Dia após dia os principais jornais do país deram espaço para declarações e anúncios midiáticos de governos das três esferas – federal, estaduais e municipais, mais o Ministério Público – motivados pelo incêndio de Santa Maria. Na quinta-feira (31/1), a Folha de S. Paulo ainda permanecia na mesmta toada: “Haddad promete avaliar segurança de boate em 90 dias”. Dia após dia, o espaço dos grandes jornais foi franqueado às autoridades. Há exceções: na mesma quinta-feira, o Globo manchetava resultado de uma iniciativa própria: “Rio tem 49 espaços culturais sem alvará”.
Redações jornalísticas, no Brasil e alhures, dependem da produção de notícias pelos poderes e contrapoderes – ou pelas elites e contraelites, como preferirem. É uma relação tão visceral que gerou ao longo das décadas uma rotina mental. É automático. O jornal – em papel ou digital – se apresta a intermediar a comunicação entre governos e governados, nessa ordem.
Gasolina aumentou pouco
O mesmo fenômeno ficou patente no noticiário sobre o aumento da gasolina: os três jornais mais influentes do país noticiaram a alta de 6,6% “nas refinarias” (Folha, Estado); o Globo fez uma chamada com título sem números e mais ligado ao interesse do consumidor: “Gasolina sobe hoje na bomba” (4%, dizia o texto). O matutino carioca foi também o único que chegou perto do conhecido nexo causal: “O governo quer melhorar o caixa da Petrobras”.
O Valor, entretanto, mostrou o que pode ser um título inteligente, que não paga tributo à dependência do poder e faz a síntese da questão: “Gasolina sobe e defasagem vai continuar.” No texto da chamada, explica-se que a elevação de receita da Petrobras, de R$ 600 milhões a R$ 650 milhões por mês, “vai aliviar a situação da companhia, mas está longe de resolver o problema da defasagem entre os preços do combustível importado pela estatal e os cobrados no mercado interno.”
Resumo da ópera: “Com a correção de preços, a companhia continuará perdendo R$ 1,2 bilhão por mês.”