Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A crise é dos gigantes

O jornalismo é uma profissão que exige um pouquinho de leitura do jornalista. É quase um bordão: jornalista, para escrever bem, tem que ler. O problema é que o conhecimento machuca as ideias e o leitor se vê diante de três opções para a vida: ser bonzinho e lutar pelo coletivo; ser individualista e se aproximar do poder; não fazer nada e só falar algo quando sentir vontade ou for convidado.

Os jornalistas dividem-se entre a primeira e a segunda opção e a terceira é escolha comum das pessoas simples: motoristas de ônibus, cobradores, pintores, empregadas domésticas, enfermeiras, jogadores de futebol e a quem mais o chapéu servir e a consciência incomodar com essa leitura.

A história costuma preservar aqueles que escrevem com a sabedoria dos anciões e o tesão e aventureirismo dos mais novos. Esses dois ingredientes atrelados ao amor incondicional pelo ofício e à dedicação de uma mãe e pronto, mais cedo ou mais tarde o mundo há de reconhecer a qualidade do comunicador. O talento? A dedicação tratará de desenvolvê-lo.

Posição submissa

Os dias de hoje trouxeram à tona uma série de novos problemas. Nada mal, eis o objeto dos comunicadores, que têm o dever de narrar os fatos e, se muitos problemas existem, não faltarão manchetes. O jornalismo pode não dizer, mas historicamente o homem sabe livrar-se de seus problemas. No fim, todos descansam à noite, alguns ainda usufruem de uma excelente relação conjugal. Mais próximo ainda do fim, parece que tudo aqui é mesmo atoa porque depois a morte nos abate implacável. É mentira!

A história sabe preservar obras e carregá-las para muito além do tempo em que ela se deu. Invariavelmente recorremos aos diversos cânones preservados pela nossa memória para lembrar o que foi o passado e para pisar com segurança no presente. Buscamos Marx, revivemos o drama de Nietzche, espiamos um tal de Foucault e apreciamos Da Vinci, Picasso e uma centelha de outros gênios.

É assim. Aprendemos a ouvir, ler e olhar para o passado. Aprender com as lições dos mais velhos. É um hábito que adquirimos na fase inicial da vida, lá na escola. Nela, passamos a aceitar essa posição submissa e inferior de aprendizes. E quem se rebela, logo é desprezado e convidado à sala da direção para um conversa muito séria. “Se não mudar, chamaremos seus pais!” Quanto pavor.

Povão e elites

Mas e quando aqueles de quem mais esperamos ouvir conselhos e soluções também não sabem o que fazer? Os professores desistiram, querem somente salários mais altos. Os políticos não são muito diferentes. Eles já têm altos salários e não querem perder o poder. E os jornalistas, ah! os jornalistas, esses vão na onda. Ora são como os professores, insatisfeitos e desiludidos, ora parecem políticos a derrubar um e outro chefão do poder.

E são muitas as vozes do jornalismo. O Brasil é rico em notícia para os prós e para os contras. Temos Veja, que quer derrubar o governo petista a todo custo e do outro lado CartaCapital, que se diz crítica, mas que é a favor do governo. E o PT, inabalável e incólume, perdeu a chance de representar os mais pobres. Diminuiu diferenças sociais, é verdade, mas não conseguiu impedir que facínoras mal intencionados (quanta redundância) guardassem indevidamente muito dinheiro no próprio bolso.

Do conforto de suas casas, a população, agora, só assiste às últimas notícias do Jornal Nacional. Não porque estão interessadíssimos nas notícias da catastrófica seleção brasileira, que Deus a tenha, mas porque não pretendem perder o próximo capítulo das tramas novelísticas. Então, é mesmo assim: os jornalistas do povão e das elites seguem escrevendo notícias e quem deveria lê-las, caprichosamente prefere desprezá-las. Eis a crise!

