Ewaldo Dantas Ferreira se foi neste sábado [22/6], aos 87 anos de idade, no Hospital Samaritano, em São Paulo, após uma trajetória de trabalho e de vida que não caberia num post nem sequer em um livro – precisaria de vários.
Um gigante do jornalismo brasileiro, um mestre de três ou quatro gerações de jornalistas – em matéria de praticar a profissão com rigor, correção e ética –, é difícil saber o que ele NÃO fez em sua carreira fecunda e brilhante.
Descobrir escondido na Bolívia, sob nome falso, um dos criminosos nazistas mais procurados do mundo e entrevistá-lo – o ex-chefe da Gestapo nazista na cidade de Lyon, França, durante a II Guerra Mundial, Klaus Barbie – viria a ser apenas uma de suas incontáveis reportagens históricas.
A entrevista, publicada em série pelos jornais O Estado de S. Paulo e Jornal da Tarde, foi reproduzida simultaneamente por diários de vários outros países, capitaneados pelo francês France-Soir, causou enorme repercussão internacional e seria em seguida transformada em livro.
Ética profissional
Ewaldo cobriu o conflito católicos x protestantes na Irlanda – tomava café num bar quando viu, em frente, o hotel em que se hospedava explodir –, reportou a guerra civil em Moçambique, atravessou linhas inimigas sob tiroteio durante o conflito árabe-israelense, relatou rebeliões em cadeias brasileiras, choques entre índios e fazendeiros e queda de avião, desvendou segredos da ditadura militar, esteve presente, muito jovem, nos primeiros noticiários da TV brasileira (na extinta TV Tupi) para, maduro, ser diretor de Jornalismo da Rede Bandeirantes.
Em plena ditadura militar, entrevistou e colocou no ar nomes malditos para o regime como o líder do Partido Comunista, Luiz Carlos Prestes, e o então exilado ex-governador gaúcho Leonel Brizola.
Num período tenebroso para os direitos humanos, dirigiu, a convite do então cardeal-arcebispo de São Paulo, d. Paulo Evaristo Arns, o corajoso jornal da arquidiocese, O São Paulo.
Conheceu e, em muitos casos, travou amizade com personalidades como William Faulkner, Nelson Rockefeller, Jean-Paul Sartre e Henry Kissinger.
Como presidente de sindicato, organizou a primeira greve da história dos jornalistas, em 1961, movimento que resultou na fixação do primeiro salário mínimo profissional no Brasil e no começo da profissionalização da categoria. Foi professor universitário, diretor de agências de publicidade, consultor. Trabalhou nos Diários Associados, na Folha de S. Paulo, no Jornal da Tarde, em O Estado de S. Paulo e dirigiu, com brilho, a extinta revista Visão.
Inteligência brilhante, cultura brutal, curiosidade insaciável, intransigência absoluta em matéria de ética profissional, solidariedade com os colegas, personalidade carismática e fascinante, grande contador de histórias, apreciador da boa mesa e excelente cozinheiro bissexto. Assim era Ewaldo Dantas.
Divorciado da advogada Alzira Helena Barbosa Teixeira, deixa três filhas de casamento anterior, netos e bisnetos.
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Ricardo A. Setti é jornalista