Como montar estratégias para processos
O modelo de assassinato de reputações, como arma de disputas comerciais, alcançou seu auge na recente fase da revista Veja, especialmente através do colunista Diogo Mainardi.
O último capítulo dessa novela foram colunas e podcasts de Mainardi, a respeito de um dossiê que continha trechos de um inquérito sigiloso do Ministério Público Italiano.
Conforme demonstrado em dois capítulos da série (‘O post-it de Mainardi‘ e ‘Lula é meu álibi‘), ao contrário do que Mainardi afirmava em sua coluna, o dossiê foi escaneado no Brasil, rearrumando papéis do inquérito original da Itália. E a prova maior é que seu conteúdo foi divulgado no mesmo dia em que o arquivo foi gravado, no site de uma ex-jornalista da Folha, Janaína Leite.
Tempos depois, a revista CartaCapital entrevistou Angelo Jannone, ex-chefe de Segurança da Telecom Italia, nos tempos de Tronchetti Provera. A entrevista de Jannone foi aproveitada por ambos para tentar demonstrar que os inocentava.
Sobre o caso italiano dedicarei um capítulo especial, dada à sua aparente complexidade e por demonstrar o jogo complicado do qual Mainardi tornou-se participante, sabe-se lá com que propósitos.
O que interessa, neste capítulo, é a explicitação das relações de Mainardi com Janaína, e de ambos com Daniel Dantas.
Vamos entender melhor quem é a parceira de Mainardi nesse jogo.
No seu blog, Janaína Leite se apresenta como ‘consultora’. Não há nenhuma indicação sobre quem são seus clientes. No seu período na Folha atuou em uma série de matérias francamente suspeitas, conforme se demonstrará a seguir. Todas elas seguiam a mesma linha de denúncias utilizada por Mainardi quando trata do tema telefonia.
Vamos à análise de quatro casos.
O caso Cecília Melo
Conforme explicado no capítulo ‘O post-it de Mainardi‘, há dois inquéritos em andamento, um no Brasil, outro na Itália.
O do Brasil é conduzido pela Polícia Federal e Ministério Público Federal em São Paulo, sobre grampos, quebras de sigilo, a partir do dossiê Kroll, divulgado pela Folha anos atrás. O da Italia pelo MP italiano, originalmente era sobre as estripulias da Parmalat italiana. Depois, graças a uma manobra engenhosa, foram incluídas as operações da Telecom Italia no Brasil. No inquérito italiano há grampos ilegais e outras particularidades que poderiam provocar a anulação do inquérito brasileiro – caso fossem juntadas as peças.
Há uma tentativa de misturar os dois inquéritos. Por isso mesmo, toda a luta da PF e do MP é para impedir essa contaminação.
Essa tentativa ficou clara em matéria de Janaína Leite de 24 de julho de 2007 (clique aqui) com o próprio Daniel Dantas, preocupado com a possibilidade dos fundos de pensão fecharem um acordo com o Citigroup que estreitaria sua margem de manobra na Brasil Telecom.
Dois trechos merecem destaque. O primeiro, demonstrando que Dantas atuou pessoalmente para que a atuação da Telecom Italia no Brasil fosse incluída no inquérito italiano.
‘O banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity, enviou à Procuradoria Geral da República um pedido para que o Ministério Público investigue supostos atos ilegais praticados no âmbito da disputa entre os sócios da Brasil Telecom, operadora de telefonia fixa que atende três regiões do país.’
O segundo, ao mencionar uma testemunha-chave importante:
‘A principal testemunha dos procuradores italianos, Marco Bernardini, confirmou à Folha ilegalidades no Brasil.’
Guarde essas duas informações, ambas obtidas da mesma fonte: a atuação de Dantas e o nome da tal testemunha-chave. Facilitará bastante para entender o próximo capítulo, especialmente quando Mainardi menciona suas misteriosas ‘fontes italianas’.
O jogo jornalístico em torno do processo italiano consistiu dos seguintes lances.
