‘Vive a nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas (…) para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas (…), o Brasil livrou-se do governo irresponsável que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições. (…) Poderemos, desde hoje, encarar o futuro confiantemente. (…) Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus inimigos. (…) Aliaram-se os mais ilustres líderes políticos, os mais respeitados governadores, com o mesmo intuito redentor que animou as Forças Armadas. Era a sorte da democracia no Brasil que estava em jogo.(…) A esses líderes civis devemos, igualmente, externar a gratidão de nosso povo.(…) Se os banidos, para intrigarem os brasileiros com seus líderes e com os chefes militares, afirmarem o contrário estarão mentindo, estarão, como sempre, procurando engodar as massas trabalhadoras, que não lhes devem dar ouvidos (…).’
Se fosse uma prova de múltipla escolha, a pergunta seria no sentido de assinalar com um X a resposta certa sobre que jornal, em 2 de abril de 1964, publicou este editorial de apoio ao golpe de Estado que derrubou o então presidente constitucional João Goulart?
Jornal do Brasil ( )
Correio da Manhã ( )
O Estado de S. Paulo ( )
O Globo ( )
Folha de S.Paulo ( )
Tribuna da Imprensa ( )
Palavras de Brizola
Acertou quem cravou o X em O Globo. Mas não errou totalmente quem assinalou os outros jornais mencionados porque publicaram editoriais muito próximos de O Globo, que é o mesmo jornal que hoje, ao mais puro estilo udenista, manipula informação sobre as mais diversas questões, em um jogo diário objetivando basicamente esconder as origens da publicação e apagar o passado comprometedor.
Neste momento, uma terminologia criada pelo colunista Elio Gaspari, o jornalista que herdou os documentos do ditador de plantão Ernesto Geisel e do general Golbery do Couto e Silva, está sendo utilizada diariamente pelo jornal de maior circulação no Rio de Janeiro. Até chamada de primeira página com o termo ‘Bolsa-Ditadura’ é colocada.
Gaspari, o jornalista que foi íntimo do poder no período Geisel e Golbery, é contra a concessão de valores pagos pelo Tesouro a jornalistas perseguidos pela ditadura. É um direito que o assiste. Ele talvez tenha explicações a dar à sua própria consciência, pois enquanto ganhava a confiança dos referidos personagens do período ditatorial, outros jornalistas naquela mesma época combatiam a ditadura. Se hoje temos liberdade para expor pontos de vista, não foi pelas relações de Gaspari com Geisel ou Golbery, mas pelos combatentes.
Mas, para acabar de vez com esta história, não seria o caso de lembrar, como fez recentemente o blogueiro M. Pacheco, que o termo correto em matéria de bolsa é, isto sim, ‘Bolsa da Ditadura’? Por ela, os brasileiros e brasileiras seriam informados com quanto publicações jornalísticas como O Globo, por exemplo, foram contemplados pelos generais de plantão para defenderem a ditadura.
Então, vejam bem, cobrem os custos da ‘Bolsa da Ditadura’. Lembrem-se das palavras do então governador Leonel Brizola: O Globo e a TV Globo ‘engordaram na estufa da ditadura’.
Lei de Memória Histórica
Mas isto, claro, Gaspari não poderia cobrar, senão perderia o espaço dominical em O Globo; muito menos o candidato a prefeito do Rio, deputado Fernando Gabeira, que se esforça diuturnamente para conseguir o apoio das Organizações Globo para a sua mais recente empreitada política, numa aliança da direita sofisticada representada pelo PPS, PSDB, PV e mais recentemente o PTB de Roberto Jefferson.
Em suma: o rancor de Gaspari e de O Globo contra as anistias políticas, sobretudo para este ou aquele jornalista, é do mesmo tipo ideológico de ranço udenista que a publicação guarda até hoje e se reflete, vale sempre repetir, nas sucessivas críticas a Getúlio Vargas e a qualquer tipo de organização dos trabalhadores e ao movimento social de um modo geral.
Ainda em relação à anistia política, não se pode esquecer que a legislação brasileira segue apenas uma recomendação das Nações Unidas recomendando este tipo de procedimento nos países assolados por ditaduras, como nestas plagas de 1964 a 1985.
A Espanha, por exemplo, aprovou em dezembro do ano passado a Lei de Memória Histórica, que não apenas condena o regime ditatorial do generalíssimo Francisco Franco, como também determina a indenização de familiares das vítimas daquele período – isto, 70 anos depois da Guerra Civil.
O Globo, entretanto, pensa diferente, tem ojeriza de jornalistas contrários à ditadura.
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Jornalista, Rio de Janeiro, RJ