Ao longo dos últimos seis meses a crise aérea foi trocando de nome, de dimensão e de características. Como a sociedade brasileira precisa de grifes, etiquetas e apelidos para conseguir digerir e relacionar tudo o que lhe é mostrado na mídia, inventou-se a expressão ‘apagão aéreo’ para lembrar o ‘apagão elétrico’ do segundo mandato de FHC.
Com a incrível sucessão de panes no sistema de controle do tráfego aéreo, o conceito de ‘apagão’ tornou-se insuficiente, substituído por caos. A desastrada politização da tragédia com o Boeing da Gol não poderia deixar de produzir seqüelas.
O agravamento progressivo da situação nos aeroportos levou a oposição a exigir uma CPI, o governo não aceitou, o assunto foi para o Supremo Tribunal Federal – que já se pronunciou uma vez e logo se manifestará definitivamente.
Enquanto isso, o motim dos controladores de tráfego aéreo transforma-se numa crise na Aeronáutica com desdobramentos para terrenos há muito considerados baldios.
Apertar os cintos
Os jornais dos últimos dias ofereceram extensas coberturas com o simplismo de sempre (estatísticas oficiais dos atrasos do dia anterior, fotos de passageiros dormindo ou desesperados etc., etc.). O Jornal Nacional de segunda-feira (2/4) avançou com muita cautela pelo terreno institucional. O que está cada vez mais evidente no noticiário é o malabarismo para contornar a questão crucial: qual a relação efetiva entre a tragédia do dia 29 de setembro de 2006 e esta bola que vem rolando e crescendo com uma velocidade extraordinária?
Por que razão os controladores brasilienses não se manifestaram sobre as péssimas condições de trabalho antes da colisão que matou 154 pessoas e enlutou tantas famílias? Sentiram-se parcialmente culpados? Por que razão não mencionam este desconforto agora? E por que razão a Polícia Federal determinou o indiciamento dos pilotos americanos e a Aeronáutica não conseguiu produzir, seis meses depois, qualquer parecer sobre as demais causas do acidente?
Um problema começa a ser solucionado quando é formulado com clareza. Uma crise começa a se desfazer quando seus contornos são devidamente expostos.
Além de vitimizada de forma injusta e cruel ao longo de um semestre, a sociedade brasileira está sendo tratada por todas as partes – a mídia inclusive – como se fosse imbecil, incapaz de avaliar corretamente o que está acontecendo. Quando ela começar a entender talvez seja necessário apertar os cintos.