Lance 1 – no dia 21 de setembro de 2006, matéria da Janaina Leite na Folha: ‘Polícia italiana prende 20 ligados à Telecom Itália’ (clique aqui), a primeira matéria que saiu por aqui, da operação dos promotores italianos, e tentando mostrar correlação entre o escândalo da Parmalat e o dossiê Kroll, divulgado no Brasil.
‘Três grandes dúvidas ficam em aberto sobre as implicações da ação do Ministério Público italiano, que teria encontrado ligações de organizações que serviram a pagamentos de propinas no `Laziogate´ – escândalo de compra de políticos envolvendo empresas privadas – com os implicados na suposta rede de espionagem italiana.’
No dia 22 de setembro de 2006, nova matéria: ‘Crise com tele leva Prodi a depor no Senado’ (clique aqui). Nela, Janaína afirma o seguinte:
‘Anteontem, 20 pessoas foram presas na Itália acusadas de fazer parte do esquema de arapongagem. Segundo a Folha apurou, é possível que o escândalo respingue no Brasil. Isso porque o encarregado da segurança da Telecom Italia na América Latina, Angelo Janonne, está sendo investigado na esteira de seu chefe, Giuliano Tavaroli, tido como braço direito de Tronchetti Provera.
‘Em 2004, Janonne veio ao Brasil para entregar à Polícia Federal documentos mostrando que a Telecom Italia e integrantes do governo brasileiro vinham sendo espionada pela Kroll, contratada pela Brasil Telecom, então administrada pelo grupo Opportunity, do empresário Daniel Dantas.
‘À época, Janonne disse que as informações que repassava tinham sido entregues anonimamente à Telecom Italia. Mas a desconfiança dos promotores italianos, que têm poder de polícia em seu país, é a de que os dados foram obtidos a partir da atuação de espiões que atuavam, supostamente, com anuência da operadora de telefonia italiana.’
Não informava como obteve informações dos promotores italianos.
Lance 2 – a desembargadora Cecília Melo dá sentença ordenando a anexação de um inquérito no outro. O argumento da desembargadora é justamente a reportagem de Janaína.
Lance 3 – outra matéria da Janaína, agora em reforço à decisão da desembargadora. É de 11 de dezembro de 2006: ‘Justiça pede dados sobre Telecom Italia’ (clique aqui).
‘A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região decidiu ontem, por unanimidade, requisitar oficialmente da Justiça italiana documentos relativos às investigações de suposta espionagem e supostos pagamentos ilegais feitos pela Telecom Italia no Brasil. Os magistrados, baseados em reportagens da Folha, também determinaram que o Ministério Público Federal tome providências para apurar possíveis ilegalidades promovidas pela tele no Brasil. Procurada, a Telecom Italia preferiu não comentar o assunto.’
Lance 4 – Este ano, o Ministério Público e a Polícia Federal convocaram o executivo Rodrigo Bhering Azevedo, que trabalha para o Opportunity. Pressionado, Azevedo admitiu que Janaína o mantinha informado sobre as fontes que alimentavam o jornal de matérias contrárias ao Opportunity. Essas informações constam do inquérito.
A matéria de Janaína traz duas dicas importantes.
A primeira, a reiteração do nome da testemunha-chave:
‘Uma das principais testemunhas do Ministério Público italiano é o ex-investigador Mario Bernardini, que concordou em relatar detalhes dos esquemas engendrados dentro da Telecom Italia em troca de não ser preso. Em entrevista à Folha, ele sustentou o que havia dito aos procuradores: no Brasil, o chefe de segurança da tele ordenou a espionagem de ministros, banqueiros, jornalistas, executivos e concorrentes da Pirelli. Disse ainda que a tele italiana mantinha um esquema de pagamentos a políticos e servidores públicos por meio de advogados e consultores.’
A segunda, a conexão com o senador Heráclito Fortes, reconhecido publicamente como sendo aliado incondicional de Dantas:
‘O assunto não deverá ficar restrito ao Judiciário. A Folha apurou que parlamentares brasileiros também pediram a remessa das informações, inclusive a íntegra dos depoimentos, à Itália. Na semana passada, o senador Heráclito Fortes (PFL-PI) viajou ao país para pedir ajuda a parlamentares.’
