Acaba de ser publicado o Dossiê nº 4, em comemoração aos 25 anos de existência do Jornal Pessoal, do jornalista paraense Lúcio Flávio Pinto. São mais de 500 números, onde o jornalista narra a sua saga para tornar esse pequeno veículo uma realidade feita com muita luta e tenacidade.
Li esse Dossiê com grande apreensão e aprendi muito. Uma verdadeira aula sobre o que se passa na Amazônia, nos bastidores da imprensa, como são tomadas as grandes decisões nessa região, e, sobretudo, a fidelidade do jornalista aos fatos, o que não é uma tarefa fácil, como se sabe. Também, quem lê esse Dossiê, perceberá que, apesar de o Jornal Pessoal ser pequeno, faz muito barulho, pois nele encontramos notícias que não se lê na grande imprensa.
Para conhecer a Amazônia, o JP é hoje uma referência, nacional e internacional. Nele o leitor encontra aos montes boas informações sobre jornalismo. Um jornalismo de frente de batalha (ou, como ele diz, na linha de fogo), que acaba se transformando em verdadeiras aulas.
Por exemplo, os artigos (só para citar alguns) “Jornalismo macarrônico para rir e chorar”, “O mau jornalismo investigativo, a história dos jornais locais” (do Pará), “O jornalismo de canudo”, “A moral do jornalismo (ou o jornalismo sem moral)”, “Imprensa”, “O jornalista se defende escrevendo”, “A quitanda da imprensa”, “O jornalismo que incomoda” e tantos outros artigos sobre o mesmo tema.
Vida longa
As entrevistas que Lúcio Flávio forneceu às diversas associações e pessoas, onde discorre o fazer jornalismo, também deveriam ser temas de discussões nos cursos de jornalismo. O jornalista debate, polemiza, fala sobre diversos aspectos do jornalismo com paixão, como se essa profissão que escolheu fosse a razão de sua vida (e é, certamente).
A edição do Dossiê –Uma voz amazônica há 25 anos (sim, 25 anos!) é uma façanha na história da imprensa brasileira. Nenhum jornal alternativo conseguiu isso, mesmo no período da ditadura. Isso, com certeza, ficará nos anais da imprensa brasileira e na memória do povo da Amazônia e do Brasil.
Quantos pesquisadores, sociólogos, economistas, jornalistas e estudiosos da Amazônia se utilizam das informações do Jornal Pessoal e das matérias que Lúcio Flávio publica? Infelizmente já li algumas teses e livros que fartamente usam as fontes de jornal e não o citam, o que é uma grande desonestidade intelectual. O que custa dar crédito para a publicação?
Lembro, também, das matérias que Lúcio Flávio publicou no jornal O Estado de S.Paulo, no momento da corrida para a fronteira amazônica, com a abertura das grandes rodovias, como a Transamazônica. Intelectuais escreveram livros, fizeram as suas análises e citavam literalmente trechos dos artigos sem nenhuma vez darem os devidos créditos.
O Jornal Pessoal, muitas vezes, sofre o mesmo processo colonial que sofre a nossa devassada Amazônia: suas matérias são apropriadas e transformadas em notícias e análises, sem nenhuma citação.
Que seja longa a vida do Jornal Pessoal. Sabemos das agruras do jornalista, mas é sua saga navegar a contrapelo. Ou como diz o título de um de seus livros: Contra o Poder. É o que tem feito esse repórter admirável e, muitas vezes, odiado em sua própria terra. Mas isso faz parte do jogo.
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[Benedito Carvalho Filho é sociólogo, professor da Universidade Federal do Amazonas e ombudsman do Jornal Pessoal]