‘Bancos Centrais: guardiões da moeda ou larápios históricos?’ Esta é a matéria de capa da revista Insight Inteligência (Ano X, nº 40, março de 2008), cujo editor é o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos – que, aliás, acaba de estrear como romancista com Acervo de Maldizer.
Eu lia a matéria do economista Armindo Abreu – ‘As aventuras de Artur Virgilio e o dinheiro sem eira nem beira (pág. 26-54), cujo subtítulo é ‘Não admira que todo economista seja candidato a presidente do Banco Central’ –, mas deixo a televisão ligada, sem som, porque a deputada Luciana Genro, filha de Tarso Genro, atual ministro da Justiça, vai ser entrevistada por Jô Soares e estou interessado em ouvi-la e vê-la.
O mar sussurra seus acalantos aqui pelos lados da Barra da Tijuca e estou numa noite leve.
Depois de almoçar com amigos no Adegão Português, entre os quais o embaixador José Clemente Baena Soares – simplesmente Baena para o trio –, passei pela Livraria Argumento, no shopping Rio Design, vi Goethe e Barrabás na vitrine. Foi o doutor Baena quem me deu a frase com que fecho o meu romance.
É raro você ver livro de autor brasileiro nas livrarias brasileiras, ainda mais na vitrine. E a vendedora me informa que o reparte já foi reposto duas vezes. Sabendo disso, a editora Novo Século enviou um banner que me parecia imenso, mas que fica pequeno lá na parede de livraria.
Pelo nome
Vou ler a revista na sacada e por momentos me esqueço do Jô, da Luciana, do mundo, mas principalmente do Brasil.
Quando me dou conta, volto para diante da televisão e Luciana Genro está dizendo a seguinte frase: ‘Não foi o PT que me expulsou, eu que expulsei o PT de mim’. E acrescenta: ‘O Tarso Genro até tentou refundar o PT, mas não deu mais. Meu consolo é que aqueles que me expulsaram estão denunciados no STF como quadrilheiros’.
Jô quer saber por que ela chama o pai pelo nome. A loura é ágil, ainda que controversa e difícil de ser entendida: ‘Em público, eu chamo ele de Tarso Genro; na intimidade familiar de pai’. Todos os que assistem ao programa do Jô sabem que ele fala muito, às vezes mais do que o entrevistado, como já fez comigo, mas fala ainda mais com gestos, mãos, caras e bocas. E eu, ainda assim, adoro o Jô e o programa dele.
Fico pensando como eu me sentiria se minha filha me chamasse pelo nome. Deve ser a pessoa de minhas relações que menos pronuncia meu nome no mundo! E nos falamos todos os dias.
Você, leitor, que é pai, já imaginou ouvir seus próprios filhos se referindo a você pelo nome completo? Mas, e a matéria, me perguntarão vocês?
Vida de nababo
‘Olha só’, como se diz aqui no Rio, o texto que estou lendo é longo, melhor os leitores buscarem na internet [ver aqui]. O autor usa como fonte um livro de Murray T. Bloom, The Man Who Stole Portugal (O homem que roubou Portugal).
Parece coisa de romance, mas é documentário. Artur Virgílio Alves dos Reis, nascido em 1896, falsifica um diploma de engenheiro da Escola Politécnica de Engenharia, da Universidade de Oxford. A escola não existia, mas um notário de Lisboa atestou que existia, sim, como não? Se ele declarou que existia, quem ia negar o documento?
De posse do falso diploma, nosso herói segue para Angola, em 1916, onde vai trabalhar como Superintendente de Engenharia no Departamento de Obras Públicas. Ali dedica-se a recuperar locomotivas emperradas.
Em 1919, demite-se do emprego na África e recebe das autoridades o seguinte elogio: ‘Alves Reis desempenhou-se das tarefas a seu cargo com grande zelo e competência, bem servindo à Colônia e do mesmo modo a República’.
Ele volta a Portugal em 1922, compra ações de uma companhia que opera em Angola, emitindo cheques que devem ser descontados em Nova York. Navios lentos lhe permitem utilizar recursos sem juros por pelo menos uma semana, mas acaba emitindo 40 mil dólares em cheques sem fundos. Devem ter errado de navio aquela semana, ou ele não subornou direito… Culmina falsificando, em 1925, dois milhões em moedas de 500 cruzados. Leva dez meses de vida nababesca.
Preso, enfim, é condenado a vinte anos de prisão. Morre em 1955.
O mundo do dinheiro e da política nos parecem distantes, mas afetam a nossa vida todos os dias.
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Escritor, doutor em Letras pela USP e professor da Universidade Estácio de Sá, onde é vice-reitor de pesquisa e pós-graduação; seu livro mais recente é o romance Goethe e Barrabás (Editora Novo Século); www.deonisio.com.br