Sobre Bernardini analisaremos no capítulo específico sobre o caso Jannone.
Caso Márcia Cunha
Dois magistrados foram fundamentais para apear o Opportunity do controle da Brasil Telecom. Um, a desembargadora Márcia Cunha, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que deu a primeira sentença séria desfavorável a Daniel Dantas. O segundo, o ministro Edson Vidigal, presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Como se recorda, Edson Vidigal foi vítima de um assassinato de reputação praticado pela revista Veja (capítulo ‘O caso Edson Vidigal‘). http://luis.nassif.googlepages.com/ocasoedsonvidigal
Vamos entender a participação de Janaína Leite no ‘assassinato de reputação’ de Márcia Cunha, aproveitando o bom levantamento feito pelo jornalista Fábio Carvalho, em resposta a uma discussão entre blogs sobre um dos capítulos da série.
É uma série de matérias envolvendo a questão do acordo ‘guarda-chuva’, que garantia ao Opportunity o controle da Brasil Telecom.
2/10/2005 – ‘Juíza acusa Opportunity de tentativa de corrupção‘
A Folha publicou denúncia da magistrada que afastou Daniel Dantas do controle da Brasil Telecom. Embora a reportagem não seja assinada, foi produzida pela sucursal do Rio de Janeiro, a partir de notícia publicada por O Globo. A juíza acusa um suposto lobista de Dantas, que teria oferecido propina a seu marido (advogado aposentado, que teria gravado a conversa) para obter decisão favorável na briga contra os fundos de pensão e o Citigroup.
Duas informações são relevantes nessa matéria:
1.
Opportunity disse desconhecer o homem identificado como Eduardo Rascovsky.2.
Segundo a assessoria do Tribunal de Justiça, ‘o Conselho da Magistratura se declarou incompetente’ para examinar os argumentos que o Opportunity ofereceu contra a juíza Márcia Cunha. O caso, portanto, seria levado ao Órgão Especial do TJ.7/10/2005 – ‘Justiça analisa decisão de juíza contra Dantas‘
Cinco dias depois, Janaína Leite é ‘enviada especial’ ao Rio de Janeiro, invadindo um tema que estava sendo coberto pela sucursal do Rio. Provavelmente sob o argumento de que dispunha de informações especiais sobre o caso.
Diz ela:
1.
‘A Folha apurou que’, em setembro, antes das acusações da juíza contra o Opportunity serem publicadas por O Globo (e repercutidas na Folha, através da sucursal do Rio), o Conselho da Magistratura teria decidido, por unanimidade, contra Márcia Cunha.2.
‘Por meio de sua assessoria, o Opportunity negou qualquer tentativa de aproximação com Márcia Cunha e disse que Rascovisky presta serviços ao banco.Fábio anotava as contradições entre as duas matérias:
**
No dia 2, a assessoria do TJ/RJ informou que o Conselho da Magistratura havia se declarado INCOMPETENTE para analisar a reclamação do Opportunity. Ouvida, a defesa do banco disse DESCONHECER Eduardo Rascovsy.**
No dia 7, Janaína Leite informa DECISÃO UNÂNIME do Conselho da Magistratura, tomada no mês anterior. Já o Opportunity disse que Eduardo Rascovsky ‘presta serviços para o banco’ em sua matéria. A retificação era importante porque, conforme se vê no capítulo ‘A imprensa e o estilo Dantas‘ havia reuniões freqüentes entre Rascovisky e o principal homem de Dantas para a disputa, Humberto Braz. A afirmação poderia ser facilmente desmascarada.Janaína aproveitava para levantar um conjunto de insinuações contra a juíza, no mesmo estilo ‘dossiê’ aplicado pela Veja no caso Edson Vidigal. ‘Não é a primeira vez que Márcia Cunha sofre questionamentos administrativos. A primeira foi no início dos anos 1990 e envolvia tentativa de fraude fiscal. A juíza também foi alvo de críticas por aceitar passagens de cortesia da Varig quando julgava processos envolvendo a companhia aérea’, escreve a repórter.
