Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

As contradições de Marco Feliciano

Na quinta-feira (18/4), o jornalista Amaury Jr. entrevistou em seu programa o controverso deputado federal Marco Feliciano. Pastor da igreja Assembleia de Deus e presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal, Feliciano é conhecido por suas declarações polêmicas sobre negros, homossexuais e mulheres. Segundo o religioso, os africanos descendem de um ancestral amaldiçoado por Noé, a união homoafetiva é um risco para a sobrevivência da sociedade brasileira e o direito de igualdade das mulheres no mercado de trabalho consiste em uma maneira sutil de atingir a família. Diante dessas explanações, não é por acaso que ativistas sociais acusam o deputado pastor de assumir publicamente posições racistas, homofóbicas e misóginas.

Entretanto, como qualquer cidadão que vive em um Estado democrático, Feliciano tem o amplo direito de apresentar a sua versão dos fatos. Desse modo, o Amaury Jr. Show, exibido pela Rede TV!, foi um excelente ensejo para o deputado federal se defender das acusações a ele direcionadas. No início do programa, ao ser interpelado sobre o grande número de manifestações contrárias às suas convicções, Feliciano assegurou não ter preconceitos e que a maioria das pessoas distorce as suas colocações. “Estou sendo vítima de preconceito religioso. Pessoas maldosas colocam palavras na minha boca. Essa história de racismo, pinçaram uma palavra minha no meio de uma discussão que eu estava tendo só para me rotular e me colocar contra a grande massa brasileira.”

Todavia, o pastor, baseado em argumentos bíblicos, manteve seu posicionamento a respeito da suposta ancestralidade maldita dos africanos.

Pregações contra gays

Para Marcos Feliciano, as pessoas que “afrontam a Deus” são severamente punidas. “A Bíblia diz ‘de Deus ninguém zomba’. O capitão do Titanic disse que nem Deus afundaria aquele barco e, por ironia do destino, afundou.” Ora, a título de exemplo, Richard Dawkins, principal nome do ateísmo mundial, é muito bem sucedido profissionalmente e se encontra em pleno desenvolvimento de suas atividades intelectuais aos 72 anos. Pelo que a realidade nos mostra, ele não recebeu o “castigo divino”.

Por outro lado, sobre o vídeo que circula no YouTube em que aconselha a um fiel doar seu cartão de crédito e a senha para a igreja, Feliciano destacou que o Velho Testamento diz que todos aqueles que servem a Deus são prósperos e que, no Novo Testamento, Jesus diz que “aquele que oferta recebe”. “A imprensa e a mídia tentam me crucificar. Esse vídeo [no YouTube] foi editado, foi uma brincadeira [com o dono do cartão]. Estamos vivendo no mundo moderno, daqui a uns dias todas as igrejas vão ter cartão de crédito”, asseverou o pastor deputado.

Já em relação às acusações de preconceito contra homossexuais, Feliciano apontou que somente é homofóbico quem pratica violência física ou assassinato contra gays e lésbicas. “O que eu tenho é posicionamento. Eu sou contra o casamento gay por princípios. A Bíblia diz que isso é errado. A homossexualidade é um fenômeno comportamental, pois não é natural.” Ou seja, para o religioso pregações contra gays e lésbicas não são ações homofóbicas, mas liberdade de expressão. Sendo assim, a homofobia só é caracterizada quando ocorre ato físico (como se discursos odiosos como os que ele profere não pudessem incentivar agressões a essa minoria).

Posições preconceituosas

Por fim, Marco Feliciano acredita que a enorme campanha nacional contra a sua permanência na presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal nada mais é do que uma forma de escamotear os principais problemas do país: “Estão me usando como bode expiatório. Estão me usando como grande cortina de fumaça porque durante quarenta dias o Brasil parou. Ninguém falou de economia, ninguém falou de mensalão, das coisas que acontecem no Senado, nas coisas que acontecem na Câmara Federal.”

Em suma, o que se pôde constatar ao longo da entrevista do deputado federal Marco Feliciano foi um indivíduo com colocações equivocadas e que se apoia em uma pseudo-infalibilidade bíblica para justificar posições extremamente preconceituosas. Portanto, a intensa mobilização nacional pela saída de Feliciano da presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal é uma das reivindicações mais importante dos dias hodiernos.

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Francisco Fernandes Ladeira é especialista em Ciências Humanas, Brasil: Estado e Sociedade pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e professor de Geografia em Barbacena, MG