Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mais do mesmo nos jornais

Passado um mês das mudanças que encolheram o Estado de S. Paulo, e um ano e meio depois de a Folha de S. Paulo ter passado pelo mesmo processo, os dois principais diários paulistas deixam mais claro o movimento que parece ter como objetivo ocupar o espaço deixado pelo recuo das revistas semanais de informação.

Na semana passada, o projeto Inter-Meios, que acompanha os investimentos em publicidade, revelou que as revistas perderam o terceiro lugar para os meios digitais no primeiro bimestre deste ano, não considerados os buscadores e as redes sociais. Os jornais seguem em segundo lugar, atrás das emissoras de TV aberta, mas de modo geral os meios tradicionais vêm perdendo espaço, com exceção da televisão, principalmente a TV por assinatura, que se beneficia da expansão da nova classe de renda média nas grandes cidades.

Alguns analistas observam que pode haver novas turbulências no setor ainda neste semestre, pelo fato de os principais veículos da internet terem começado a pagar bônus por volume de veiculação, o que deverá atrair ainda mais gestores de grandes orçamentos para os meios digitais. Essa artimanha, um dos segredos da liderança do grupo Globo,pode produzir muita distorção no mercado, principalmente porque os métodos para mensurar a eficiência dos anúncios são imprecisos e deixam muito espaço para subjetividades e para o discurso manipulador das agências de publicidade.

As agências também perderam faturamento no primeiro bimestre e enfrentam o desafio de manter os grandes volumes de receita diante do encolhimento da mídia em geral e da pulverização da audiência na internet. Os números induzem a projetar um cenário desastroso para os meios impressos nos próximos anos. Essa tendência, verificada em praticamente todo o mundo, é reforçada no Brasil, onde as redes sociais crescem exponencialmente desde o advento do Orkut.

Há projeções de crescimento da publicidade digital superiores a 25%, enquanto os números mais otimistas para a mídia impressa não passam de 3,5%, com crescente vantagem dos jornais em relação às revistas.

Onde está o leitor?

O recente movimento dos principais jornais, de reorganizar os temas e reduzir o número de cadernos durante a semana, tem o propósito declarado de oferecer uma leitura mais compacta durante os dias úteis e apostar na disputa do leitor nos sábados e domingos.

A propaganda do Estado de S. Paulo, veiculada na semana passada para anunciar seu encolhimento e tentar convencer o leitor de que menos conteúdo vale mais, tinha esse tom, que na verdade induz a enxergar o jornal como um veículo semanal com boletins diários. Acontece que, na segunda semana de operação com edições mais magras nos dias úteis, as edições dominicais ainda não mostraram vigor suficiente para garantir a atenção do leitor.

O Estado repete o fracasso da Folha, que, passados dezoito meses da reforma, ainda não conseguiu produzir edições mais vibrantes nos finais de semana. O desastre só não é total porque as principais revistas semanais de informação seguem oferecendo mais do mesmo conteúdo e não parecem capazes de surpreender o mercado.

Registre-se também a mudança no desenho da CartaCapital, mas ainda é cedo para verificar se a revista que se desvia da matriz hegemônica da imprensa brasileira terá recursos para evitar o que parece ser o destino comum das publicações de papel.

No domingo (5/5), o Estado apostou num levantamento sobre o aumento do número de prisões por corrupção, a Folha investiu em reportagem sobre o déficit do turismo no Brasil e o Globo abordou os dez anos do Bolsa Família. Apenas o Globo foi capaz de produzir um conteúdo alentado, de mais de duas páginas, com um texto que se aproxima daquilo que os jornalistas chamam de “estilo revisteiro”.

O cenário revela uma circunstância difícil para a imprensa, que não se explica apenas pelo crescimento vertiginoso das mídias digitais. Além do desafio criado pela tecnologia, os meios tradicionais pagam o preço da falta de planejamento naquilo que era essencial: o desenvolvimento do hábito de leitura.

Jornais e revistas não trataram de valorizar nas novas gerações das famílias tradicionais das classes médias urbanas o hábito da reflexão, que sempre foi o fator de estimulação da leitura. Em vez de leitores críticos, preferiram criar correligionários passivos e acríticos. Para esses, basta uma telinha.