Na entrevista com a desembargadora, fica nítida a intenção de Janaína de utilizar as perguntas para fabricar insinuações.
‘Magistrada vê tentativa de desmoralização (clique aqui)
A juíza Márcia Cunha disse considerar ‘ofensivo’ qualquer questionamento sobre quem é o autor da sentença assinada por ela que favoreceu os fundos de pensão na briga pela Brasil Telecom. Leia a seguir trechos da entrevista concedida à Folha ontem.
Folha – A sra. foi a autora da sentença contra o Opportunity?
Márcia Cunha – Essa pergunta chega a ser ofensiva. Por sorte, tenho testemunhas que me viram escrevendo. É uma tentativa de desmoralização.
Folha – O texto é muito diferente dos padrões das suas decisões anteriores. Por quê?
Márcia – É um processo complexo, com 18 volumes.
Folha – A decisão saiu em poucos dias. A sra. leu tudo?
Márcia – Claro, eu tinha lido o processo há mais tempo porque dei outras decisões, inclusive favoráveis ao Opportunity.
Folha – A sra. disse que houve uma tentativa de corrupção por intermédio do seu marido. Por que não colocou isso por escrito na sua defesa?
Márcia – Como a senhora sabe disso? Não posso dizer, é algo de maturação sigilosa.
Folha – Mas a sua defesa é pública. E por que denunciar só agora, pela imprensa?
Márcia – Existem coisas que só podemos dizer quando há provas. Naquela época não tinha provas. Só vim a público porque o Opportunity estava distribuindo dossiês contra mim nas redações de jornais, com coisas falsas.
Folha – Na entrevista a O Globo a sra. falou que tinha fitas mostrando o diálogo. Houve outras conversas com seu marido?
Márcia – Não vou falar sobre isso. Ir contra os interesses deles expôs meu nome, sai uma coisa torta no jornal e eu nunca mais recupero a idoneidade.
Folha – A sra. comprou um apartamento de quatro quartos em Ipanema pouco depois de dar a sentença?
Márcia – Meu Deus, que absurdo! Eu moro de aluguel.
Folha – A sra. mudou quando?
Márcia – Em maio. Aluguei de um casal de velhinhos.
Folha – A sra. ganhou passagens da Varig?
Márcia – A assessoria do tribunal já esclareceu esse assunto. Não vou falar sobre isso.
Folha – A sra. foi a Nova York por conta própria?
Márcia – Para Nova York? Eu fui para os Estados Unidos em uma viagem pessoal em maio e só passei uma noite em Nova York. Fui acompanhar uma pessoa doente. Quem pagou foi ela.
Folha – Casos envolvendo a sra. já foram enviados ao Órgão Especial antes?
Márcia – Não. Tudo isso não passa de uma enorme mentira para macular meu nome.’
A entrevista fala por si, uma devassa implacável na vida pessoal da juíza, deixando toneladas de insinuações no ar.
05/11/2005: ‘Juíza acusada pelo Opportunity é inocentada em processo no TJ’ (clique aqui)
A matéria não é mais de Janaína, mas da repórter da Sucursal do Rio, Luciana Brafman, que informa que a 8ª Câmara Cível do TJ/RJ julgou improcedente ação que o Opportunity pedia o impedimento da juíza Márcia Cunha. Uma filha da magistrada seria estagiária num escritório que representava os fundos de pensão. Os desembargadores entenderam que a decisão de Márcia Cunha era ‘imparcial’. Ainda estava pendente a manifestação do Órgão Especial do TJ/RJ.
