Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Os camaradas da vizinhança

Na Grande Florianópolis, não faltam WWWs a fim de publicar conteúdo jornalístico. São sites, portais e blogs, que deixaram de ser diários pessoais de autores quaisquer e viraram cases de sucesso. Os posts assinados pelo jornalista Moacir Pereira, colunista político do Diário Catarinense, do grupo RBS, exemplificam bem o cenário. O blog do Moacir, assim como o de outros colunistas, está vinculado ao site do jornal e pertence à colcha de retalhos campeã de acessos no estado que é o Diário Catarinense. A concorrência, aqui praticada pelo jornal Notícias do Dia, do grupo RIC, não deixa a desejar nesse aspecto. Seus colunistas também escrevem em blogs e os links são exibidos no site do jornal em banners bem chamativos.

Essa imensidão infinita de endereços eletrônicos gera mais e mais acessos aos sites das mídias de massa aqui da região. A prática se repete em outros estados do Brasil. O blog do Noblat é destaque no site de O Globo e também o mais popular dessa lucrativa estratégia de marketing. Ocorre que, eventualmente, o visitante do blog navega no site da empresa e vice-versa. Isso torna os WWWs dos jornais mais rentáveis, pois, se bem acessados são atrativos aos patrocinadores e ao seu precioso, valioso e indispensável incentivo financeiro.

São estratégias financeiras, sim. Daí, os humanistas de plantão dirão que os donos de jornais são mercenários. Aham! Estamos falando de empresas jornalísticas. Os Sirotsky e os Petrelli também têm o direito de ganhar dinheiro com seus negócios, ainda que atuem a serviço da sociedade e desde que não se esqueçam de cumprir essa função. Caso esqueçam, seria melhor – para eles e para o leitor do jornal – que atuassem no marketing.

Uma coisa é uma coisa, outra coisa é…

Até aqui o leitor foi conduzido ao muro das percepções, porém tudo o que escrevi pode e deve ser deixado em segundo plano. Não quero discutir audiência e nem mesmo rentabilidade. Vou me concentrar em outras duas demandas que principalmente as grandes empresas jornalísticas não querem preservar: a qualidade de suas notícias e a satisfação pessoal de seus profissionais.

Índices de audiência nada têm a ver com qualidade. O Diário Catarinense é, provavelmente, o mais rentável jornal em Santa Catarina e o único que circula em todo o estado. Mesmo dispondo de todo esse poder, raramente pode-se dizer que o jornal saiu com uma matéria fascinante. Não, agora mais parece um álbum de figurinhas. Dessa forma, ele garante audiência, pois o público nem se interessa por análise, contexto e não quer ler um bom texto, certo? Talvez! Mas um jornal que se preze, se liderado por bons jornalistas (eu disse jornalistas) deve praticar o bom jornalismo. O leitor não merece virar as páginas de um álbum completo de figurinhas. O que é ainda mais frustrante, pois a graça do álbum é tentar completá-lo.

Audiência nada tem a ver com satisfação profissional. A história recente da RBS mostra que a empresa perdeu bons profissionais. O portal AcontecendoAqui noticiou no dia 20 de março que a apresentadora do Jornal do Almoço, Karem Fabiani, assinou um contrato de dois anos com a Ric TV Record, a empresa concorrente. Também não faz muito tempo que o Portal MakingOf veiculou uma entrevista de Francis Silvy na qual ele diz que pediu seu desligamento da RBS TV porque se sentiu desmotivado.

As recentes demissões do Grupo RBS ocorreram em distintos produtos da empresa. Segundo nota oficial veiculada pelo Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina, na Capital, foram homologadas 14 novas rescisões contratuais somente nos três primeiros meses de 2013. No texto, o sindicato denuncia e repudia a RBS, esclarecendo que duas rescisões foram da RBS TV, uma da Kzuca Promoções e 11 do DC. Sete ocorreram em janeiro, cinco em fevereiro e duas em março. Oito delas foram a pedido dos empregados, a maioria por não suportar as jornadas extenuantes e ver desrespeitados direitos trabalhistas consagrados inclusive na Convenção Coletiva de Trabalho 2012/2013.

Pequenez dos gigantes e grandeza dos nanicos

A RBS não está perto do fim, mas atravessa, com notória dificuldade, um momento de turbulência para o qual seu novo presidente precisará olhar com muita atenção. Enquanto os gigantes se ajeitam, cresce no mercado o espaço para as mídias alternativas. Como o próprio nome sugere, elas são uma alternativa, uma possibilidade à insatisfação do público e dos profissionais. Os estudantes de jornalismo, em Santa Catarina, não sentem vontade de ingressar na grande mídia. Eles têm medo do estresse, da pressão, de perder a vida social.

Diante desse triste cenário, projetos que dispõe de menos investimento têm um enorme espaço para preencher. Bala na agulha não falta e com isso eles podem cobrir o rombo no bom jornalismo que a grande mídia provocou por aqui. O site CarosOuvintes, que atua no estudo da comunicação em Santa Catarina, sobretudo na preservação da memória do rádio é um senhor exemplo. O Portal Desacato analisa e critica os acontecimentos em Santa Catarina, no Brasil e até na América Latina. Suas reportagens e artigos discutem questões sociais. A linguagem é objetiva e não peca na contextualização, é outro da lista. E esse Estopim, um laboratório onde inquietos estudantes de jornalismo falam sobre os assuntos que pipocam nas suas ansiosas cabeças, também podem receber a menção.

É tempo de os alternativos mostrarem a alternativa. E a vantagem deles é que não precisam seguir cartilhas, nem manuais de redação. Os pequenos têm a possibilidade de ousar, de escrever uma matéria criativa, de emitir uma opinião crítica, que não será tolhida pelo interesse dos empresários e anunciantes. Os pequenos, em bom e popular português, têm a faca e o queijo na mão. Basta que cortem o queijo direitinho, sem afobação. E como miséria pouca é bobagem, é bom que não comam o queijo todo em um só dia e, se possível, vale até partilhar com os outros ratinhos.

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Nicolas David é estudante de Jornalismo, Florianópolis, SC