Era só jornalista e foi um jornalista reclamão até o fim. Internado desde o dia 9 no Hospital São Camilo, onde morreu aos 30 minutos de domingo (13/4), vítima de insuficiência respiratória e de um tumor na bexiga, entrou na UTI inconformado com o tamanho do televisor do quarto e falando das colunas que teria de escrever quando tivesse alta.
‘O Palmeiras tem de ganhar, mandem buscar minha televisão em casa’, comentou para a mulher, Maria Thereza, sua companheira de quase meio século – 44 anos de casamento, depois de 3 anos e 7 meses de namoro e noivado. Antes de ser entubado, às 21 horas de sábado, conferiu o último texto publicado pela manhã no ‘Estadinho’, suplemento infantil do Estado de S.Paulo. ‘Use Olimpíada, sem problemas’, ensinava na coluna ‘De Palavra em Palavra’.
Natural de Cáceres (MT), Eduardo Martins nasceu em 26 de julho de 1939. Aos 17 anos de idade, começou a trabalhar na Redação do Estado, primeiro fazendo palavras cruzadas como colaborador e, a partir de 1960, sucessivamente como redator, repórter e editor. Aos 68 anos, costumava dizer, com muito orgulho, que esse foi o único emprego de sua vida, uma paixão profissional.
Trabalhou num período difícil para a imprensa, ‘tempos heróicos’, como gostava de definir. Lembrava principalmente o período de 1974 a 1982, quando foi editor de Nacional, a seção mais visada pelo regime militar. O Estado publicava versos de Os Lusíadas, de Luís de Camões, para preencher o vazio deixado pelas reportagens censuradas.
Obra inédita
Eduardo Martins foi também editor de Economia, de Interior e de Arte (atualmente ‘Caderno 2’), antes de passar a assistente do editor-chefe e, mais tarde, a chefe do Departamento de Documentação e Informação (Arquivo), cargo que ocupava ao se aposentar em junho de 2006.
Deixou o jornal, mas não parou. Além de escrever para o ‘Estadinho’, fazia palavras cruzadas para a Agência Estado e artigos para revistas e editoras. Ex-colaborador da Rádio Eldorado, atividade pela qual recebeu o prêmio de melhor programa de cultura em 2001, também dava freqüentes entrevistas para emissoras de rádio e televisão.
Era um especialista em Língua Portuguesa. Autor do Manual de Redação e Estilo, que o Estado lançou em 1990 com grande repercussão, escreveu o livro Com Todas as Letras: o Português Simplificado e uma série de seis Resumões da Língua Portuguesa.
Para o diretor do Master em Jornalismo e professor de Ética, Carlos Alberto Di Franco, o jornalista foi um grande profissional. ‘O Manual de Redação que ele deixou é, na minha opinião, o melhor do Brasil’, afirma. ‘Presta uma ajuda eficaz sem se tornar uma camisa-de-força.’
Eduardo Martins deixa inédita a obra Os 300 Erros Mais Comuns da Língua Portuguesa, que seria lançada nos próximos meses. Apaixonado pela Gramática, Eduardo Martins era um jornalista capaz de falar durante horas sobre redação, estilo, hifens e acentuação.
Enterro
Do Hospital São Camilo, o corpo do jornalista foi levado, na manhã de domingo, para o velório do Cemitério São Paulo, no bairro Pinheiros, onde foi enterrado às 16 horas. Cerca de 120 pessoas, entre familiares, companheiros de trabalho e amigos, assistiram ao sepultamento. Cobrindo o caixão, uma bandeira do Palmeiras. [Colaborou Alexandre Gonçalves]
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