04/03/2006 – ‘Juíza se afasta de casos com o Opportunity’ (clique aqui)
Márcia Cunha disse não ter condições de ‘enfrentar tamanho poderio econômico’ e declara a própria suspeição no caso. Afasta-se. Em matéria assinada por Elvira Lobato e Pedro Soares, da sucursal do Rio, informa-se que ela teria sido vítima de boatos, entre eles o de que teria sido corrompida e ‘comprado um apartamento em Ipanema’. A decisão de suspender o acordo guarda-chuva, diz a reportagem, ‘foi mantida em segunda instância pelo Tribunal de Justiça do Rio’. O objetivo do ‘assassinato de reputação’ fora alcançado.
09/04/2006 – ‘Sócios voltam a negociar controle da BrT’ (clique aqui)
Nova matéria de Janaína Leite, insistindo na desqualificação da desembargadora.
‘(…) O acordo `guarda-chuva´ está suspenso, mas há uma chance de ser restabelecido na próxima terça-feira. Se isso acontecer, o Opportunity poderia reassumir, mesmo que temporariamente, o controle da BrT, interferindo no rumo das negociações.
‘O acordo `guarda-chuva´ pode voltar a valer porque a liminar que o suspendeu está sendo questionada. A liminar foi assinada pela juíza Márcia Cunha, da 2ª Vara Empresarial fluminense. O Ministério Público e o Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, porém, consideraram indícios de que a sentença não foi escrita por ela.
‘(…) A juíza se defendeu das suspeitas e negou a participação de terceiros na elaboração da liminar. No mês passado, afastou-se do caso BrT. Julgou-se impedida de emitir novas opiniões sobre o acordo `guarda-chuva´.
Segundo Márcia Cunha, a decisão foi motivada porque ela não tem forças para enfrentar o Opportunity. Acusou o grupo de disseminar calúnias, fazer ameaças a familiares e tentar corrompê-la.
‘As acusações da juíza não encontraram respaldo do Ministério Público e da polícia. Ambos consideraram não existir provas contra o Opportunity.’
05/05/2006 – ‘Juíza é inocentada de acusação do Opportunity’ (clique aqui).
Elvira Lobato informa que o Órgão Especial do TJ/RJ inocentou a juíza Márcia Cunha.
‘Ontem, ao ser procurada pela Folha, limitou-se dizer que estava `de alma lavada´ com a decisão do Órgão Especial do tribunal.’
Nenhuma manifestação de Janaína. Nem ao menos um ‘Erramos’ da Folha. O ‘assassinato de reputação’ já tinha produzido os resultados esperados e novas batalhas estavam a caminho.
O caso Lewis Kaplan
As reportagens sobre o contrato ‘guarda-chuva’ não terminam aí. Na seqüência ocorre o impensável. Janaína produz um conjunto de matérias manipuladas, que são utilizadas no julgamento do acordo ‘guarda-chuva’ em Nova York, tentando influenciar o juiz Lewis Kaplan.
No final, os advogados do Citigroup denunciam a manipulação feita pela imprensa. A denúncia sai em reportagem da própria correspondente da Folha em Nova York.
11/05/2006 – ‘Grupo Opportunity acusa PT de persegui-lo por negar propina’ (clique aqui)
Janaína Leite informa que o Opportunity remeteu carta à Justiça nos Estados Unidos. O documento acusa o PT de ter pedido propina, em 2002 e em 2003, de ‘dezenas de milhões de dólares’.
12/05/2006 – ‘Opportunity insinua que Lula pressionou Citi contra Dantas’ (clique aqui)
Matéria de Janaína Leite e Leila Suwwan (de Nova York). A matéria contém acusações pesadas:
‘Correspondência interna trocada entre executivos do Citigroup sustenta que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva interferiu em favor dos fundos de pensão e contra o Opportunity na disputa pela Brasil Telecom.
‘No dia 26 de abril passado, um advogado do Opportunity se referiu a essa suposta pressão do presidente ao se dirigir ao juiz Lewis Kaplan, da Corte de Nova York, responsável pelo litígio entre o grupo do banqueiro brasileiro Daniel Dantas e o Citigroup.’
