Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Elogios de aluguel

Todd Rutherford trabalhava no departamento de marketing de uma empresa que presta serviços para escritores autopublicados – o que incluía persuadir a imprensa tradicional e os blogs a resenhar os livros. Era trabalho duro. Ele podia passar o dia inteiro produzindo releases em série, mas há um limite para o enésimo romance sobre vampiros ou mais um manifesto de autoajuda. Não havia resenhistas o suficiente.

De repente, teve uma iluminação. Em vez de fazer de tudo para convencer alguém a resenhar o livro do cliente, por que não eliminar o intermediário e escrever ele mesmo a resenha? Assim, o texto diria exatamente o que o cliente quer – que o livro é espetacular. Vai mudar sua vida. Lírico e envolvente. Assombroso e tocante. Ou coisa que o valha.

Em meados de 2010, Rutherford abriu o site GettingBookReviews.com. Anunciou que resenharia um livro por US$ 99. Mas alguns clientes queriam sua excelência proclamada por um coral. Então, por US$ 499, ele faria 20 resenhas online. E havia os que precisavam de uma orquestra inteira. Por US$ 999, ele faria 50.

De imediato, apareceram nos fóruns online queixas de que o serviço violava o sagrado distanciamento entre autor e resenhista. Mas também apareceram pedidos. Muitos. Antes de se dar conta, Rutherford estava ganhando US$ 28 mil por mês.

Resenhas de pessoas comuns se tornaram um mecanismo essencial para vender quase tudo na internet; elas são usadas para hotéis, dermatologistas, restaurantes familiares, boutiques da moda, igrejas, astrólogos e curandeiros. Em muitos casos, estão suplantando departamentos de marketing, assessores de imprensa, anúncios, o boca a boca e a crítica profissional. Mas não é qualquer tipo de resenha. Elas precisam estar em algum lugar entre o entusiasmo e o êxtase.

Resenhas de consumidores são poderosas porque, ao contrário do marketing à moda antiga, oferecem a ilusão da verdade. Elas se apresentam como testemunhos reais, embora muitas sejam compradas e vendidas como tudo o mais na internet.

Zona cinzenta

O professor Bing Liu, da Universidade de Illinois, Chicago, apontou em um estudo de 2008 que 60% das resenhas da Amazon davam cinco estrelas aos produtos. Liu estima que um terço das resenhas online são falsas. Mas é quase impossível determinar quando elas foram escritas por publicitários ou vendedores (ou pelos próprios autores sob pseudônimo), por clientes (que podem ganhar vantagens em troca de boas notas) ou por serviços terceirizados.

O caso da GettingBookReviews.com, que produziu 4.531 resenhas em sua breve existência, é a história de uma vasta mas obscura região da internet. Ao mesmo tempo, mostra como o mundo dos livros está sendo transformado pela popularidade crescente da autopublicação eletrônica.

Rutherford chegou à conclusão de que as resenhas perderam sua função tradicional. A razão de ser delas não é mais avaliar o livro ou mesmo descrevê-lo, e sim atestar sua credibilidade. Um leitor ouve falar de um livro e o busca na Amazon. Ele vê resenhas positivas e se certifica de que não perderá tempo com ele.

– Eu criava resenhas que apontavam as coisas positivas, não as negativas – diz Rutherford. – Eram resenhas publicitárias, não editoriais.

Quando os pedidos começaram a chegar, Rutherford percebeu que não daria conta de todos sozinho. Oferecia US$ 15 a resenhistas freelance e avisava que, se eles achassem que o livro não merecia cinco estrelas, podiam dizer isso e ainda assim receber metade do valor. Como se pode imaginar, isso raramente acontecia.

No início de 2011, as coisas iam bem. Rutherford alugou um pequeno escritório em Tulsa e contratou dois assistentes, incluindo um editor que polia as resenhas por US$ 2 cada.

O colapso começou quando Ashly Lorenzana, de 24 anos, contratou o pacote de US$ 99 da GettingBookReviews.com para seu livro autopublicado Sex, drugs & being an escort. Insatisfeita, ela postou uma longa e irritada acusação contra os serviços de Rutherfod em vários sites de consumidores, dizendo que tinha recebido tratamento melhor de um resenhista que contratara por US$ 5.

Rutherford devolveu o dinheiro dela, mas o Google logo suspendeu sua conta de publicidade, alegando que não aprovava anúncios de resenhas favoráveis. Na mesma época, a Amazon derrubou algumas de suas resenhas, embora não todas.

Agora, Rutherford vende carros em Oklahoma e planeja seu retorno à zona cinzenta entre o que os autores querem e o que o mercado considera legítimo. Segundo dados da Bowker, empresa especializada em dados do mercado editorial, 600 mil títulos serão autopublicados em 2015, e todos eles vão querer sua dose de atenção.

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[David Streitfeld, do New York Times]