Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O que o futuro reserva para a imprensa

Há muitos anos, fiz cobertura de guerras para o Estado de S.Paulo com o pseudônimo de Nelson Santos. Não foi caso de preconceito, mas de interesse pessoal. Escrevia para o Jornal do Brasil, do Rio, que me pagava mais, sob meu próprio nome. Tinha a direção de Alberto Dines e era um grande matutino nacional. Não foi há tanto tempo, porém antes da televisão a cabo e da internet.

As duas cidades eram como que dois países à parte. Conto isto para explicar meus vínculos com o grande diário paulista. E expressar minhas reações ao acordo que firmou com Veja, pelo qual aparecerão juntos nas bancas sob um único preço. Para mim, é comprovação de confiança no futuro da mídia impressa. Penso na mesma linha.

Não se desconhecem os efeitos das novas mídias eletrônicas sobre a mídia-papel. Têm sido de crise nas receitas e de declarações muito pessimistas dos proprietários de grandes jornais no Brasil e exterior. O jornal impresso, como o conhecemos e amamos, estaria em processo de morte, com dias contados. Discordei sempre. Lembro do avanço do rádio, e depois da televisão, produzindo reações semelhantes na então crise – com a qual grandes jornais se tornaram maiores e aprimorada a qualidade do jornalismo.

Estudando o que aconteceu, verifica-se que alguns editores souberam identificar o vasto espaço à espera de ser preenchido por veículos ajustados aos novos tempos. E encontraram os profissionais com a flexibilidade e criatividades necessárias. O talento…

Meio essencial para se atualizar

Havia no jornalismo a tendência de chamar o leitor pela manchete, o título. Sensacionalismo, num maior ou menor grau. Notícia, como promovido pela escola norte-americana, consistia em responder ‘quem, quando, onde, como e por que’ do acontecido. A notícia estava nos primeiros parágrafos. Os subseqüentes eram os detalhes. O miolo era constituído do permanente, do que sempre se encontrava em cada veículo. Era o que, digamos, criava o hábito da leitura, sustentava a circulação.

O estilo do noticiário radiofônico e o televisivo é o adequado a cada mídia e difere do impresso. Por definição, esses noticiários cobrem espaço-tempo, segundos-minutos. Para nova audição, precisam ser gravados ou vídeogravados. Logo, os grandes editores, aqueles que jamais se tornam conservadores e rotineiros em suas tarefas, perceberam que o impresso tinha a vantagem possível de poder ser relido na hora ou depois, sem ter de se submeter a ser copiado. E de poder destacar significados para facilitar a compreensão.

Creio que foi este passo, pouco discutido, que passou a ser a diferença entre o impresso e o noticiário eletrônico. O editor atento logo passou a enfatizar a possibilidade de rever sem esforço. E de dar acesso ao leitor. Compreender, o que é essencial ao bom exercício de qualquer atividade. Na prática, o impresso passou ser o meio essencial para o indivíduo se atualizar, quase uma escola. Já não basta.

Demanda do mercado

Sei de recente pesquisa do Project for Excellence in Journalism (Projeto para Excelência em Jornalismo) revelando que 66% dos que seguem o noticiário político preferem o jornal diário. A Universidade da Califórnia descobriu que cerca de 70% procuram o jornal para se informar. A Associação Mundial de Jornais (World Association of Newspapers, da qual meu primo Jayme Sirotsky, da RBS, foi presidente), que representa 18 mil diários, verificou que 83% de seus associados estão otimistas quanto ao futuro do jornalismo impresso. E que 75% recebem com entusiasmo as novas mídias – o noticiário online (internet), que é meio obrigatório de todo o impresso.

Daqui a dez anos, apostam 35% deles, o impresso reinará supremo. E serão bem-sucedidos aqueles que souberem ser os primeiros a adquirir intimidade com as novas mídias e tiverem suficiente coragem e criatividade para ajustar o impresso à navegação pela internet – ambos os meios atualizados de propulsão. Ou entenderem que o efeito principal do peso da inimaginada massa de informações oferecidas ao indivíduo é o de fazê-lo sentir-se desorientado sem o confessar. Como um barco sem leme no meio de um furacão, entregue aos ventos.

A tendência é a de alienar, simplificar, limitar sua curiosidade e atenção ao mais próximo, à rua, ao bairro, à cidade, ao país. Ou, os mais necessitados de orientação, encontrar nos diários impressos que assumirem seu novo e essencial papel. Serão bem-sucedidos aqueles de acrescentarem significados às várias possíveis conseqüências do acontecido, reduzir a violência por meio de compreensíveis e possíveis alternativas; que assumirem o papel de bússola, apontando várias saídas da zona tempestuosa. E não se sentir perdido.

Desde a criação da mídia impressa, os pilotos talentosos não se assustam: sempre foram minoria, sempre se manifestaram na hora necessária e fizeram da imprensa o que tinha de ser.

O impresso nunca foi realmente de massa. Foi sempre consumido por um percentual menor da população. Continuará sendo o que souber identificar e corresponder à demanda do mercado. E dependerá, como sempre, do talento de indivíduos.

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Jornalista