Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Forças políticas e de mercado restringem mídia crítica

Os jornais impressos de Israel estão em crise, impactados pelas pressões globais da era digital e por um pequeno mercado de jornais de língua hebraica que vem passando por problemas. O Maariv, um dos jornais de maior circulação em Israel, está em vias de fechar, perdendo, aparentemente, uma luta dura de 64 anos contra o tabloide hebraico populista Yediot Aharonot. Na quinta-feira (4/10), o Haaretz, o principal jornal da intelligentsia de esquerda de Israel, não foi publicado pela primeira vez em 30 anos; a redação entrou em greve por um dia para protestar contra o plano de demissões de um considerável número de empregados. A TV também está sendo atingida. O Canal 10, uma das duas emissoras comerciais de televisão de Israel, está em situação precária, aguardando para ser resgatado pelo governo ou por investimentos do exterior.

Analistas de mídia falam de uma tendência ameaçadora: um mercado que já foi diversificado e vem se tornando cada vez mais concentrado e propenso a influências políticas. Em especial, dizem, o noticiário econômico dos jornais impressos foi reorientado pela chegada, cinco anos atrás, do Israel Hayom, um jornal nacional gratuito de propriedade de Sheldon Adelson, bilionário americano conservador que é um firme apoiador do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. Atualmente, o Israel Hayom, considerado pró-Netanyahu, diz ter a maior distribuição entre os jornais hebraicos nos dias úteis. As emissoras de televisão e rádio também passaram a ter maior controle por parte do Estado.

“Prefiro vários cães de guarda”

Embora os jornais venham se debatendo pelo mundo afora, no pequeno mercado de Israel – com uma população de quase oito milhões de pessoas que fala hebraico, árabe e russo – a ameaça parece amplificada. Considerado o seu tamanho, Israel tem um número relativamente grande de veículos de mídia, avalia Tehilla Shwartz Altshuler, que dirige o projeto de reforma da mídia no Instituto Democrático de Israel, um centro de pesquisas independente. Isso intensifica a concorrência entre jornais por leitores e anunciantes e o Israel Hayom, com o apoio de Adelson, conseguiu abocanhar a maior parte do mercado. O advento do Israel Hayom, acrescentou Tehilla, acelerou uma situação “que iria acontecer de qualquer maneira”.

O estreitamento do mercado de mídia pode agradar a alguns conservadores do governo de Netanyahu. Yuval Steinitz, ministro das Finanças, declarou recentemente, num encontro fechado de ativistas do partido Likud, que, embora “a mídia seja importante para a democracia”, a israelense, em sua maior parte, prefere a esquerda ao Likud. “Além disso”, acrescentou, “a mídia perdeu o respeito por uma palavra pequena e simples: ‘verdade’. Não há mais respeito para com a palavra verdade”.

Tzipi Livni, ex-líder da oposição, veio em defesa da mídia numa coluna recente, no Maariv. “Tenho certeza de que alguns políticos se sentem mais seguros com a diminuição de veículos de mídia e com o fato de haverem agora jornalistas que precisam da ajuda do governo.” E continuou: “Prefiro vários cães de guarda – alguns dos quais podem eventualmente errar ou negligenciar seu trabalho e latir muito alto – a um único cão leal que fala uma única voz: a do dono.” A administração do Maariv está agora nas mãos de defensores nomeados pela justiça, uma vez que seu proprietário não consegue cobrir as perdas. Aguarda-se a venda do jornal a Shlomo Ben-Zvi, um israelense que publica um jornal de direita chamado Makor Rishon.

“Israel sem o Haaretz seria Israel sem a Corte Suprema”

Mas mesmo que a venda seja feita a Ben-Zvi, ele já disse que irá manter apenas cerca de 300 dos 2.000 empregados do Maariv para que o site continue funcionando; no futuro, talvez o jornal seja publicado num formato limitado. Isso significa que 1.700 jornalistas, além de funcionários administrativos e gráficos, provavelmente ficarão desempregados. “É como o vendedor de salsichas que compra um cavalo e conta-lhe sobre as maravilhosas viagens que o aguardam”, disse Zvi Reich, ex-editor do Yediot Aharonot e atualmente no departamento de Comunicações da Universidade Ben-Gurion, no Negev. “Será brutal.”

Conscientes de que a empresa não tem condições de pagar seus direitos e pensões, os empregados do Maariv fizeram passeatas de protesto pelas ruas de Tel Aviv e Jerusalém. Analistas disseram que o Maariv vinha passando por um declínio financeiro e uma administração ruim há cerca de 15 anos e tinha perdido sua identidade à medida que tentava imitar o Yediot Aharonot, dirigido a leitores de cultura mediana.

No começo do mês, Amos Schocken, diretor do Haaretz, também voltou a falar da possibilidade de fechar o jornal se seus empregados não se adaptarem à nova e rigorosa realidade dos negócios. O Haaretz, no entanto, preenche uma outra posição. Embora sua circulação seja reduzida, seu impacto é amplo. “Israel sem o Haaretz seria Israel sem a Corte Suprema”, disse Uzi Benziman, ex-colunista do Haaretz e atualmente editor de The Seventh Eye, um jornal online que trata de questões da mídia. “Não surpreende que o Maariv seja o primeiro a desaparecer”, disse. “E não tenho certeza que seja o último.”

“Qual é a do Maariv?”

Apesar disso, para muita gente a morte do Maariv deixaria um buraco na história do país. O jornal foi fundado em 1948, ano que em Israel se tornou um Estado, por jornalistas do Yediot Ahoronot (Últimas Notícias), o principal jornal hebraico na época, que, insatisfeitos, se demitiram em consequência de uma luta por condições de trabalho e princípios jornalísticos. O novo jornal, que inicialmente se chamava Yediot Maariv (Diário da Tarde), logo passaria a ser conhecido como Maariv.

Em seus primeiro 20 anos, o Maariv era considerado o jornal mais lido em Israel e o mais ligado à elite política, econômica e social. O declínio começou na década de 70, segundo Rafi Mann, que trabalhou no jornal por quase 30 anos e agora é professor de Jornalismo no Centro Universitário Ariel, na Margem Ocidental, e na Universidade Hebraica de Jerusalém. Foi então, disse Mann, que os editores do Yediot Ahoronot “compreenderam a revolução social que ocorria em Israel”, com a ascensão do partido Likud, de Menahem Begin, que falava para um público que se considerava desfavorecido. Mas o Maariv, acrescentou Mann, “não soube ler o mapa social de Israel corretamente”.

Embora o Maariv tenha continuado a publicar matérias importantes, seus editores e colunistas mais conhecidos, como Ephraim Kishon, vêm, em sua maioria, do passado. “Nos últimos anos”, disse Mann, “tanto os anunciantes quanto os leitores ficam se perguntando ‘Qual é a do Maariv?’”. Informações de Isabel Kershner [New York Times, 5/10/12].