparadas para receber tamanho fluxo de gente de uma só vez. Ilhabela agora vai até cobrar pedágio e proibir a entrada de gente.
Em resumo, não existem políticas públicas capazes de abastecer o povão quando este tem poder e capacidade de consumo. No caso brasileiro é só uma amostra grátis, imaginem o que anda acontecendo na China, que está fazendo inclusão social de trezentos milhões de chineses, trazidos do campo para as cidades para trabalhar nas indústrias de exportação. Essa multidão de gente quer comida! O resultado está nos preços das commodities: recordes de preços em tempos de paz. Em mais de 40 anos que acompanho o agronegócio, jamais vi recordes de safras com recordes de preços.
Lamentavelmente, o planeta precisa urgentemente de um rígido controle demográfico. Senão vamos para o vinagre mais rapidamente. Estamos com 6,3 bilhões de pessoas e chegaremos aos 9,5 ou 10,0 bilhões dentro de 30 ou 35 anos. Sociólogos e geógrafos dizem que haverá declínio apenas a partir de 2050. Não sei se a bola de cristal deles é tela em LCD. Sei que até lá vai piorar, e muito.
Na Europa o controle demográfico se faz pelo alto custo de vida e pela busca de independência pessoal, sem obrigações para com os filhos. A China anda fazendo isso, mas a inclusão social, por seu lado, neutraliza esse esforço. Pior é na Índia, Bangladesh, Indonésia e Brasil, onde não existe controle demográfico e nem incentivo para tanto; pelo contrário, incentiva-se o aumento das proles. Em paralelo a inclusão social aumenta exponencialmente os consumidores. E o planeta vai se esgotando…
Proposição otimista
A mídia, entretanto, não noticia as causas e nem debate essas questões. O que só nos faz acreditar que a Bíblia está correta. Está lá, escrito: ‘No final dos tempos, não nascerão mais inocentes.’ Não haveria manchete mais realista. Como desgraça pouca é bobagem, qual a razão então para ler jornais?
Aos que não me conhecem informo que alguns amigos me comparam ao otimista da piada, mas reconheço que tenho algumas recaídas. Afinal, pesadelos são pesadelos. Como poderia ser diferente diante do que se lê? Propositalmente, neste artigo, defenestrei o otimismo.
Entretanto, penso que o jornalismo deve debater, repensar e reavaliar a sua função social, o que não deixa de ser uma proposição otimista.
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Jornalista, editor e publisher da revista DBO Agrotecnologia, autor de Marketing da Terra (2005) e Marketing Rural: como se comunicar com o homem que fala com Deus (2006)