A matéria é maliciosa. Coloca como se fosse de Gustavo Marin, presidente do Citibank Brasil, a afirmação de que o governo brasileiro tem interesses comerciais e odeia Daniel Dantas. É preciso ler com cuidado para entender que a frase é do advogado do Opportunity:
‘Há interesses comerciais, conforme explicado por Gustavo Marín, presidente do Citibank Brasil, da Brasil Telecom, e reportados do seu encontro com o presidente do Brasil: o governo do Brasil odeia Daniel Dantas. É o que ele [Marín] disse. `Eles têm muito mais interesse em fazer transações com o Brasil do que qualquer coisa que possa acontecer com este investimento em particular´, argumentou Philip Korologos, advogado do Opportunity.’
19/05/2006 – ‘Opportunity desinforma mídia, diz Citi’ (clique aqui).
Leila Suwwan, de Nova York, agora em matéria sem a parceria de Janaína, informa que o Citi acusa o Opportunity de promover uma campanha de desinformação na imprensa brasileira utilizando citações incorretas dos autos e provas secretas contidas na Corte norte-americana.
‘Ontem, o advogado do Opportunity tentou novamente envolver `executivos do mais alto nível do Citigroup´ e membros do governo brasileiro numa espécie de conluio contra seu cliente. As provas do processo -série de documentos requisitados de ambos os bancos, inclusive e-mails de seus diretores- estão guardados sob segredo de Justiça, mas o resto do litígio é público.
‘Quando possível, em cartas ao juiz Lewis Kaplan ou em audiências abertas, os advogados do Opportunity fazem menção ou detalham essas provas, cujo conteúdo não pode ser verificado. Em dois casos recentes, essa técnica foi utilizada para acusar o PT de uma tentativa de achaque de dezenas de milhões de dólares do Opportunity e para acusar o presidente Lula de ter se envolvido pessoalmente para pressionar o Citi contra Dantas.
‘(…) Desta vez, o Citi retrucou. Apontou para a presença de jornalistas brasileiros e acusou: `O juiz deve se perguntar porque o advogado do Opportunity gosta de ficar citando executivos graduados do banco. É porque está promovendo uma campanha de imprensa na qual cita equivocadamente os autos e os documentos secretos deste processo’.
‘Com isso, o juiz Lewis Kaplan, irritado, encerrou a discussão. Concedeu uma liminar que protege o Citi de processo do Opportunity no Brasil até o dia 2 de junho e exortou ambos os grupos a considerar uma solução financeira arbitrada. `Isto já está ficando cansativo e problemático´, disse Kaplan. Antes, havia se queixado de que seu tribunal não é dedicado à deliberação de liminares contra Daniel Dantas.’
Faltou à correspondente da Folha dizer o nome da jornalista que mais praticou esse tipo de jogo: sua própria colega Janaína Leite.
Caso Orascom
Em 2005, com a mediação de Naji Nahas, Daniel Dantas havia acertado com Tronchetti Provera (que então controlava a Telecom Italia) o pagamento de US$ 300 milhões pelas ações que possuía na Brasil Telecom.
Fundos de pensão e o Citigroup impediram o acordo. O Citigroup conseguiu com o juiz Lewis Kaplan, em Nova York, o embargo da venda das ações de Dantas. O receio do Citi é que, no meio da negociação, o Opportunity acabasse vendendo os direitos de uso sobre o contrato guarda-chuva que garantia ao Opportunity o controle da Brasil Telecom, mesmo tendo parcela ínfima do seu capital.
Kaplan concordou com o argumento do Citi. A partir de 7 de junho de 2005, Dantas ficou impedido de efetuar qualquer transação com as ações.
No dia 28 de fevereiro de 2007, Daniel Dantas e o Opportunity solicitaram ao juiz Kaplan que flexibilizasse a determinação. A alegação de Dantas era que pretendia negociá-las com o grupo de telefonia egípcio Orascom, e (de acordo com ofício assinado por ele próprio).
‘…isto (a restrição colocada por Kaplan) se tornou um problema por conta da aproximação entre Opportunity e Orascom (…), um investidor que busca negociar a participação do Opportunity na Brasil Telecom’.
