Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Diana, Madeleine, Isabella e outras

Já se sabe o que vai ocorrer quando alguma celebridade ou criança rica, de preferência do sexo feminino, morre ou desaparece de forma brusca ou misteriosa. É prato cheio para toda mídia sensacionalista apelar para o sentimento feminino. Rende dias, meses, horas e horas de reportagens ruminantes. Conforme o rendimento o assunto, chega a permanecer em pauta durante anos. Especulam, inventam, descobrem detalhes inúteis, torcem e distorcem inventando novidades velhas, arrastando a matéria a cada dia. Policiais, advogados, delegados, peritos, médicos, legistas, bombeiros, juízes, repórteres, testemunhas, parentes, apresentadores, âncoras, aspones, opinadores ficam em evidência. A pedido da mídia e do público se fazem sucessivas reapresentações da reconstituição do fato cada vez com nova dramaturgia. E o fato se alimenta a si mesmo.

Quantas mulheres e crianças morrem diariamente nos tiroteios das favelas do Rio… Quantos milhares de mulheres e crianças morrem no Iraque, Gaza, Cisjordânia, Afeganistão, Sudão, Somália, Ruanda, Paquistão… O anonimato destas vítimas não interessa à mídia, que precisa vender emoção, tocar a sensibilidade das mulheres e até dos homens, chamando a atenção para dramas urbanos isolados, aumentando sua importância. Não só de guerra e tiroteios morrem crianças e mulheres. Morrem também, aos montes, de fome, inanição, falta de assistência, pobreza, miséria, abortos. Sim, mas a preferência cai sempre sobre as cenas burguesas. Estes outros fatos nem são noticiados ou lembrados, não fazem parte da nossa cultura cognitiva.

As comoventes novelas

Todas as emissoras comerciais de TV do Brasil estão bombardeando o espectador com o caso da menina de São Paulo. A audiência continua em alta, alimentada por boatos e supostos fatos novos que desde o início são os mesmos. Dura duras semanas. A imprensa sensacionalista européia não passa uma quinzena sem inventar alguma ‘novidade’ sobre a morte da Diana ou sobre o desaparecimento da menina inglesa no balneário chique de Portugal. Esses assuntos vendem, comovem. E não são só as mulheres que se interessam por estas especulações, os homens também acompanham, mesmo fingindo desinteresse.

A briga de audiência entre a Globo e a Record não está servindo para melhoria do nível jornalístico de nossa televisão. A concorrência descambou agora para quem mostra mais furos em crimes, roubos, tráficos, assaltos, seqüestros, catástrofes. O noticiário político inteligente, a exposição e análise sadia de fatos relevantes do Brasil e do mundo,o noticiário internacional, tem tido pouco destaque nestes telejornais em briga de audiência em horário de pico. O povo, espectador brasileiro, se aliena cada vez mais. Depois destas encenações macabras, segue-se sempre com as comoventes e sensacionais novelas, das sete, das oito, das nove, das dez.

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Jornalista, Aracaju, SE