Um movimento que surge a partir de protestos contra um candidato à presidência do México e, de maneira espontânea, toma grandes proporções adotando a democratização da comunicação como um dos seus principais eixos de luta. Trata-se do movimento #YoSoy132 que, nos últimos sete meses, tem levados milhares de mexicanos às ruas e provocado reflexões entre a população sobre diversos temas da política nacional, sobretudo no que se refere à manipulação da informação e concentração dos meios de comunicação.
O movimento começou no início de maio, quando o candidato à presidência do México pelo Partido Revolucionário Institucional (PRI), Enrique Peña Nieto, foi visitar a Universidade Iberoamericana. O candidato, que representa uma linha política conservadora e de direita no país, foi recebido pelos estudantes da universidade com muitas críticas e reagiu de forma autoritária às contestações, o que só gerou mais protestos.
“No dia seguinte aos protestos, os estudantes da Universidade Iberoamericana observaram que a televisão e os jornais fizeram uma cobertura completamente distorcida do que ocorreu: disseram que nada havia acontecido a Peña Nieto e reproduziram a fala do presidente do PRI, que disse que aqueles protestos eram forjados, não eram autênticos”, conta Joel Ortega, mestrando da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM) e uma das lideranças do #YoSoy132 hoje.
Ortega conta que a partir desse episódio os estudantes se deram conta de que os meios de comunicação estavam desempenhando um papel questionável. Além disso, ficava claro que a Televisa, maior rede de televisão do México, estava manipulando a informação a favor de Peña Nieto.
Seis eixos
O movimento passou a se chamar #YoSoy132 depois que os estudantes da Universidade Iberoamericana produziram um vídeo desmentindo a informação repercutida pela grande imprensa mexicana. “O vídeo reuniu 131 estudantes que diziam 'Sou estudante e tenho direito de protestar'. Os estudantes afirmavam que o protesto havia sido autêntico, e não forjado, como afirmou o presidente do PRI e repercutiu a imprensa. Depois desse vídeo, estudantes de outras universidades e pessoas de outros espaços da sociedade começam a dizer: 'eu sou 132'“, explica Ortega.
A partir daí, estudantes da Universidade Iberoamericana e de várias outras universidades do México (cerca de 20) começaram a se organizar em assembleias e, por meio de convocatórias abertas divulgadas basicamente pelas redes sociais, foram se mobilizando em marchas que chegaram a reunir até 10 mil manifestantes na capital do México. “As pessoas foram se organizando de maneira espontânea, independente, com a intenção clara de evitar que Peña Nieto chegasse à presidência”, comenta o representante estudantil.
Tania Arroyo, doutoranda da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), ressalta que, além da linha de mobilização e protesto, o #YoSoy132 também vem elaborando propostas que compõem o programa de lutas do movimento. “Essas propostas são elaboradas em grupos de trabalho, que aprofundam as discussões sobre vários temas de interesse da sociedade. Além da democratização dos meios de comunicação, há outros seis eixos em torno dos quais circula o nosso programa de lutas: mudança do modelo educativo; mudança no modelo econômico neoliberal; mudança no modelo de segurança; transformação política e vinculação com os movimentos sociais; migração e feminismo e diversidade sexual”, explica a estudante que integra o grupo de trabalho que discute a comunicação no México.
Grupo de trabalho
Segundo Tania Arroyo, representantes de 20 assembleias do movimento #YoSoy132 compõem o grupo de trabalho que discute a democratização dos meios de comunicação no México. “Elaboramos um diagnóstico e formulamos um documento com os seis pontos que o movimento considera fundamentais para a democratização dos meios de comunicação no país entre eles o estabelecimento de um sistema de meios constituído por três setores (público, comercial e comunitário) e o reconhecimento do exercício da comunicação como um serviço público”, conta Tania.
A estudante acrescenta que a discussão sobre comunicação feita dentro do #YoSoy132 fez com que organizações como a Associação Mexicana de Direito à Informação (Amedi) e a Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc), que vem trabalhando historicamente com o tema no México, estabelecessem diálogos com o movimento, o que vem gerando uma articulação conjunta que resultou, recentemente, na elaboração de dez pontos para a democratização dos meios. “Chamamos esse documento de Documento de Exigências Mínimas (D.E.M.). Nele, se estabelecem as propostas de forma mais clara e, paralelamente, fizemos um plano de trabalho e um plano de ação. O movimento agora está a discutir se elabora uma proposta nova de lei para regular a mídia ou se elabora uma proposta de reforma constitucional”, explica Tania.
Tania avalia que, ao elaborar essa demanda, o movimento contribui para posicionar a questão da democratização dos meios de comunicação na agenda nacional, repercutindo a questão e colocando-a como um problema importante do país. “Se gerou um tema de repercussão nacional na agenda pública e evidentemente que tem uma repercussão importante na população. Não digo em toda ela, mas em setores importantes chegou à consciência de que existe uma manipulação da informação nos meios. E isso é um grande ganho”, considera a estudante.
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[Cecília Bizerra, do Observatório do Direito à Comunicação]