Tuesday, 03 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

O controle do que vemos, ouvimos e lemos

Nos últimos anos se produziu nos Estados Unidos um avanço espetacular na monopolização da mídia. Pode-se tomar como ponto de partida deste processo a Lei de Telecomunicações (Telecommunications Act) de 1996. Esta lei suspendeu as restrições que existiam sobre a propriedade de estações de rádio. Antes dessa data, uma companhia só poderia ser proprietária de duas emissoras de rádio AM e duas FM dentro do mesmo mercado e não mais de 40 em escala nacional. Com o fim desta limitação se desencadeou una onda de concentrações.

Nos seis anos que se seguiram à promulgação da lei, a Clear Chanel Communications, por exemplo, obteve o controle de 1.225 estações de rádio em 300 cidades. Atualmente sua propriedade ou controle se estendeu a mais de 6.600 estações, mais da metade das que existem nos Estados Unidos, incluindo uma rede nacional (Premiere Radio Networks) que produz, distribui ou representa uns 90 programas, serve a cerca de 5.800 emissoras e tem por volta de 213 milhões de ouvintes semanais. Inclui também Fox News Radio, Fox Sport Radio e Australian Radio Network, entre outras. Sua receita em 2011 alcançou a cifra de 6.2 bilhões de dólares.

Eliminadas as restrições para a concentração vertical, só faltava suprimir as limitações que existiam à concentração horizontal estabelecidas pela regra da FCC (Federal Communications Commission) de 1975 (cross ownership rule) que proibia ao que possuía um periódico a posse de uma estação de rádio (ou de televisão) e vice-versa no mesmo mercado. O objetivo da regra era impedir que uma só entidade se convertesse em voz muito poderosa dentro de uma comunidade. Em 2003, a FCC flexibilizou estas restrições, mas o Terceiro Tribunal de Apelações bloqueou a implementação das mudanças. Em março de 2010, a Corte suspendeu o bloqueio e ficou aberto o caminho à concentração horizontal.

Bloqueio criminoso

A imprensa, o rádio e os veículos televisivos, seguem as agendas que impõem os donos. Quando estes são milhares, prevalece a diversidade de informação e opinião dentro dos limites que permite o establishment. No entanto, quando a consolidação se produz em grande escala, como sucede atualmente, a agenda que domina é a de uns poucos e poderosos proprietários, e a ideologia que promovem os meios é, pois, a mais reacionária e ultradireitista. Hoje temos mais canais de televisão que nunca, mas uma quantidade substancial deles se dedica ao fundamentalismo religioso, às vendas pela televisão, ao mais frívolo entretenimento ou à pornografia. No resto, a qualidade desceu ao seu pior nível, o que, unido ao excesso de comerciais, alcança limites embrutecedores.

Tudo isto é extremadamente perigoso em uma sociedade que apenas lê e que perdeu a capacidade para discernir entre fatos e opiniões, porque se acostumou à seleção ou apresentação dos fatos em conformidade com critérios pré-estabelecidos. Os fatos são ignorados ou deformados para validar opiniões.

A desregulação abriu à competição desleal todos os mercados de telecomunicação, incluindo os de cabo ou satélite e a internet. Cinco conglomerados midiáticos controlam 90% de tudo o que lemos, ouvimos e vemos. O que de estranho tem em que dezenas de milhões de norte-americanos aprovem a guerra preventiva, os assassinatos seletivos de presumidos inimigos dos Estados Unidos, a tortura de prisioneiros, as violações de fronteiras com drones (aviões não-tripulados) ou os crimes chamados danos colaterais? Ou que ignorem completamente os sofrimentos da população de Cuba por causa de um bloqueio criminoso de meio século ou as injustas e cruéis sentenças ditadas contra cinco patriotas cubanos.

Influência profunda e negativa

A concentração produz meios que não se dirigem a toda comunidade. Os anunciantes proporcionam ¾ da receita e a eles somente interessa o setor da população com capacidade para adquirir seus produtos ou seus serviços. Tipicamente, a população de menor renda não é de seu interesse. A concentração transforma os cidadãos norte-americanos em simples consumidores e espectadores.

Atualmente, o livre mercado é o critério com o qual se analisa a mídia, quer dizer, a operação eficiente e a máxima ganância constituem os objetivos principais ou únicos, sem levar em conta o importante papel que devem desempenhar os meios na sociedade e na vida pública. A mídia concentrada é geralmente um grande e complexo conjunto de instituições sociais, culturais e políticas, não só econômicas, que exercem uma profunda e negativa influência na sociedade. Se permitimos que controlem o que vemos, ouvimos e lemos, controlarão também o que pensamos.

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[Salvador Capote é jornalista]