Baboseiras e fofocas

Sem que um número considerável de pessoas se demonstre insatisfeita não há mudança. Seria notável que alguém debatesse: mas há greves por todos os cantos, manifestações, campanhas no Facebook. Insistiria este autor como um menino birrento: esse é o coro dos individualistas. Querem aumentar seus salários, fumar maconha, transar com quem bem entendem, enfim, lutam para satisfazer alguma vontade subjetiva. Parecem coletivos, mas são desprezíveis perante os que sofrem calados, inertes. E quem nessa condição está, não sofre muito porque usa uma competente peneira que esconde o sol de problemas.

Eis a crise. Mais e mais pessoas desistem de acompanhar a narrativa dos problemas sociais, a corrupção inacabável dos políticos, a falta de educação, a tragédia da seleção brasileira, os inelegíveis números e índices da economia. Essa é a crise dos gigantes. Esses são alguns dos motivos, que levaram os jornalões para o declínio e o desespero. O leitor cansou. As cidades estão cada vez mais abarrotadas de pessoas. As redações caminham na direção contrária e são enxugadas, encolhidas, espremidas. Empobrecidas de talentoso e o talento não acabou. É exercido numa tal piauí, anos atrás por um tal Pasquim. O talento sempre achará meios para se manifestar.

A solução para os demais jornalistas que não viveram os tempos do Pasquim e não podem abarrotar as estações de trabalho da piauí é a vontade própria. O empreendorismo, a criatividade, a coragem, o sonho, o brilho, a sabedoria dos velhos e o vigor dos novos. O problema é de quem já ganhou muito dinheiro comunicando e que hoje se afunda na história escrevendo baboseiras e fofocas sobre os artistas badalados, ou lamentando a lesão de um jogador de futebol. O Google Analytics, desgraçado, mostrou que essas notícias dão muito acesso e com grande audiência, ufa, o dinheiro entra.

Brincando de ser humano

O romantismo está em tantos lugares. Ainda não consigo dizer se isso é bom ou ruim, mas percebo-o em vários cantos, espalhado, mas ainda não consolidado e preservado. São muitos sites que publicam o talento dos inquietos e que vencem a incompetência e a frieza da grande mídia. São pancadas de qualidade que muitos Davis propiciam a esses Golias desesperados. A audiência desses sítios eletrônicos nanicos, entretanto, é fajuta. Acalenta-me o fato de que sempre que procuro, encontro um deles na imensidão da internet. Esses belos textos, são como bolhas que emergem do sopro de uma criança e de seu brinquedo, e depois de vistas por quem está ali perto, estouram, somem, afetando apenas os mais próximos. Outro sopro e novas bolhas a explodir. Essas bolhas são insuficientes, mas quem as lança ao ar, é porque insiste e acredita no ofício. Dom Quixote faria o mesmo.

Conforta-me a grande crise. Os donos de jornais e revistas morrem ao ver o declínio do faturamento e a redução de seus sonhos impressos abatidos pela engenhosidade dos wwws. O problema deles é imensurável. Quando pensam em falar com independência, os políticos gritam: regulamentação da mídia. Não deve ser fácil comandar um conglomerado de comunicação. No Brasil, só me recordo de um figurão que ousou escrever uma autobiografia como barão da imprensa. Foi ele Samuel Wainer. E o pobre acaba derrotado, cansado, sem seu jornal.

Os problemas do homem servem para mostrar suas fraquezas. Os desafios para tentar derrubá-lo. Os sonhos, para esperançá-lo e mantê-lo a um passo do estrelato. Quem sonha quer a glória dos aplausos. Quem ultrapassa problemas, vence desafios e prevalece sonhador, depara com outros dilemas semelhantes. Se os escritos da bíblia algum dia comprovarem sua razão e deus voltar a terra, ele rirá da nossa cara admirada dizendo-nos: esse tempo todo vocês percorreram a Terra como ratos na roleta, quase promovi um novo dilúvio, mas encontrei-me sem Noé. No mais, eu também não repetiria a minha alternativa, talvez vocês acreditassem na minha existência e isso seria ruim. Deixei vocês por aí, brincando de ser humano. E olhem, meus filhos, vocês se distraem muito facilmente. São muito bons, parabéns e oremos!

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Nícolas David é estudante de Jornalismo, Florianópolis, SC