Qualquer um que tenha assistido ao Jornal Nacional na segunda-feira (15/4) após a tensa eleição presidencial na Venezuela, vencida pelo chavista Nicolás Maduro por estreita margem, teria a impressão, senão a certeza, de que Maduro é que teria saído derrotado. Capriles deveria ter vencido de alguma forma, ou mesmo venceu, ainda que não tenha levado. A diferença de votos entre Maduro e Capriles foi de pouco mais de 200 mil votos, uma diferença minúscula, mas semelhante, por exemplo, à vitória de Barack Obama e maior que a de George W. Bush em 2000 – esta última com inúmeras denúncias de fraude.
Por sua vez, organismos internacionais – a ONU, e mesmo instituições dos EUA – reconheceram e garantiram a lisura do processo, desmentindo as acusações perigosas e com cheiro de golpismo da oposição capitaneada por Capriles, que se recusa a reconhecer o resultado e convocou seus eleitores a sair às ruas e desestabilizar o país. Demétrio Magnoli, por sua vez, no Jornal das Dez, da Globonews, criticou a suposta falta de legitimidade dos chavistas após uma vitória apertada, mas este mesmo analista jamais criticou ou encontrou problemas com a legitimidade de Bush ou Obama ou de qualquer outro governante que não fosse ideologicamente contrário aos interesses dele e da Rede Globo e das elites brasileiras, amigas das elites venezuelanas. Se 2% de diferença em uma eleição torna um governo ilegítimo, então uma parte significativa do mundo “democrático” está em sérios problemas.
Em ambos os casos temos exemplos de um jornalismo venal, tendencioso, interessado apenas em passar as impressões de seus patrões, escondendo os verdadeiros fatos. É um jogo francamente de direita, conservador, de uma elite que teme a disseminação de um modelo que pode pôr a perigo seus interesses.
Jornalismo típico
Não que o chavismo não seja digno de críticas, pelo contrário. O grande problema do chavismo é, em si, o chavismo, ou seja, o culto à personalidade de um líder, e não a força de um movimento político organizado. E a eleição última, com a vitória apertada de Maduro sobre Capriles (51% a 49% arredondados), é a prova de que o povo votava em Chávez, mas não na ideologia chavista. Votavam no líder, se identificavam com o líder, mas não com sua base institucional/ideológica.
Mesmo com todos os problemas que o país ainda enfrentava, o povo via em Chávez o líder que resolveria os problemas. Maduro não é Chávez, e isto resume muita coisa. Em 2007, quando Chávez ganhou seu referendo com 50% dos votos ele disse, textualmente, que era um “triunfo de mierda”. Ele sabia que o país estaria dividido e que seria difícil governar.
A questão central aqui, porém, é a de compreender o papel do jornalismo em criar ou dar sustentação a uma ideologia contrária aos interesses populares, contrária aos interesses de quem efetivamente participou ou teria direito a participar do processo eleitoral. Dá forças ao golpismo, às dúvidas infundadas e serve como propaganda. Ao invés de informar, desinforma e desagrega. É este tipo de jornalismo (sic) tão típico do Brasil, mas compartilhado por elites midiáticas por toda a América Latina, que a cada dia perde mais e mais a confiança popular. Circulação de jornais diminui, Ibope de telejornais diminui – não é de graça.
Propaganda institucional
A crise do Estadão, por exemplo, não é fruto de apenas má administração – diversos jornais pelo mundo não fecham ou decidem apenas circular online por má administração –, mas pela crise do jornalismo que passa por sua credibilidade em muitos casos.
Com a internet a população tem condições de buscar o contraditório ou mesmo melhores informações; não depende mais da grande mídia e não precisa se fiar apenas no que o Jornal Nacional apresenta. Já passou da hora de se repensar o jornalismo, mas enquanto os veículos brasileiros estiverem nas mãos de meia dúzia de famílias com interesses absolutamente opostos aos do povo, continuaremos a testemunhar mais e mais casos de manipulação, como o atual contra os interesses da Venezuela.
E, vale lembrar, tudo isto com pesados investimentos via propaganda institucional por parte do governo do PT, cujos apoiadores se dizem – pasmem! – atacados pela mesma mídia que financiam.
******
Raphael Tsavkko Garcia é mestre em Comunicação