O Citi havia alertado que, sem o bloqueio, Dantas poderia vender sua parte para terceiros. A estratégia de Dantas era convencer o juiz que a proposta de compra seria estendida a todos os sócios. Nesse caso, com o bloqueio ele seria prejudicado.
No pedido ao juiz, assinado pelo próprio Daniel Dantas, o Opportunity afirmava que ‘a Orascom procurou o Citibank para adquirir as ações do CVC Fund na Brasil Telecom.O Opportunity afirmava que a Orascom também estaria fazendo uma oferta pela parte da Telecom Italia.
Dois dias depois, no dia 2 de março de 2007, saiu matéria na Folha, com a notícia das investidas da egípcia Orascom Telecom. A matéria era de Janaína Leite (clique aqui):
‘A Orascom Telecom -braço do maior conglomerado egípcio- quer comprar o controle da Brasil Telecom (BrT), tele que é alvo da maior disputa societária da história do país.
‘A Folha apurou que a Orascom apresentou proposta nesta semana pelas ações em poder dos quatro sócios majoritários da empresa: Citigroup, fundos de pensão, Telecom Italia e Opportunity. (…)
‘(…) A Folha apurou que a proposta da Orascom pela parte do Citi e dos fundos de pensão na BrT os pegou de surpresa.’
A notícia era falsa. O genérico ‘a Folha apurou’ ajudava a esconder as fontes. Nem o Citi nem os fundos tinham recebido proposta alguma. E seria impossível o Citi receber a proposta isoladamente devido ao acordo firmado com os fundos, que obrigava a ambos apresentarem propostas conjuntas de venda, se aparecessem candidatos.
No dia seguinte, nova matéria de Janaína insistindo no tema (clique aqui). Dizia a matéria:
‘O presidente da operadora egípcia OrascoTelecom, Naguib Sawiris, confirmou ontem a intenção de comprar a Brasil Telecom, como antecipou ontem a Folha.
‘(…) Naguib Sawiris afirmou que a Orascom fez só uma oferta -aos italianos – pela Brasil Telecom. Mas a Folha apurou que a empresa fez propostas verbais a outros sócios da Telecom Italia no bloco de controle da Brasil Telecom: Citigroup, fundos de pensão e Opportunity. Todos foram procurados nesta semana.
Os diálogos incluíram ainda a fatia que o Citi e os fundos detêm na Telemar e na Telemig.’
Ou seja, o próprio Naguib preocupou-se em desmentir a notícia da Folha, mas não adiantou. Segundo Janaína, ‘a Folha apurou que a empresa fez propostas verbais a outros sócios’.
Na época, Janaina ainda não havia sido identificada como repórter ligada a Dantas. Essa matéria foi o primeiro sinal de alerta sobre as reportagens estranhas que conseguia emplacar na Folha.
No dia 22 de março de 2007, o informativo Teletime colocaria o ponto final a esse movimento:
‘Fonte qualificada próxima ao Citibank e aos fundos de pensão volta a afirmar a este noticiário: não passa de um movimento sincronizado com os interesses do especulador Naji Nahas e do Opportunity (…) Segundo a fonte, não existe nenhuma negociação ou oferta neste sentido. Citibank e Orascom têm negócios de outras naturezas, e naturalmente conversam, mas não há oferta. Até porque, qualquer oferta teria obrigatoriamente que ser feita em conjunto também aos fundos de pensão por força contratual, o que não aconteceu.’
O caso do dossiê Itália
São apenas alguns dos exemplos colhidos, de como se pode infiltrar uma jornalista em uma redação e conseguir, através do esquema dos dossiês, falsos, parcialmente verdadeiros, ou verdadeiros, direcionar o noticiário para as questões judiciais.
É isso o que veremos no próximo capítulo, que falará sobre o caso Angelo Jannone, e permitirá juntar as peças que revelam a ação conjunta dos dois jornalistas que mais praticaram esse lobby: Diogo Mainardi, com conhecimento de seus diretores; Janaína Leite, provavelmente valendo-se da falta de filtros de seu jornal.