A semana foi pródiga em manifestações acerca da criação da Rede Nacional de Televisão do Governo Federal, uma proposta que o ministro das Comunicações, Hélio Costa, apresentou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A sugestão chegou justamente às vésperas da realização do Fórum Nacional de TVs Públicas, marcado para os dias 11 a 14 de abril. O Fórum vem sendo organizado desde o ano passado, sob a coordenação da Secretaria de Audiovisual do Ministério da Cultura, apoiando-se em debates e estudos feitos por entidades do setor.
A polêmica gerada com a notícia do anteprojeto de criação da Rede Nacional de Televisão Pública – uma emissora de TV do Poder Executivo – para divulgar as ações do governo federal (leia aqui) traz à tona uma tão antiga quanto atual falta de discernimento entre o que é público e o que é estatal. A confusão conceitual, segundo o secretário nacional do Audiovisual do Minc, Orlando Senna, merece esclarecimentos.
Em carta divulgada esta semana, Senna lembra que, quanto às naturezas e atribuições, TV pública e TV estatal são bem diferentes e não concorrentes, embora complementares. ‘A Constituição brasileira é bem clara quando define no artigo 223 os três sistemas que compõem o universo televisivo: o privado, o público e o estatal’, refere o secretário, explicando que a TV estatal faz prestação de serviços do governo. Isto, do seu ponto de vista, representa uma das variedades entre os pontos de vista na democracia midiática. Já a TV pública, também ‘componente importante da variedade democrática, é porta-voz da sociedade (da pluralidade de opinião e da diversidade cultural) sem intermediação do governo ou dos interesses da TV privada’, esclarece.
Segundo o secretário, o que o ministro Hélio Costa apresentou foram as linhas gerais de uma proposta para um Canal do Executivo, que teria embutida a ampliação da TV estatal (atualmente sob a responsabilidade da Radiobrás), para ser levada a todo o território brasileiro. ‘Ou seja, o ministro das Comunicações está trabalhando na reorganização da TV estatal’, esclarece Senna.
Manifesto
Numa das ações reflexas sobre a notícia da rede estatal, quatro entidades representativas das televisões públicas apresentaram esta semana aos ministros Dilma Rousseff, da Casa Civil; Luiz Dulci, da Secretaria-Geral da Presidência da República; Hélio Costa, das Comunicações; Gilberto Gil, da Cultura; e à Presidência da República, um manifesto ‘Pela diversidade e complementaridade dos sistemas privado, público e estatal de TVs brasileiras‘. Elas sustentam que a televisão pública ‘deve se estruturar, regular, operar e financiar na estrita observância do disposto no Artigo 223 da Constituição Federal, que estabelece o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal de TV, e precisa ser regulamentado por lei ordinária’.
As entidades afirmam que no campo público unificado da televisão brasileira ‘não se estabelece qualquer antagonismo ou oposição entre canais estatais e canais não-estatais, sendo todos eles considerados do mais alto interesse público’. A carta foi assinada pelos presidentes das entidades Abepec (Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais), Jorge da Cunha Lima; Astral (Associação Brasileira de Televisões e Rádios Legislativas), Rodrigo Barreto de Lucena; ABCCOM (Associação Brasileira de Canais Comunitários), Fernando Mauro Trezza; e ABTU (Associação Brasileira de Televisão Universitária), Gabriel Priolli.
Debate
Segundo Priolli, o Estado tem o poder de fazer o que quiser, mas já que construiu um Fórum de debates para discutir os problemas que envolvem as TVs públicas, universitárias, comunitárias e educativas, ‘problemas que são os mesmos, em geral’, diz o dirigente, nada mais certo do que discutir neste espaço, também, essa TV estatal. ‘Para a ABTU, o conceito do que é público não se define apenas pela forma de gestão, mas pela possibilidade de ser construído em cooperação, em unidade’, explica. Por isso, o documento defende que o I Fórum Nacional de TVs Públicas, organizado em parceria com o governo federal, é o foro mais adequado para a discussão de todos os problemas e propostas que afetam a televisão pública brasileira.
O secretário Orlando Senna esclarece ainda que o Governo Federal tem utilizado a terminologia ‘rede pública’ na caracterização do Canal do Executivo em discussão, gerando equívocos na compreensão dos objetivos da proposta, cuja natureza se inscreve no fortalecimento do sistema estatal de televisão. Porém, segundo Gabriel Priolli, para a ABTU o estatal está contido no público e por isso a iniciativa (e também o conceito) deve ser levada para discussão no Fórum de TVs Públicas.
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Da Redação FNDC